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Topete (o retorno) – por Orlando Fonseca

Se houvesse um agente de imigração na fronteira, quando Abraão e sua comitiva chegaram na Terra Prometida, enfrentariam dificuldade para entrar. Conforme a narrativa do Livro Sagrado, vindo da cidade de Ur dos caldeus (na Mesopotâmia), ele não trouxe documento físico algum que o tornasse mais do que um estrangeiro ilegal naquele lugar. Aliás, o que ele afirmava ter, como salvo-conduto ou passaporte, seria um documento não válido naquele território politeísta, pois se tratava da designação de um Deus estranho aos locais. No entanto, ele foi ficando ali, teve a sua descendência e constituiu o que conhecemos hoje, a considerar verossímil o que diz a Bíblia, como o estado de Israel. Ou seja, tudo começa com um imigrante que traz um “passaporte” virtual emitido pela autoridade monoteísta. Aliás, é por aí que começam três religiões que mudariam o cenário místico do ocidente: o judaísmo, o cristianismo e o islamismo.

Mudando completamente o cenário para os dias atuais, agora vem um falso profeta se dizendo mandatário deste mesmo Deus único, afirmando que tem a incumbência de mandar embora todos os imigrantes ilegais de seu país, os Estados Unidos. Trump tem dito em seus discursos, aplaudido e ovacionado pelos seus correligionários, que está em seu trono na Casa Branca pela mão d’Ele, o Todo Poderoso (o verdadeiro, diga-se, porque se deixar, o Topete Laranja vai se achar o próprio). Eu me pergunto, um tanto cético, um tanto abestalhado: mudou Deus ou mudou o modo como os presidentes eleitos (democraticamente, diga-se de passagem) sentem-se incumbidos por Ele para fazer das suas? Sim, tivemos também, nestas plagas tropicais, um falso Messias, cometendo toda sorte de barbaridades em nome do Senhor.

Segundo a mesma narrativa que deu origem à base mítica do reino de Israel, Deus não muda: “eu, o Senhor, não mudo; por isso vós, ó filhos de Jacó, não sois consumidos”, é o que está escrito no livro de Malaquias 3:6, um dos profetas menores, mas nem por isso insignificante. Pois tal escrita sagrada é de tal maneira alegórica que permite várias interpretações e usos. O Patriarca e sua descendência ocuparam a Terra Prometida (Canaã, território que corresponde à região de Israel, Palestina, Jordânia, Líbano e Síria), para a qual voltaram, depois no êxodo do Egito, após um período de escravidão, guiados por Moisés. Também os puritanos ingleses, um grupo de protestantes que se opuseram à Igreja da Inglaterra no século XVI e XVII, perseguidos durante o reinado de Maria I, (conhecida como “Maria, a sanguinária”) buscaram a “terra prometida” na Nova Inglaterra (que viria a ser a América do Norte), onde fundaram a Colônia de Plymouth em 1620. Os americanos, desde o seus fundadores, acreditam que moram na nova Canaã, e que eles têm um “destino manifesto”, pelo qual serão uma grande e poderosa nação. Por aí é que Trump ganha adeptos, dizendo-se o novo Moisés que fará a América Grande outra vez”.

Nas cédulas do dinheiro deles, está escrito: “In God we trust (Em Deus está nossa confiança). Isso me leva a considerar, observando tudo o que tem sido feito (em especial pelo Topete Laranja, nestes primeiros dias de seu segundo mandato), que tudo o que resta daquela narrativa, iniciada com Abraão e sua descendência, é tão somente o deus do dólar. Em nome desse é que têm sido jogadas bombas sobre outras nações “inimigas”; que são movidas as peças no tabuleiro diplomático, que são colocados e retirados os apoios ao organismos internacionais, para além das fronteiras da “Terra prometida” deles. Por isso é que as palavras da bispa da igreja episcopal, em Washington, (reverenda Mariann Edgar Budde), pedindo misericórdia em nome do mesmo Deus que guiou o povo pelo deserto, são as únicas (vindas da grande nação do Norte) que nos dão algum alento de que a humanidade não está em risco (por enquanto).

(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela “Da noite para o dia”.

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Um Comentário

  1. Resumo da opera. Direto porque o texto não tem ‘sustancia’. Quando interessa, separação Igreja-Estado é coisa da Globo.

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