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É CINEMA. Bianca Zasso e ‘Estrada sem lei’: dois “velhos justiceiros ainda na labuta”. E vai daí que…

Balas no corpo e na alma

Por BIANCA ZASSO (*)

Filmes protagonizados por duplas exalando testosterona e atirando com as mais variadas armas para todos os lados não é novidade. Só que em tempos onde somos governados por uma criatura que acredita mais em pistolas e metralhadoras do que em educação e arte, roteiros deste tipo ganham novas nuances.

Kathryn Bigelow realizou um dos melhores tratados sobre o vício na adrenalina causada pela violência no seu premiado Guerra ao Terror. Agora, o texano John Lee Hancock dirige para a mais popular plataforma de streaming de filmes e séries um retrato melancólico sobre a sina de perseguir bandidos em Estrada Sem Lei.

E não estamos falando de qualquer bandido, mas do casal Bonnie e Clyde, que não poupou balas por onde passou na década de 30. Baseado na vida dos Texas Rangers Frank Hamer e Maney Gault, a produção tem dois protagonistas conhecidos do cinema de ação e isso pode ser um chamariz para muitos desavisados que escolhem seus filmes sem muita atenção. Ao contrário de outros filmes com ótimo elenco e roteiro fraco, Estrada Sem Lei faz valer a presença de Kevin Costner e Woody Harrelson.

Distantes da correria que é a rotina de quem persegue fora-da-lei, seus personagens encontram-se em aposentadorias diversas. Enquanto Hamer assume a figura do homem isolado que lê o jornal e mantem um porco como animal de estimação e a mulher toma todas as decisões da casa, Gault amarga uma vida de poucos recursos, dividindo a casa com a filha e o neto entre uma bebedeira e outra.

Ambos são tirados de suas aparentes zonas de conforto com o frisson causado por Bonnie e Clyde na sociedade americana. Estratégicos em suas fugas, eles são o sonho de praticamente todos os policiais da época. Com as “modernidades” investigativas não mostrando resultados, é hora de voltar às raízes. Chumbo grosso e pouca conversa, em resumo.

Mesmo temerosa dos métodos de trabalho de Hamer e Gault, Mirian Ferguson (uma participação bacana de Kathy Bates), primeira mulher a governar o estado do Texas, aceita a participação dos dois nas buscas do casal violento e popular. Fica difícil ser inovador quando Arthur Penn deu uma bela e definitiva versão da dupla errante com seu Uma Rajada de Balas. Mas Hancock tem outros interesses.

Enquanto vemos apenas detalhes de Bonnie e Clyde na tela, mergulhamos fundo na estrada com Hamer e Gault. Entre uma cena de perseguição e outra, Hancock usa o olhar preciso de sua câmera para destacar dois “heróis” que, mesmo amargando balas presas no corpo e problemas urinários, tentam voltar aos tempos de glória. Ainda possuem faro apurado, mas correr atrás de um informante décadas mais jovem já não é das tarefas mais fáceis.

Um dos trunfos de Estrada Sem Lei é sua crueza ao mostrar que homens bons de briga envelhecem. É bom se deixar levar pela fantasia de alguém com mais de 60 anos que bate, apanha e não cansa? Sim, é. Mas há uma atmosfera única em perceber que símbolos de valentia também se machucam, sangram, erram um golpe. Vários, na verdade.

Estrada Sem Lei segue uma linha que devia ser mais abordada pelo cinema de ação. Velhos justiceiros ainda na labuta, apesar da artrite e da vista cansada. No fim das contas, é o tesão por viver em perigo que os move. A diferença é que as luzes se acendem no final e a gente volta para casa sãos e salvos. Com alguma dor nas costas, mas sãos e salvos.

Estrada Sem Lei (The Highwaymen)

Ano: 2019

Direção: John Lee Hancock

Disponível na Plataforma Netflix

(*)  BIANCA ZASSO, nascida em 1987, em Santa Maria, é jornalista e especialista em cinema pelo Centro Universitário Franciscano (UNIFRA). Cinéfila desde a infância, começou a atuar na pesquisa em 2009.  Suas opiniões e críticas exclusivas estão disponíveis às quintas-feiras.

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