A expressão artística sob a luz da liberdade
Por MICHAEL ALMEIDA DI GIACOMO (*)
Uma das várias formas de tutela da manifestação do pensamento pode ser vista na liberdade de criação artística, literária e intelectual. É um direito fundamental e, como tal, deve receber a máxima proteção. Porém, nos últimos meses há uma concertação conservadora no sentido de vilipendiar quem faz da arte um meio de interagir com seu meio social, econômico ou político.
Um exemplo é o protesto realizado por artistas durante o Festival de Cinema de Gramado contra o governo federal. A mobilização denunciava a suspensão de um edital para selecionar séries temáticas para TVs públicas, com produções pautadas pelo tema da diversidade. Alguns espectadores em torno do tapete vermelho xingavam e jogavam, entre outras coisas, pedras de gelo nos manifestantes.
Este é só um fato. Há muitos outros. E, nos dias atuais, aquele que não concorda com a diferença de pensamento é belicoso e intolerante, certamente, por lhe faltar um argumento sadio.
A expressão artística, substancialmente, é um elo comunicativo importante na formação cidadã de qualquer nação. É encontro do sujeito com as referências culturais que dão sentido a sua própria existência e alteridade. Arte é exteriorizar a visão sobre o mundo ao seu redor.
É, também, um meio de expressão política, por isso incomoda o reacionário. Este “microssistema” tem a força de contestar ideias, ser vanguarda contra a letargia social patrocinada por governantes conservadores.
O interessante no episódio relatado é o argumento do governo federal para justificar a suspensão do edital. Segundo seus interlocutores, o governo irá rever critérios e diretrizes de apresentação dos projetos na área. É o que pode ser chamado de “censura” velada.
Explico.
Uma das formas de desconstrução da democracia e das liberdades inerentes ao regime é justamente o anti-intelectualismo e o ataque às formas de expressão artísticas e literárias. Delimitar o conteúdo de uma expressão artística – por qualquer meio é típico de governos totalitários.
É um caminho que não deve ser trilhado. É um alerta a todos que desejam ter respeitados seus direitos fundamentais. Hoje é a arte, a cultura e a educação que estão sendo atacadas, amanhã poderá ser a sua dignidade e a sua liberdade.
(*) Michael Almeida Di Giacomo é advogado, especialista em Direito Constitucional e Mestrando em Direito na Fundação Escola Superior do Ministério Público. O autor também está no twitter: @giacomo15.
OBSERVAÇÃO DO EDITOR: A foto que ilustra este artigo foi reproduzida deste endereço do portal “Vermelho”: AQUI.
Contador de comentários está com problemas, o meu não conta ou é para disfarçar mesmo?
NOTA DO SITE: sim, está com problema. E todos os comentários foram aprovados. Vamos tentar resolver o quanto antes.
Receber dinheiro do Estado não é direito fundamental. Qualquer um pode fazer a ‘arte’ que bem lhe aprouver, desde que pagando do próprio bolso.
Vilipendio a manifestação do pensamento não é novidade no país. Vide o politicamente correto. Por conta de ofensas, reais ou imaginárias, pequenas ou grandes, a linguagem sofreu uma tentativa de controle. Significa que podemos ofender quem quisermos? Não. Significa que a determinação do que é ofensivo não pertence a uma caterva política.
As tais séries temáticas da diversidade do edital suspenso, independente do assunto, basta olhar do que se tratava, tinham duas características: seriam assistidas por muito pouca gente e os envolvidos embolsariam dinheiro do mesmo jeito. É o mantra tupiniquim, as obras de arte geniais (quem não achar genial é ‘preconceituoso’ para dizer o mínimo) que quase ninguém está interessado em ver.
O microssistema da expressão artística está muito bem aparelhado, é refratário a mudanças. Viva Gramsci! Adjetivos como sempre não faltam, o ‘anti-intelectualismo’ (só existem intelectuais de esquerda).
A primeira trincheira da resistência, como diz o outro, é o bolso dos ‘artistas’.