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ARTIGO. Luciano do Monte Ribas, o assassinato de Verônica e a luta contra a intolerância e o ódio social

A futilidade é desumana     

Por LUCIANO DO MONTE RIBAS (*)

Há algo de muito errado na pessoa que lamenta com mais veemência o local de um velório do que o assassinato de outro ser humano. E esse “algo” geralmente não está isolado, revelando intolerância latente ou, em alguns casos, já explícita.

Sobre tais atitudes, concordo com quem afirma que, quando não denunciadas e modificadas, podem ser o primeiro passo no caminho que leva a absurdos e tragédias. O “mal absoluto” do holocausto, por exemplo, não nasceu na década de 40 e só se tornou possível porque um processo histórico levou a ele. Nessa linha, acredito que a matriz dos comentários “sem importância” é a mesma que justificou a morte de judeus, ciganos, pessoas com deficiência, adversários dos nazistas (sobretudo socialistas, comunistas e sociais-democratas), feministas e homossexuais, entre outros grupos que foram alvos da loucura metódica do fascismo alemão. Sobre essa discussão, aliás, recomendo que seja visto o filme “A fita branca”, longa-metragem dirigido por Michael Haeneke, que fala sobre as relações sociais na Alemanha às vésperas da Grande Guerra.

Voltando à primeira frase do texto, infelizmente não falo “em tese” sobre discursos de intolerância e ódio camuflados como “opiniões”. O assassinato de Verônica Oliveira gerou nas redes sociais de alguns cidadãos e de algumas cidadãs “de bem” menos reações passionais do que o fato de ela ter sido velada na Câmara de Vereadores. Há, inclusive, quem tenha falado em questionar a legalidade da permissão para o velório, talvez objetivando algum tipo de punição aos vereadores.

Pessoas assim – que acham que o sinal da cruz é compatível com o sinal da “arminha” – se derramaram em defesas da família e de outros chavões. É o tipo de gente que, nas suas próprias palavras, até “têm amigos gays”, mas se nega a discutir a exclusão pelo mercado de trabalho de quem não se enquadra nos padrões conservadores de gênero. São senhores e senhoras que não sabem como dizer a filhos e filhas o que aquelas pessoas fazem nas ruas, mas nem pensam em entender as relações sociais que as levam a estar ali.

Indo adiante, enquanto por aqui alguns e algumas se derramavam na defesa de “valores”, em outros lugares do Brasil o festival de barbaridades que tem como símbolo o néscio que ocupa a presidência, prosseguia.

Em Unaí, Minas Gerais, um pecuarista se achou no direito de colocar a suástica no braço e circular em público, amparado pela omissão da polícia mineira. Em Mairiporã, São Paulo, um médico (que bradava contra a corrupção nas redes sociais) e um veterinário foram elementos ativos na crueldade da rinha de cães. No Rio, uma youtuber lésbica, que nega a existência da homofobia, foi espancada quando estava num bar com sua namorada (sobre esse caso há informações desencontradas, mas é impossível deixar de relacioná-lo com o ambiente de violência no qual vivemos). São apenas três casos, todos com apelo midiático, ocorridos no país onde os feminicídios e as tentativas de assassinato de mulheres triplicaram de 2018 para 2019.

Assim, diante dessa explosão de crimes de ódio e de pessoas se sentindo autorizadas a dizerem e fazerem qualquer coisa, é impossível não enxergar que há um componente político em tudo isso. Gostem ou não, também existe um caminho que começa no “não te estupro porque você é feia” e no “se o filho tá ficando meio gayzinho é só dar um couro nele” e termina no sujeito que esfaqueia uma travesti porque ela se negou a fazer um programa. Se não existisse, as ideias de que o exemplo educa e de que as palavras inspiram seriam pura retórica, sem nenhuma relevância real. E sobre isso acho que nem é preciso argumentar.

Como eu sigo acreditando na força das palavras, uso esse espaço para declarar e pedir o apoio de todas as pessoas que não se tornaram “dissidências da humanidade” aos movimentos que exigem justiça para os crimes de ódio. Ninguém pode substituir o protagonismo dxs ativistas, nem ousar falar em seu nome ou tentar tirar algum tipo de proveito da sua luta, mas todxs nós devemos agir de forma solidária e demonstrar que eles e elas não estão sozinhxs na busca pelo respeito às diferenças e pela promoção da igualdade de direitos.

Assim, talvez as pessoas passem a se “escandalizar” com coisas importantes, como a perda de uma vida, ao invés de externarem as saudades que sentem do século XIX.

(*) Luciano do Monte Ribas é designer gráfico, graduado em Desenho Industrial / Programação Visual e mestre em Artes Visuais, ambos pela UFSM. É um dos coordenadores do Santa Maria Vídeo e Cinema e já exerceu diversas funções, tanto na iniciativa privada quanto na gestão pública.

Para segui-lo nas redes sociais: facebook.com/domonteribas – instagram.com/monteribas.

OBSERVAÇÃO DO EDITOR:  A foto é “Quase humanas” – manequins na vitrine de uma grife, em Florença, Itália.

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Um Comentário

  1. Cumprimento o nobre o nobre amigo pela especificidade, impotancia r brilantismo de Vosso Artigo, concordando e, o reportando da maior importancia social, abraços Cara!

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