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SEGURANÇA. Três motivos exigem do Governador gaúcho a solução do “caso Cláudia”, de Pelotas

Crimes que desafiam a polícia: desaparecimentos de Sirlene, Luana e Claudia

Até quando o governador Eduardo Leite vai fazer vistas grossas para o caso da professora Cláudia Hartleben? (Foto Reprodução)

Por Carlos Wagner (*)

É tradição entre os praticantes do bom jornalismo aproveitar as datas especiais, como Natal e Fim do Ano, para chutar a porta dos governantes e autoridades de um modo geral e lembrá-los de assuntos que estão sendo negligenciados. O caso de Cláudia Hartleben, 47 anos, se ajusta a essa situação. Professora do curso de biotecnologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Cláudia desapareceu na noite de 9 de abril de 2015. A Polícia Civil tem dois suspeitos. Mas não conseguiu provar o envolvimento deles porque não existe um corpo. A família a procura viva ou morta.

A exemplo de outras duas mulheres: a comerciante Sirlene de Freitas Moraes, 42 anos, que em 2005 desapareceu com o seu filho Gabriel, sete anos, em Porto Alegre. E a adolescente Luana Ribeiro Moraes, 14 anos, grávida de sete meses, que sumiu em 2011, em Três Passos. A linha que une os três casos é que os suspeitos são os ex-companheiros. E estão soltos porque a polícia não conseguiu provar a responsabilidade deles. São muito raros os casos em que o suspeito é condenado sem que apareça o corpo da vítima. E quais são os três motivos que exigem do governador Eduardo Leite (PSDB-RS) a solução do caso Cláudia?

Antes de responder à pergunta. Em casos assim, a mensagem que a ausência da Polícia Civil passa aos agressores é de impunidade. Esse é um dos motivos que os casos de Cláudia, Sirlene e Luana ajudam a manter o Rio Grande do Sul no topo nacional dos crimes cometidos contra mulheres, como revela um detalhado relatório sobre o assunto publicado em novembro na imprensa e disponível no site da Associação Gaúcha de Emissoras de Rádio e Televisão (Agert) chamado: “Uma análise sobre a violência contra a mulher e o papel da mídia no combate ao feminicídio”.

Respondendo à pergunta. O primeiro motivo que exige do governador uma solução do caso Cláudia é que ele era prefeito de Pelotas (2013 a 2017) quando o crime aconteceu. Portanto, ninguém melhor do ele sabe o que significa para a comunidade a solução desse caso. O segundo motivo é que uma das âncoras do governo é o combate aos crimes contra a mulher. Não foi por outro motivo que foi nomeada chefe da Polícia Civil a delegada Nadine Anflor, uma experiente policial que por sete anos foi titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam), em Porto Alegre. E o último motivo é que o vice-governador é o delegado Ranolfo Vieira Júnior, um profissional que conhece o aparato de segurança pública do Estado como a palma da sua mão. E os detalhes das raízes da violência no Estado. É por razão que ele ocupa o cargo de secretário da Segurança Pública.

O governador Leite, o vice Ranolfo e a delegada Nadine sabem que a ausência do Estado nos problemas de segurança pública é o maior incentivo que existe para os criminosos agirem. E que se colocarem uma pequena equipe trabalhando nesses casos até agora sem solução sinalizam para os culpados que eles não foram esquecidos. E para as famílias das vítimas e a comunidade, que se importam com a sua dor.

Nessa época do ano, as famílias da Cláudia, da Sirlene e da Luana vão olhar para a porta da casa na esperança de que elas voltem. E os seus amigos e a comunidade onde viviam vão lembrar delas. O que escrevi não é opinião. São situações que vivi e as documentei em minhas reportagens. Sou um velho repórter, 70 anos, 40 e poucos de profissão e mais de 30 vividos dentro das redações dos jornais. Sempre lidei com reportagens investigativas e aprendi que os casos de desaparecimentos que a polícia não consegue resolver nas primeiras 72 horas são fortes candidatos a caírem na vala dos “não resolvidos”.

É isso que nós jornalistas temos escrito. Mas lembro aos meus colegas que as novas tecnologias incorporadas aos protocolos de investigação policial nos últimos cinco anos facilitaram muito o trabalho do investigador. Além de terem barateado o custo da investigação. Portanto, aumentaram as chances dos casos insolúveis serem resolvidos.

Tomamos como exemplo o desaparecimento da professora Cláudia. Através de depoimentos e provas descobertas pela perícia técnica, os investigadores sabem o que aconteceu com ela até o último minuto antes de desaparecer. No minuto seguinte, ela sumiu no ar, como se diz. Porém, com o aparato tecnológico que existe hoje ninguém some ar. Todo mundo deixa “rastros” em equipamentos, como as torres de celulares.

Conversei sobre o caso da professora Cláudia com peritos criminais e delegados de uma longa tradição em investigação. A conclusão a que chegaram é que a investigação tem que recomeçar da estaca zero por vários motivos, sendo que um deles é a carência de perícias técnicas na busca de indícios do que aconteceu dentro da casa da professora e nos arredores nos minutos seguintes ao desaparecimento.

O governador Leite e o vice Ranolfo não vão agir no caso das procuradas vivas ou mortas se não forem pressionados pela imprensa. E a grande imprensa gaúcha não está nem aí para o problema. O foco das redações gaúchas hoje são matérias de entretenimento e de assuntos “positivos”. Esse foco tem tirado a pressão de cima da Polícia Civil.

Aqui um comentário. A relação entre repórteres e policiais sempre foi de desconfiança mútua. Lembro que uma vez um colega foi entrevistar um secretário da Segurança Pública e ele jogou o jornal do chão e pisou em cima. Os policiais têm como tradição usar a ignorância do repórter sobre os assuntos para lançar balões de ensaio nos noticiários para provocar os bandidos com estão com escuta telefônica a conversarem entre eles.

Voltando à conversa. Mesmo dentro de novo foco das matérias há um caminho para pressionar a polícia, que é o seguinte: questionar a origem das estatísticas sobre os crimes. Elas são feitas pelo governo do Estado. A pergunta que sempre fizemos nas redações é: “dá para confiar?”. A estratégia funciona sempre que é usada durante uma entrevista com delegados que ocupam postos de comando na Polícia Civil.

O repórter espera o entrevistado vomitar as estatísticas e faz uma pergunta sobre um fato, por exemplo: nesse final de ano as famílias da professora Cláudia, da Sirlene e da Luana vão olhar para a porta da casa na esperança que elas voltem. Também aguardarão as ligações telefônicas delas. Como nos outros anos, nada acontecerá. O que a polícia está fazendo a respeito disso? Essa pergunta tem ser feita para a delegada Nadine.

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(*) O texto acima, reproduzido com autorização do autor, foi publicado originalmente no blog “Histórias Mal Contadas”, do jornalista Carlos Wagner.

SOBRE O AUTOR:  Carlos Wagner é repórter, graduado em Comunicação Social – habilitação em Jornalismo, pela UFRGS. Trabalhou como repórter investigativo no jornal Zero Hora de 1983 a 2014. Recebeu 38 prêmios de Jornalismo, entre eles, sete Prêmios Esso regionais. Tem 17 livros publicados, como “País Bandido”. Aos 67 anos, foi homenageado no 12º encontro da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI), em 2017, SP.

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