Por Katiana Campeol / Da Agência de Notícias da UFSM
Compreender a realidade enfrentada por migrantes e refugiados é um grande desafio. Porém, mais do que isso, o projeto MIGRAIDH da UFSM, busca a proteção e promoção de direitos humanos destas populações.
O Migraidh é um Grupo de Pesquisa, Ensino e Extensão dos Direitos Humanos e Mobilidade Humana Internacional da UFSM, com atuação desde 2013. Por meio dele são realizadas ações dirigidas à proteção e promoção de direitos humanos, ao acesso à direitos, ao combate à xenofobia, ao desenvolvimento de processos legislativos e políticas públicas e de integração local da população migrante e refugiada, principalmente aquela estruturalmente vulnerável.
Reunindo participantes de diversas áreas do conhecimento interessados na temática da migração e direitos humanos, o programa de extensão trabalha em assessoria a Migrantes e Refugiados. Isso ocorre por meio das seis linhas de pesquisa que o projeto possui, nas áreas do Direito, Ciências Sociais, Comunicação Social, Letras e Psicologia da UFSM, liderado pela professora Giuliana Redin, coordenadora do projeto.
Agência de Notícias – O Migraidh é um projeto que une diversos cursos da UFSM em prol de melhores condições para os imigrantes. Sendo assim, quais são as ações em desenvolvimento pelo Programa de Extensão nesse momento?
Giuliana Redin – Desde a pandemia, o Programa de Extensão do Migraidh, Assessoria a Imigrantes e Refugiados, mantém suas atividades adaptadas aos protocolos sanitários e mais intensamente realizadas de forma remota. Contudo, essas atividades nunca foram suspensas, pois estão ligadas à atenção à população migrante e refugiada, ainda mais vulnerável no contexto da pandemia.
Então foram estruturadas as Mesas de Informações, um projeto que conta com o apoio direto do ACNUR, Agência das Nações Unidas para Refugiados, para o atendimento por canal de WhatsApp nos eixos da assessoria jurídica e documental, atendimento clínico psicológico, que é feito pelo convênio do Migraidh com o Núcleo de Psicanálise da UFSM, acesso aos serviços públicos e assistência social, oferta de rodas de conversa para o ensino do português como língua de acolhimento e apoio e acolhimento. Muitas dessas ações requerem o acompanhamento presencial, nestas situações a equipe de extensionistas atua com rigorosa observância dos protocolos sanitários.
O contexto da pandemia agravou a situação de muitos imigrantes relativamente à regularização migratória e segurança alimentar: por mais de um ano, perduraram os efeitos de sucessivas portarias do governo federal de fechamento de fronteiras às migrações por razão humanitária, em violação aos direitos fundamentais assegurados na Lei de Migração e Lei do Refúgio, como o direito de regularização documental, de solicitar refúgio e não sofrer deportação sumária, que é uma Política de Estado; na prática essas portarias não impediram o acesso dos imigrantes no território nacional, mas os deixaram sem acesso ao direito de documentação; a maior dificuldade do acesso a trabalho e renda, situação agravada pelo fato de que muitos imigrantes estavam em situação de indocumentação e encontravam ainda maior dificuldade de inserção no mercado formal de trabalho.
Atuamos no enfrentamento a essas situações, não apenas pela incidência junto aos Poderes Legislativo e Executivo, de forma colaborativa e em conjunto com outras organizações e espaços coletivos, como o Fórum Permanente de Mobilidade Humana do Rio Grande do Sul e a RAC, Rede Advocacy Colaborativo, como também nas redes de atenção à agenda da segurança alimentar, de forma mais pontual.
Neste ano, abrimos edital para novos/as participantes nas seis linhas de pesquisa nas áreas do Direito, Ciências Sociais, Comunicação Social, Letras e Psicologia com participação concomitante no Programa de Extensão. Estamos fortalecendo projeto estratégicos, a exemplo a oferta de mais uma edição do Curso de Capacitação para Servidores Públicos e Atores Sociais em Direitos Humanos, voltado ao atendimento, acolhimento e integração de migrantes e refugiados e a confecção de material informativo para acesso da população migrante aos serviços públicos e também de orientação a servidores e atores sociais.
O desenvolvimento do trabalho cotidiano do Migraidh também conta no ano de 2021 com bolsas do Observatório de Direitos Humanos da UFSM e das Ações do COREDE Centro da Pró-Reitoria de Extensão da UFSM e são as seguintes: Atendimento e assessoria jurídica individualizada e coletiva, também colaborativa com órgãos públicos, por meio de peticionamentos e pareceres; Apoio psicossocial e atendimento psicológico, este prestado por meio do convênio interno firmado com o Núcleo de Psicanálise do Curso de Psicologia da UFSM; Apoio para o acesso a serviços públicos; Ensino do português como língua de acolhimento no âmbito das Rodas de Conversa; Ações de integração local da população migrante e refugiada; Fortalecimento de redes voltadas ao acolhimento, atendimento e inserção laboral da população migrante e refugiada; Mediação junto ao Executivo e Legislativo municipais para as agendas de políticas públicas para a população migrante e refugiada; Atuação em advocacy: iniciativa e proposição de políticas públicas e incidência em processos legislativos e administrativos relativos à agenda das migrações; Apoio técnico à aplicação da Resolução 41/2016 (art. 8º), que institui a Política de Ingresso de Migrantes e Refugiados na UFSM, e desenvolvimento das práticas de acolhida e permanência de estudantes imigrantes e refugiados na universidade; Ativismo na promoção dos direitos humanos da população migrante e refugiada por meio de ações de combate à xenofobia e todas as formas de discriminação.
Agência de Notícias – Quais os principais desafios que já eram enfrentados anteriormente por imigrantes e refugiados que optam pelo Brasil como país de destino? E quais são os principais desafios agora em meio a pandemia?
Giuliana Redin – Migrantes internacionais estão sujeitos a vulnerabilidades decorrentes da condição jurídica frente ao Estado, como a documental, a diferença cultural e linguística, a xenofobia estrutural, as condições socioeconômicas e psíquicas que decorrem dos deslocamentos humanos. São dimensões da exclusão estrutural, tanto em relação ao Estado, no campo político-jurídico, como diante da sociedade de acolhida e da subjetividade do sujeito em mobilidade.
A agenda das migrações é altamente atravessada por uma lógica de securitização, que faz recair sobre o estrangeiro a estigmatização e que reforçam a discriminação e relações de sujeição. Na pandemia, como referido na primeira questão, o fechamento de fronteiras aos migrantes por razão humanitária e refugiados foi um desastre do ponto de vista dos direitos humanos, porque sujeitou migrantes e refugiados à rotas de migração inseguras, os expôs ainda mais a situações de exploração, impedindo-os de acessarem o direito fundamental à regularização documental e solicitação de refúgio, e, com isso, estabeleceu um clima de deportabilidade no país, implicando na impossibilidade de fato de acessarem outros direitos, a exemplo, o trabalho.
Agência de Notícias – Como promover um diálogo intercultural eficiente entre o meio acadêmico, a sociedade geral e os imigrantes em um momento com tantas restrições?
Giuliana Redin – Esse diálogo é sempre desafiador, porque o meio acadêmico espelha a própria sociedade, o racismo estrutural e a xenofobia arraigada na ideia de identidade nacional, que trata diferente o imigrante europeu em relação ao imigrante do Sul Global. Então, em qualquer tempo, os esforços estão voltados à construção de espaços de promoção da interculturalidade. Um bom exemplo são as Rodas de Conversa para o ensino do português como língua de acolhimento, que atualmente estão sendo ofertadas de forma remota.
Esse espaço associa a aprendizagem da língua portuguesa à integração local de migrantes e à construção de uma consciência intercultural, de respeito à singularidade e à diferença. É um espaço construído pelos imigrantes, principais difusores e interlocutores, como oportunidade de inserção do migrante no laço social da comunidade, fortalecimento das redes de informação para acessibilidade ao trabalho e renda, saúde, educação, necessidades cotidianas e socialização de vivências, motivações e dificuldades.
Ainda de forma remota, oferecem interação, aproximação e apoio. Outras atividades também estão sendo realizadas neste momento, como os diálogos interculturais promovidos com o apoio do Laboratório EntreLínguas da UFSM, para o desenvolvimento de materiais voltados ao atendimento das necessidades linguísticas dos imigrantes estudantes na universidade. As restrições da pandemia implicaram na impossibilidade de realização do Grand Magal, organizado pela comunidade senegalesa de Santa Maria, em 2020, evento de significativa importância na integração e para a diversidade cultural…”
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