Dos golpes – por Orlando Fonseca
As imagens reveladas semana passada, após operação da Polícia Federal, mais do que indícios de um crime cometido contra o estado de direito no país, revelam duas coisas para o brasileiro médio. A primeira nos dá a dimensão da gravidade dos momentos que antecederam as eleições de 2022; a segunda, que poderia ser cômica, aponta a incompetência do grupo que pretendia dar uma “virada de mesa” para se manter no poder. Em qualquer uma das situações, temos um golpe, seja na democracia, seja na expectativa de uma parcela da população que acreditava em mitos. Aos poucos vamos acordando dos pesadelos que foram surgindo das profundezas da República para a luz do dia, mas tudo o que eclodiu em 8 de janeiro do ano passado ainda está por revelar a extensão de seu veneno antidemocracia.
Tenebrosas transações se desenrolavam, enquanto a Pátria Mãe tão distraída se preparava para as promessas de um novo ciclo. Mais traída do que distraída, mas já estava desconfiada, a julgar pelas intenções de votos nas pesquisas, naquele momento. Para os que ainda insistem de que a intentona fascista foi uma farra inconsequente, perpetrada por idosos e desocupados, a cada nova revelação das investigações, ficamos convencidos de que se tratava de uma articulação de um grupo para se perpetuar no poder, à revelia da vontade popular. E isso é um atentado à democracia. Esta só existe pela manifestação do povo pelo voto, e se mantém pela solidez de suas instituições, capazes de manter o estado de direito.
A reunião no gabinete do governo Bolsonaro, com seus ministros, abusando da infraestrutura do estado, revela muito do seu projeto. Não se tratava de uma reunião de planejamento, para fazer frente às demandas urgentes da economia, das políticas sociais, do retorno à rotina pós-pandemia. Mas uma reunião para tramar contra o processo democrático, burlar as eleições, ou pôr em prática em dispositivo golpista, um plano B, uma virada de mesa. A esta turma estávamos sujeitos nos últimos quatro anos, e as consequências são flagrantes, não sendo piores porque os efeitos terríveis da pandemia da Covid 19 obscureceram as incompetências todas, na falta de panejamento e na incapacidade de, tendo um, executá-lo. E com eles vieram junto instituições caras à vida republicana, como as Forças Armadas.
É trágico, porque a comicidade beira a infantilidade, ver um chefe do serviço de inteligência tentando falar em uma ação escusa, e ser cortado pelo presidente, porque “se pode vazar”, não dá pra falar ali, e sim no reservado depois. Isso dimensiona duas coisas: uma, a cumplicidade do chefe da nação, que deveria ter recusado qualquer ato envolvendo a Abin fora da legalidade, no interesse da Nação; a outra, que não havia sequer a confiança no núcleo duro do poder, ali reunido. Porque é absolutamente ridículo que aquela reunião tivesse sido gravada, pois revela que a tal “inteligência” não passava de um exercício irresponsável de intenções malévolas. Ou foi um ato falho de alguém, diante das transações escusas que se realizavam ali?
É de se lamentar que parte das Forças Armadas tenham sido arrastadas para um projeto tão desastroso. Se já não bastasse um Pazzuelo, com “experiência” em abastecimento, e que se viu envolvido com a falta do mínimo para debelar a pandemia, ainda aparece outro general, chefe do serviço de inteligência, tramando uma operação tabajara para “virar a mesa”. Não vou dizer que há golpes de sorte em diversos descuidos perpetrados pelos agora suspeitos, porque o trocadilho seria infame. Mas, convenhamos, ou os golpistas tinham tamanha certeza da capacidade de ação e da impunidade, ou nos vemos livres de uma turma que não tem a menor condição de dirigir um país. Aliás, como se pode conferir, sobejamente, nos dados sobre economia, saúde, educação, infraestrutura do período em que estiveram fazendo bravatas em Brasília e no resto do Brasil. Vamos dizer que, num golpe de vista, a bola passou raspando e deixou o Brasil em campo por mais um tempo, driblando intempéries com um jogo sério.
(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.
Donde se chega no Codigo de Processo Penal. ‘O inquérito deverá terminar no prazo de 10 dias, se o indiciado tiver sido preso em flagrante, ou estiver preso preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se executar a ordem de prisão, ou no prazo de 30 dias, quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela.’ No paragrafo ‘Quando o fato for de difícil elucidação, e o indiciado estiver solto, a autoridade poderá requerer ao juiz a devolução dos autos, para ulteriores diligências, que serão realizadas no prazo marcado pelo juiz.’ Inquerito das milicias digitais já foi prorrogado 9 vezes. Bota Estado Democratico ‘de Direito’ nisto..
‘É trágico, porque a comicidade beira a infantilidade,[….]’ um velho professor de portugues achar que alguém vai mudar de idéia porque ele escreveu um texto.
“Ninguém quer virar a mesa, ninguém quer dar o golpe. Ninguém quer botar a tropa na rua, fechar isso, fechar aquilo. Mas nós estamos vendo o que está acontecendo. Vamos esperar o quê? Todo mundo vai se f**** […]”
Imagens? ‘“Não é dar tiro. ‘Ah, Paulo Sérgio, vamos botar as tropas nas ruas, tocar fogo e metralhar’. Não é isso. Daqui para frente, quero que todo ministro fale o que vou falar aqui. E se o ministro não quiser falar, vai ter que falar para mim por que ele não quer falar [… ]”.