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Lições da Nova Frente Popular Francesa – por Leonardo da Rocha Botega

Os votos garantem: “a liberdade, a igualdade e a fraternidade respiram”

Uma nova esperança ronda a França. Depois de uma “década perdida” entre a direita neoliberal e a extrema-direita, a esquerda francesa volta a ser uma alternativa concreta. O segundo turno, realizado no último dia 7 de julho, demonstra, para a surpresa de muitos, essa possibilidade. Enquanto, a maior parte dos analistas políticos dava como certa uma vitória do Reagrupamento Nacional de Marine Le Pen e Jordan Bardella, a Nova Frente Popular construiu uma das mais significativas vitórias das últimas décadas.

Desde as eleições europeias, ocorridas no início de junho, e a surpreendente decisão do presidente Emmanuel Macron de dissolver o parlamento e convocar novas eleições, a possibilidade de a extrema-direita chegar ao governo parecia mais concreta do que nos últimos anos. Nas últimas duas eleições presidenciais, 2017 e 2022, o agrupamento de Marine Le Pen chegou ao segundo turno, sendo derrotado duas vezes pelo partido do atual presidente, na primeira vez por uma diferença de quase 33% de votos, na segunda por uma diferença muito menor, 17%.

Nas eleições europeias, o Reagrupamento Nacional obteve 31% dos votos, sendo o partido mais votado. O mesmo se pode ver no primeiro turno das eleições parlamentares, quando sua votação cresceu para 33% e passou a ter como aliada boa parte da direita tradicional gaullista. O fantasma da República de Vichy, o governo colaboracionista durante o período da ocupação nazista, parecia estar ganhando corpo em uma campanha impulsionada por uma intensa propaganda xenofóbica e fascista. Parecia! Apenas Parecia!

A principal lição da História é que ela nunca pode ser pré-determinada. O avanço da extrema-direita, nas sombras do neoliberalismo macronista, e as experiências fracassadas de isolacionismos, levaram as esquerdas francesas a construção de uma unidade, reunindo o Partido Socialista, renovado após o fraco governo de François Hollande, os Ecologistas, o Partido Comunista Francês, a França Insubmissa de Jean-Luc Mélenchon e o Novo Partido Anticapitalista.

A Nova Frente Popular obteve 28% dos votos no primeiro turno e fez um responsável chamamento ao macronismo e ao gaullismo para a construção de um “muro democrático”. Ao mesmo tempo, retirou suas candidaturas menos competitivas em prol de candidaturas de centro-direita que tivessem potencial de vitória contra representantes do Reagrupamento Nacional. Em paralelo a estes movimentos institucionais, promoveu uma intensa mobilização popular que ganhou a adesão de inúmeras figuras públicas, como o principal jogador da seleção francesa de futebol, Kylian Mbappé.

O resultado foi não apenas a derrota da extrema-direita, conduzida à condição de terceira força eleitoral do país, como também a elevação da Nova Frente Popular à condição de primeira força eleitoral. Uma condição legitimada pela maior participação em uma eleição legislativa francesa desde 1981. 67% dos eleitores foram as urnas, mobilizados pelos chamados em defesa da democracia e do multiculturalismo, os principais pilares da nova sociedade multiétnica francesa. Unidade e mobilização são as duas grandes lições da Nova Frente Popular francesa.

No momento em que escrevo, ainda não se sabe o número exato de cadeiras que a esquerda irá ter no parlamento. Porém, não resta nenhuma dúvida da probabilidade do novo primeiro-ministro ser oriundo da Nova Frente Popular (isso se a democracia prevalecer sobre os conchavos macronistas). O que abriria caminho para a constituição de uma tão necessária alternativa de governo que implante um programa que supere o neoliberalismo e o seu pior sintoma, o neofascismo. A liberdade, a igualdade e a fraternidade (que pode ser substituída pela solidariedade) respiram! A Europa e o mundo agradecem!

(*) Leonardo da Rocha Botega, que escreve regularmente no site, é formado em História e mestre em Integração Latino-Americana pela UFSM, Doutor em História pela UFRGS e Professor do Colégio Politécnico da UFSM. É também autor do livro “Quando a independência faz a união: Brasil, Argentina e a Questão Cubana (1959-1964).

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