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Jogos de Guerra x Jogos de Paz – por Orlando Fonseca

Sexta-feira passada foi o dia de se assistir à cerimônia de abertura das Olimpíadas. Não apenas no meu caso, algo aguardado por 4 anos (neste ano, um ciclo menor, por causa do adiamento provocado pela pandemia), mas por mais de 1 bilhão de espectadores pelo mundo. Nenhuma modalidade de evento cultural tem potencial para reunir tanta gente por algumas horas, diante da TV. São 206 países, o que equivale a dizer, 206 nacionalidades, distribuídos pelos cinco continentes (representados nos 5 arcos coloridos); são 11 mil atletas, em 48 modalidades olímpicas, atualmente agregadas de três novas atividades esportivas que agradam os mais jovens. Depois de 100 anos, as Olimpíadas voltam à França, país do idealizador dos jogos modernos, o Barão de Coubertin. Paris é uma festa.

Paris é uma cidade cenário, como nos dão testemunho todos que a visitam. O turismo na Cidade Luz é algo que se dá como se adentrássemos um palco gigantesco, no qual ruas, praças, prédios, edificações (entre todas a imponente Torre Eiffel), e no meio deste o Rio Sena (revitalizado para os Jogos Olímpicos 2024) como efeitos cenográficos. Nada mais indicado, portanto, para quem pensou este evento tipicamente marcado pela grandiosidade cênica, do que fazê-lo ao ar livre. Fora dos grandes estádios, pela primeira vez, reservados apenas para receber as disputas olímpicas dos atletas. Houve quem não gostasse dessa mudança, por entender que a festa é para os atletas, que seriam, em tese, os protagonistas. Para mim, no entanto, acertaram os organizadores, pois a “abertura”, na qual não estão em disputa quaisquer medalhas, o espetáculo é para o público, e o que se pretende mostrar é, justamente, as belezas do local que abriga os jogos.

O opção pela capital francesa se dá pela comemoração do centenário da realização da VIII Olimpíada, em 1924. Os primeiros jogos olímpicos internacionais foram realizados no ano de 1896, em Atenas na Grécia (berço das antigas olimpíadas). Recriados pelo pedagogo e historiador francês, Pierre de Coubertin, traziam ao mundo moderno a simbologia de Hércules, o qual, segundo a mitologia grega, é considerado o fundador dos Jogos Olímpicos. Desde 776 a.C., eram realizados em Olímpia, em honra a Zeus. Na retomada do século XIX, 241 atletas do sexo masculino, representando seus países, competiram em 43 eventos de nove modalidades. Motivado pelo ideal da educação através do esporte (“o mais rápido, o mais alto, o mais forte”), Coubertin queria propagar seu uso como um instrumento de aproximação entre os povos, em benefício da paz.

Neste ano, em Paris, os eventos de abertura pretendiam celebrar a igualdade (o que se complementa com o que nos deram os franceses em sua revolução de 1789: fraternidade e liberdade). No entanto, temos um mundo marcado por conflitos e contradições: a Rússia está fora, mas Israel está dentro, o que indica uma diplomacia internacional complicada, na movimentação de suas peças, em pleno século XXI. As condições sociais também mostram um lugar perigoso: houve uma ataque aos trilhos dos trens de alta velocidade, deixando milhares parados nas estações. O jogador Zico foi assaltado, com prejuízo de mais de um milhão de reais. E não é um fato isolado – o que só aumenta a tensão xenofóbica da extrema-direita, que atribui aos imigrantes (em especial os do norte da África) a violência urbana na Europa. Aliás, esta mesma Europa que ocupou as antigas colônias até o seu esgotamento, no entanto, não quer que as gerações de antigos colonizados, empobrecidos, ocupem o rico território das antigas metrópoles.

Parafraseando a canção popular: “Que contradição/ Só a guerra faz/ Nosso amor em paz”, que a beleza da superação do esforço físico e a arte dos movimentos corporais ensejem um tempo melhor para a humanidade. E seja este o maior legado, pois que valor há em ser o melhor entre os humanos, senão para fazer maior a humanidade?

(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela “Da noite para o dia”.

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13 Comentários

  1. ‘[…] valor há em ser o melhor entre os humanos, senão para fazer maior a humanidade?’ Ideologia, tudo acaba no ‘coletivo’. Utopice.

  2. ‘[…] não quer que as gerações de antigos colonizados, empobrecidos, ocupem o rico território das antigas metrópoles.’ Outra coisa que não para em pé. Suécia teve infimas colonias na Africa e com duração bastante curta (perdeu para outros paises). Vilas e uma ou outra cidade pequena. Imperio Austro Hungaro teve uma fabrica em Moçambique, colonia mesmo só na Asia. Espanha colonizou boa parte da America e está muito longe de ser ‘rica’. Grecia em tempos modernos não colonizou ninguém. Suiça não colonizou ninguém e tem problemas com imigração ilegal.

  3. Outra reclamação do funcionario chines. Os empregados aparecem atrasados no serviço. Muitos abandonam e são substituidos, rotatividade da mão de obra é alta. Recebem e gastam tudo no mesmo dia, geralmente em bebida. Não cuidam dos equipamentos, tudo estraga muito rapido. Sem dinheiro pedem dinheiro emprestado ainda por cima. No documentario não falta um politico demagogo chamando a população de ‘crianças’. Alas, o documentario gira em torno do problema para conseguir pedras para tocar a obra.

  4. ‘[…] esta mesma Europa que ocupou as antigas colônias até o seu esgotamento, […]’. Existe um documentario belga chamado ‘Empire of Dust’. Há clipes também no Youtube. Chineses construindo no Congo, antiga colonia belga. Um chines ‘descasca’ o interprete. Ficaram com a infraestrutura deixada pelos colonizadores e não conservaram ou melhoraram nada. Deterioração geral. Chines comenta que o pais dele não tinha aquela infraestrutura naquela epoca. Alas Republica ‘Democratica’ do Congo.

  5. ‘[…] houve uma ataque aos trilhos dos trens de alta velocidade, deixando milhares parados nas estações.’ Um ativista da ultra-esquerda foi preso. Alas, apesar de Paris não ter sido atingida (ainda) aconteceu sabotagem nas redes de fibra otica. Autoria ainda indeterminada.

  6. ‘[…] a tensão xenofóbica da extrema-direita, que atribui aos imigrantes (em especial os do norte da África) a violência urbana na Europa.’ Obvio que isto é uma baboseira. Basta ver as estatisticas da violencia antes e depois da crise migratoria. Exemplo mais obvio é a Suécia onde as gangues proliferam. Não foram os suecos que acordaram num belo dia e, cansados do Estado de Bem Estar Social, começaram a criminalizar-se. O mesmo problema existe na Alemanha e na França. Nem é preciso gastar tempo debatendo, é só cruzar os braços e esperar. ‘Narrativas’ são mortas pelos fatos.

  7. Outro aspecto. Cerimonia também lembra a Festa della Sensa de Veneza, comemoração da Ascenção de Cristo. Remetendo ao ‘Casamento com o Mar’ quando o Doge após uma procissao de barcos jogava um anel de ouro com o mar. Olimpiada na Grecia Antiga era dedicada a Zeus, guerras eram suspensas. Na abertura havia um Dionisio e uma provocação.

  8. Bueno, o bode no meio da sala. Ou da cerimonia. Uma parodia da Ultima Ceia feita com Drag Queens. Podiam ter feito qualquer coisa, mas fizeram aquilo. Uma falta de respeito totalmente desnecessaria e gratuita. Covarde, sabem que com outros ‘a bala voa’. Padrão vermelho, provocam, depois negam. Se recebem resposta mais firme vitimizam-se ou apelam para algum chavão, no caso o ‘preconceito’. Chiadeira não foi só aqui, teve gente até na Australia indignada, chamando os franceses de tudo em tv aberta.

  9. ‘[…] em Paris, os eventos de abertura pretendiam celebrar a igualdade […]’. Pois é, fora de um estádio e com chuva a captação de imagens complica devido a iluminação. Atletas ficam longe do publico. A francesa do vlog antes de ir para casa comentou ‘pelo menos não sou turista, não tive que pagar 3 mil dolares para ver isto’. Um brasileiro, video no UOL, saiu muito p. da cara da cerimonia. Pagou os 15 mil reais.

  10. Muitas controversias antecederam os jogos. Moradores de rua foram embarcados em onibus e transferidos para Lins (lugar incerto e não sabido). Bancas de vendas de livros, tradiconais na beira do rio há decadas, foram desmontadas para servir de arquibancada. O proprio Sena era para ser despoluido e, ultima vez que ouvi falar, um treino de triatlo foi cancelado devido a poluição.

  11. Não assisti a abertura por ter coisa melhor para fazer. Assisti o vlog de uma parisiense que foi até o lugar da cerimonia. Comentou do movimento reduzido de carros nas ruas e o forte aparato de segurança. Não gostou dos pontos de estrangulamento para acessar a beira do rio. Comentou ‘foi para isto que nos preparamos por mais de um ano?’. Começada a cerimonia apertou a chuva. Indignou-se e voltou para ver o resto da cerimonia em casa. Alas, os apartementos por lá são minusculos.

  12. Por partes como diria Jack, o estripador. Paris recebe quase 40 milhões de turistas por ano. Cidade é cara, o poder aquisitivo do frequentador habitual é maior. O temor dos estabelecimentos é a perda de faturamento porque o numero de pessoas diminui tanto no periodo que antecedeu a Olimpiada quanto agora.

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