Por Kemyllin Dutra / Repórter do “Gritos do Silêncio” (*)
Desde 7 de outubro de 2023, mais de 38 mil assassinatos de palestinos foram notificados na Faixa de Gaza. Contudo, no início deste mês, um estudo publicado na revista “The Lancet” aponta que o número real de mortes pode ultrapassar os 186 mil. A pesquisa considera pessoas que faleceram por falta de água, alimentação ou tratamento de ferimentos e soterramento sob escombros de edifícios e demais construções bombardeadas.
Embora tenha eclodido no último ano, o que acontece hoje na Faixa de Gaza se originou em 1917, quando a ideia de estabelecer um estado judeu permanente na Palestina foi apoiada pelo governo britânico. Alguns anos depois, a Liga das Nações (corpo antecessor da Organização das Nações Unidas) permitiu que esse processo de ocupação fosse iniciado.
Com a declaração do Estado de Israel em 1948, uma guerra árabe-israelense se instaurou por conta da divisão do território palestino entre árabes e judeus. Nessa fase, que ficou conhecida como a Nakba, catástrofe palestina, houve a morte de aproximadamente 15 mil palestinos e o êxodo forçado de mais de 700 mil cidadãos. Especialistas alegam que o cenário atual é uma continuação desse revoltante episódio.
Israel não age sozinho
Mestre em História pela Indiana University – localizada em Bloomington, no estado norte-americano de Indiana -, João Pedro Correa pesquisa escravidão no Brasil, na América Latina, no Caribe e nos Estados Unidos e entende que o processo genocida é histórico e se repete com diferentes povos. O historiador cita que esse momento faz perceber as estruturas do genocídio no caso dos indígenas e dos africanos na Américas e na Europa, dos judeus na Segunda Guerra Mundial e dos palestinos.
Para ele, é muito fácil perceber que há uma política de extermínio, especialmente por parte da extrema-direita israelense, da figura de Benjamin Netanyahu (primeiro-ministro de Israel) e de imperialistas dos Estados Unidos. “Não tem muito o que dizer sobre isso. É genocídio, ponto final. As pessoas estão morrendo o tempo todo de forma criminosa. Israel está matando gente inocente o tempo todo com desculpas cada vez mais fracas”, pontua Correa.
As relações entre Israel e os Estados Unidos começam após o Holocausto, quando o então presidente americano, Harry S. Truman, se posicionou a favor do reconhecimento do estado. Ainda durante a Nakba, no ano de 1967, a vitória israelense sobre a aliança árabe na Guerra dos Seis Dias, apoiada pela União Soviética, fortaleceu o apoio financeiro, militar e diplomático dos EUA a Israel.
O pesquisador menciona que esse pode ser o maior genocídio da história recente, motivado por interesses econômicos e políticos de Israel e dos Estados Unidos em manter controle sobre a Faixa de Gaza que já vive em um estado de sítio há anos. “Isso não é novo, mas a quantidade absurda de pessoas, crianças mortas é. Tenho amigos palestinos com família nos EUA e amigos judeus lá que são absolutamente contra o massacre. A questão não é judeu contra palestino, é o uso da mentira do terrorismo por Israel, tática batida dos EUA para invadir o Afeganistão e o Iraque, para se apropriar de um território e aniquilar seus habitantes”, complementa.
A cobertura do genocídio
O jornalista e ativista Kais Husein, que é de família palestina e utiliza suas redes sociais para divulgar conhecimento sobre a Palestina, colabora com a Federação Árabe Palestina do Brasil (FEPAL). Husein cobre há 9 meses o genocídio em Gaza pela entidade e explica que ela é um espaço para mostrar a opressão, a colonização e os crimes cometidos pela ocupação israelense, questões que ele juga não abordadas pelos grandes veículos de informação.
Em relação à cobertura internacional, o ativista compara a atuação da mídia a uma agenda de propaganda de guerra que tenta justificar ou amenizar as ações israelenses. “Eu vivi pessoalmente na Palestina e pude visualizar a ocupação com os olhos e na pele. Nesses 9 meses de genocídio percebi que os veículos hegemônicos, principalmente nacionais, optam pela desumanidade e parcialidade ao tema Palestina e atrelam-se a Israel. Me questiono se alguém viu a mesma intensidade de reportagens e matérias trazendo um olhar humano aos palestinos”, ressalta.
O jornalista analisa a cobertura brasileira como fraca, desrespeitosa e pobre. Para ele, essa maneira de noticiar o que acontece com os palestinos é não somente um ataque aos Direitos Humanos e à ética, mas também a todos os profissionais da comunicação. “Os veículos financiados por empresas e pelos interesses políticos de seus chefes ou patrocinadores transformaram o trabalho do jornalista sério em uma espécie de marketing ambulante. Fico decepcionado com a linha editorial dos grandes veículos”.
Segundo o comunicólogo, um dos obstáculos para a divulgação séria e comprometida de informações da FEPAL são os ataques falaciosos sobre a entidade e seus integrantes. Entretanto, em seu ponto de vista, o grupo tornou-se a principal fonte de notícias relacionadas à Palestina de todas as pessoas no Brasil. O jornalista define a cobertura do genocídio na organização como impecável e pontual…”
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(*) “Gritos do Silêncio” é um programa radiofônico produzido por acadêmicos dos quatro cursos da Comunicação Social da UFSM: Jornalismo, Publicidade e Propaganda, Relações Públicas e Produção Editorial. Com o intuito de dar visibilidade a pautas ignoradas pela grande mídia, usa seu espaço para dar destaque às lutas de minorias sociais. Veiculado nas Rádio UniFM 107.9, os episódios vão ao ar nas quartas-feiras, das 13 às 14 horas. A equipe conta atualmente com 16 integrantes.
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