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O mundo parou – por Orlando Fonseca

“E não estamos todos livres da ação irresponsável do negacionismo”

Quem diria, em pleno século 21, uma canção profética de Raul Seixas, escrita nos obscuros anos 70, teria sua confirmação em nossas vidas. E, já exatos 5 anos daquele episódio, ainda não conseguimos nos livrar de seus efeitos. No dia 13 de março de 2020, fomos obrigados a ficar em nossas casas, por mais de duas semanas, olhando o mundo parado, temerosos, pela janela ou pela TV; quando pudemos pôr o pé para fora, ainda não havia uma pomba com um raminho no bico.

Fomos obrigados, por mais de dois anos, a manter distanciamento público, usar máscaras e passar álcool gel nas mãos. Aulas e eventos públicos foram suspensos, praias foram interditadas, países fecharam fronteiras, e quarentena para quem chegasse do exterior. As perdas econômicas atingiram trilhões de dólares, e a realidade política de diversos países foi alterada. Olhando assim, não parece que aquilo foi uma realidade universal. O mais triste de tudo foi perder familiares e amigos.

O vírus SARS-Cov 2 causou uma pandemia que assolou todos os continentes. Em apenas dois meses, desde a sua descoberta, saiu como praga apocalíptica fazendo estragos por onde circulou. Graças ao maior mutirão científico para debelar a sua tremenda letalidade, a vacina ficou pronta, em tempo recorde, e uma imensa rede de proteção dos diversos sistemas de saúde nacionais formou-se, sob a orientação da OMS.

Inúmeras pesquisas que já vinham sendo realizadas, em vários institutos e universidades, contribuíram para isso. No entanto, já haviam morrido milhões de infectados, e o  vírus ainda arregimentou um aliado de peso entre os negacionistas, o que o ajudou na tarefa mortal. Cálculos apontam que cerca de 20 milhões de pessoas morreram de Covid, com quase 800 milhões de pessoas oficialmente contaminadas.

Em nosso Brasil não foi diferente. A ignorância, as mistificações, a incúria do governante da época, o negativismo de seus correligionários, produziram mais mortes do que seria o razoável. O governo central demorou em providenciar a vacina e, o que é pior, incentivou a propaganda de medicações ineficazes. Tal postura permitiu que a Covid levasse a óbito mais de 700 mil pessoas, colocando o nosso país entre os de maior contaminação no mundo.

As sequelas ainda estão por aí, pois há quem continue a achar que as vacinas são um perigo e têm efeitos colaterais que contraindicam o seu uso. As vacinas, para um procedimento massivo de proteção coletiva, são comprovadamente eficazes. Em maio de 2023, a OMS anunciou que o vírus não representava mais uma ameaça sanitária internacional.

Cinco anos depois daquela tragédia, a pergunta: se houver uma nova pandemia, o mundo está preparado? Há discussões sérias em fóruns de autoridades e de cientistas, a respeito do tema. Existem, inclusive, considerações não quanto a “se” haverá, mas “quando”. E não estamos todos livres da ação irresponsável do negacionismo.

Nos EUA, voltou à cena o presidente que, em 2020, achava desnecessário um lockdown ou investimentos em vacinas. Trump chamou um negacionista para a gestão de saúde, Robert Kennedy Jr, e afastou o país da OMS, retirando as contribuições e se livrando das orientações desta importante instituição da ONU, no que se refere à saúde mundial.

Na canção “O Dia em que a Terra Parou”, de 1977, Raul Seixas disse que viu tudo em um sonho, maluco que era. Em um trecho, afirma: “Foi assim/ No dia em que todas as pessoas do planeta inteiro/ Resolveram que ninguém ia sair de casa”. Agora, depois de tudo o que passamos entre 2020 e 2023, os nossos pesadelos nos põem em alerta, porque o mundo pode parar outra vez.

Michael Ryan, diretor-executivo da OMS, afirma que  “a história mostra que uma pandemia só termina quando outra aparece”. Os estudos científicos corroboram com este temor, ou no mínimo apreensão, que nos leve a uma antecipação eficaz. Talvez, o mais difícil não seja erradicar os vírus e suas variantes, mas a ignorância que vai se disseminando, muito mais veloz, pelas redes sociais.

(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela “Da noite para o dia”.

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