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Turismo comunitário – por Atílio Alencar

Há sempre de se ter cuidado quando, especulando sobre os potencias econômicos de uma região ou cidade, enveredamos pelas possibilidades vinculadas ao turismo. Turismo, dito assim como se fosse uma solução pronta, pode ser o sinônimo exato de consumo destrutivo.

E Santa Maria é um bom caso para aplicarmos esta cautela – desde que tenhamos em mente a distinção entre cautela e inércia.

A cidade é cercada por morros donde foram erguidas, entre a bioesfera residual da Mata Atlântica, pequenas cidades fundadas por imigrantes europeus. São lugarejos simpáticos, de arquitetura típica e ritmo de vida bastante distinto do centro urbano em torno do qual orbitam.

Cada vez que percorremos o caminho entre Santa Maria e os povoados da Quarta Colônia da Imigração Italiana, a rota de pequenas cantinas, restaurantes, antigos moinhos, casarões ancestrais e balneários garante um giro pela história da colonização da região.

Claro que da empreitada colonizadora nos chega, através do patrimônio material e dos causos contados pelos mais velhos, o aspecto romântico e unilateral da jornada: a labuta, os tempos difíceis da instalação após a viagem transatlântica, o esforço conjunto para erguer capelas e o casario.

Não comparecem em tal narrativa a violência com os povos originários destas terras, nem o papel relegado aos escravos libertos pelo Estado, condenados ao descaso e à falta de um projeto de inserção social na condição de cidadãos brasileiros livres. Depois de séculos de escravidão negra, a recompensa para os libertos foi o gueto e a invisibilidade, enquanto o projeto de branqueamento populacional, do qual fez parte o estímulo governamental à migração europeia, seguia firme seu curso.

Mas com todas as injustiças que a História possa ter eclipsado, o fato é que da chegada de homens e mulheres europeus, constituindo uma nova massa de indivíduos com mão de obra disponível, resultaram focos de urbanização e socialização importantes para a geopolítica do Brasil. E com isso, claro, novas formações culturais floresceram.

Feita esta necessária digressão, voltemos ao tema do turismo em Santa Maria. Não é preciso ser nenhum especialista para perceber que aos sucessivos governos municipais falta conhecimento e vontade política para potencializar o turismo na cidade e região. Aqui, muito embora a situação geográfica seja privilegiada, não há sequer uma política pública pensada para a área.

Nada.

Quando muito, no limiar de seus insights delirantes, algum gestor de quinta categoria cogita a construção de um monumento religioso sobre a paisagem dos morros, já tão ameaçados de devastação pela inexistência de proteção às reservas ambientais.

Seria fundamental que os gestores públicos tivessem clareza que o turismo predatório não é uma hipótese plausível. A aposta em obras faraônicas, eventos espetaculares e outros paliativos cosméticos, além de insustentáveis e anacrônicos, só fazem agredir as formas de vida de uma região.

O que é vital é o investimento nas iniciativas pequenas, permanentes, que dariam base para um turismo comunitário, com retorno e valorização para os pequenos empreendimentos. Ao invés de hordas de turistas invadindo eventualmente uma cidade, como uma nuvem de gafanhotos famintos por satisfação descartável, a interação ritmada entre visitantes e a comunidade.

Para isso, seria preciso um mapeamento sério e detalhado dos pequenos empreendedores, comprometimento com a integridade histórica e cultural da cidade, construção aberta de políticas e formas de incentivo transparentes.

Como o atual governo se contenta com os votos angariados pelas luzes de Natal na Praça Saldanha, talvez seja tarefa para os que almejam o governo municipal nas próximas eleições a co-invenção de tais iniciativas, ao lado da sociedade civil.

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