Eleições – por Atílio Alencar
Quase impossível evitar o tema das eleições no momento. Tão difícil a tarefa que nem me atrevo a encará-la: falemos, pois, daquilo que se impõe como um tema de primeira importância para o aprofundamento da nossa frágil democracia. Ao contrário dos que preferem se abster dos processos eleitorais, apesar do jogo de cartas marcadas, da dança das cadeiras que consagra as mesmas siglas e seus partidos acessórios – ainda sim, não subestimo a importância da participação popular por meio do voto.
Claro que a representação política não suporta as demandas por democracia direta, uma entre as tantas bandeiras que vem ganhando força nas ruas do mundo inteiro, Brasil idem. Mas de todo modo, nossa História como povo dono do direito a eleger os próprios governantes ainda é recente demais para que esqueçamos os resultados nefastos da supressão das eleições. E se levarmos em conta pelo menos um dos casos recentes de levante popular e suas consequências na reformulação da ideia de partido político – o 15M espanhol e seu atual desdobramento, o Podemos! -, creio que não deveríamos banir algum tipo de otimismo quanto às possibilidades institucionais abertas no Brasil pós-junho de 2013. Mas digo isso pensando no futuro, nem tanto no agora.
Realidades incomparáveis em certa medida, mas interligadas pelos mesmos sinais de esgotamento de determinadas estruturas e modos de fazer política, tanto o Brasil quanto outros vizinhos sul-americanos e alguns países europeus precarizados pela crise econômica estão cada vez mais dando substância para a tese de que a desigualdade global traz a semente da resistência em nível igualmente global. Se o plano dos países ricos era globalizar a economia sob sua tutela, acabaram enfim por globalizar também a indignação.
Mas voltemos às eleições brasileiras: será que poderíamos afirmar que, em se tratando de ler as mensagens das ruas, algum partido captou algo essencialmente novo, que o fizesse redefinir a si mesmo em sua condição de ferramenta? É pouco provável em termos gerais; e absolutamente evidente que nenhuma das siglas situadas no núcleo da disputa pela presidência da República o fez.
Em se tratando de partidos menores, com estrutura ainda flexível e sensibilidade política menos comprometida com os arranjos do poder, alguns casos isolados indicam, ao menos, que há interesse em se pôr em diálogo com as jornadas do ano passado e seus efeitos ainda confusos sobre o cenário eleitoral. O que é diferente de dizer que algum partido esteja alterando radicalmente sua linguagem e programa por conta das manifestações – o que há, me parece, são mais casos de apoio (sincero ou não) ou repúdio do que de formulação e avanço à partir dos eventos.
No miolo da disputa eleitoral, as campanhas em condições de competitividade (atentem para o fato de que a linguagem aplicada, não por acaso, é a usual nos meios esportivos e empresariais – porque afinal é disso que se trata: jogos e negócios) quando citam genericamente “os protestos”, esquecem sempre de se incluírem entre os alvos da indignação coletiva. Esquecem que os acordos em nome da governabilidade desfiguraram quase que totalmente os perfis ideológicos dos partidos, fazendo parecer, em determinado momento, que todos são estilhaços de um único espelho em que se vê, de acordo com a posição dos cacos, o reflexo da mesma imagem com nuances sutis de cor e textura. Nunca a expressão “partido fisiológico” fez tanto sentido para os que se agarram ao poder com a urgência de quem precisa comer ou defecar.
É necessário um permanente exercício de leitura, cujas análises resultantes desmentem a si mesmas numa velocidade vertiginosa, para entender afinal quem defende o quê, quem escolhe um lado claro – com o ônus de perder apoio do outro -, a opção política de cada projeto. São banqueiros financiando campanhas por uma “nova política” (como se houvesse alguma novidade em manter o dinheiro com quem já o controla), candidatos ditos progressistas achando razoável a barganha de direitos civis por maior espaço de influência nesta ou naquela pauta, pastores religiosos fazendo suas crendices incidirem sobre leis que deveriam garantir as liberdades individuais. Tudo em nome do bem-estar do povo, claro.
Entretanto, está aí, as eleições estão chegando. E como bem sabemos, assim como não há vácuo na política, a anulação do voto não anula a eleição, nem tampouco seus resultados. Mas que estejamos preparados: se o junho de 2013 surtiu ou surtirá algum efeito positivo sobre a forma com que os partidos brasileiros entendem a representação política, talvez ainda não seja agora que isso se fará sentir. Por ora, o que temos é a velha situação de polarização entre o ruim e o impensável, com raríssimas exceções. Tomara que eu esteja errado.
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