Artigos

Brasil idoso – por Orlando Fonseca       

Cresce população no segmento. E também demanda por serviços especificos

Semana passada, tive de voltar ao protocolo da Prefeitura para solicitar uma nova credencial de idoso. Só com ela posso estacionar nos locais designados para pessoas que, como eu, têm mais de 60 anos. Lamentei, para o jovem atendente, o fato de fazer apenas dois anos da última solicitação, e que, neste decorrer de tempo, eu não havia ficado menos idoso. Muito pelo contrário. Ele riu e disse que eu deveria fazer esta observação para a Ouvidoria.

Burocracias do cotidiano à parte, não fui eu apenas que fiquei mais idoso, mas, segundo o IBGE, o Brasil também está ficando um país idoso, ou explicando melhor, de idosos. De ora em diante, será cada vez maior o número da população de sexagenários no país. É o que informa a PNAD contínua do primeiro trimestre de 2023. De modo que, acho eu, a Prefeitura deveria repensar o prazo, porque vai aumentar a demanda por credenciais.

São inúmeros os fatores que contribuem para este quadro, pois é uma realidade facilmente conferível. Hoje encontramos idosos não apenas em casas de repouso, em clínicas geriátricas ou nas filas de banco dedicadas a eles. Os idosos estão voltando às universidades, estão ativos, depois de aposentados, em novas ocupações profissionais, estão lépidos e faceiros em academias ou salões de festas – em especial as que resgatam a sonoridade dos anos 70, 80 e 90.

Para isso tem contribuído um cuidado pessoal com a saúde que já vem desde o final do século passado – estão colhendo os frutos daquela chamada “geração saúde”, a juventude dos anos 80 – que contagiou muita gente mais velha. Duas décadas antes, o país passava a contar com medicamentos e terapias que ajudaram os brasileiros do “baby boom” pós-guerra, a vislumbrarem uma vida com menos doenças na velhice – que está acontecendo agora.

Segundo os dados do IBGE, em 2012, o percentual dos idosos no total da população era de 7,7%. Neste ano, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, divulgada agora, mostra que, passados dez anos, houve um aumento, e a população com 65 anos ou mais no Brasil representa 10,5% dos brasileiros. E acompanha esta tendência de alta a faixa entre 30 e 64 anos, passando de 42,4% em, 2012 para 46,1% em 2022.

Ao mesmo tempo, confirmando a projeção do envelhecimento da população, a proporção da população mais jovem diminuiu. Aqueles com 18 a 29 anos passaram de 20,9% para 18,7% dos habitantes, enquanto as pessoas com menos de 18 anos recuaram de 29% em 2012 para 24,6% em 2022. Os números da fertilidade também vêm caindo, e as famílias estão cada vez menores, ao mesmo tempo em que o número de domicílios com uma pessoa aumenta.

Nas próximas décadas teremos um país de idosos, e a janela do bônus demográfico – população em idade ativa – está fechando. Perderam-se mais de duas décadas para capacitar e profissionalizar os jovens, com mais ofertas de vagas no Ensino Superior. A meta seria chegar a 35% da população entre 18 e 25 anos na universidade, ou já diplomados. Ainda não conseguimos mais do que 20%.

Grupo de jovens que nem estudam nem trabalham vem aumentando, porque têm necessidade de trabalhar, mas nem sempre encontram emprego com a falta de uma melhora na economia, nos últimos anos. Em vista de tudo isso, já vai longe o chamado “Poder Jovem nos anos 60 do século passado – maio de 68 ainda repercute, como pauta em aberto. Foram os jovens que iniciaram as mobilizações na retomada da democracia no Brasil.

Com o aumento da população de idosos haverá um número maior de busca por vagas para esse público nos estacionamentos. Pode ser que, num futuro próximo, seja necessário inverter o protocolo atual e emitir credencial de adulto jovem, sub-40, pois serão em menor número. Ou terão de passar a exigir a credencial só para septuagenários. Bem, não querendo ser apocalíptico, mas talvez nada disso seja necessário, pois a Inteligência Artificial virá para ocupar os espaços, restando-nos a pergunta: e a humanidade, e o humanismo, ainda terá vaga em algum estacionamento?

(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.

Artigos relacionados

ATENÇÃO


1) Sua opinião é importante. Opine! Mas, atenção: respeite as opiniões dos outros, quaisquer que sejam.

2) Fique no tema proposto pelo post, e argumente em torno dele.

3) Ofensas são terminantemente proibidas. Inclusive em relação aos autores do texto comentado, o que inclui o editor.

4) Não se utilize de letras maiúsculas (CAIXA ALTA). No mundo virtual, isso é grito. E grito não é argumento. Nunca.

5) Não esqueça: você tem responsabilidade legal pelo que escrever. Mesmo anônimo (o que o editor aceita), seu IP é identificado. E, portanto, uma ordem JUDICIAL pode obrigar o editor a divulgá-lo. Assim, comentários considerados inadequados serão vetados.


OBSERVAÇÃO FINAL:


A CP & S Comunicações Ltda é a proprietária do site. É uma empresa privada. Não é, portanto, concessão pública e, assim, tem direito legal e absoluto para aceitar ou rejeitar comentários.

6 Comentários

  1. ‘Humanismo’ é um discursinho que saiu da Unicamp. Tudo que não é comunista não é ‘humano’. Inteligencia Artificial, por enquanto, vai acabar com as medias e as submediocridades. O talento e a verdadeira inovação irão despontar. Motivo simples, acumulam a experiencia do que já foi feito. Inovação só em casos muito especificos e com sistemas muito especializados (AlphaGo por exemplo). Resumo é que muita coisa vai ter que se adaptar.

  2. ‘Com o aumento da população de idosos haverá um número maior de busca por vagas para esse público nos estacionamentos’. Isto é um chute, esta população pode optar por deixar o carro na garagem (utilizar só em viagens) ou até abandonar o carro particular e aderir aos aplicativos.

  3. Jovens não estudam e nem trabalham e são sustentados por algum parente. Problema não é a economia, é a mentalidade. Não estudam porque veem todos os dias gente muito diplomada em trabalhos, usando um anglicismo, meniais. Se o motorista do Uber é engenheiro ou economista, para que estudar? A resposta ‘estrutural’ não procede, vem da ideologia sem analisar os fatos.

  4. Universidade é um assunto a parte. Na Ianquelandia nos ultimos 7 anos mais de 90 universidades fecharam ou fundiram-se com outras. Em Chicago a Lincoln Universisty (Lincoln, Illinois), com quase 160 anos fechou as portas. Problema é a falta de procura. Qual o problema? ‘A meta seria chegar a 35% da população entre 18 e 25 anos na universidade.’ Tipico de burocratas, a meta é corrigir a estatistica. A motivação que vem depois também é algo pouco racional. Sim, porque se a maioria dos ‘diplomados’ for no curso de direito por exemplo (mercado já saturado), qual o efeito para o pais? Um monte de dinheiro jogado fora.

  5. Idosos ‘voltando a universidade’, etc., é classe media. Alas, em breve saberemos se a previdencia é um ‘esquema de piramide’ geracional. Faltarão jovens para tocar a economia ainda por cima.

  6. Credencial do idoso é algo. Exigem recadastramento de tempos em tempos para evitar que alguém utilize a de um(a) finado(a). Se uma criatura idosa estiver de passagem por Santa Maria estacionar num local reservado e não tiver credencial vai ser multado? Vai ter que discutir judicialmente um direito concedido por lei federal e limitado por uma municipal? Traz a lembrança a proporcionalidade e razoabilidade. É o tipo de medida para facilitar a fiscalização e não a vida do cidadão e da cidadã (que está no espirito da lei, a comodidade). Alternativas? Existem. Para quem é de fora e está de passagem bastaria apresentar a identidade. Para os autoctones uma copia colorida (nem necessidade de ser autenticada) de um documento com foto.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo