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No Rio Grande, houve um surreal intento de “golpe” – por Bruno Lima Rocha

O Rio Grande do Sul viveu nos dias antecederam e posteriores ao feriado de 12 de outubro (de múltiplos significados por sinal) mais um episódio de surrealismo político. A governadora economista neoclássica Yeda Crusius (PSDB), estando em São Paulo, desistiu de viajar para os Estados Unidos na sexta-feira dia 9 de outubro. O motivo alegado: uma tentativa de golpe por parte de seu vice-governador rebelde, Paulo Afonso Feijó (DEM), ex-presidente a Federasul, herdeiro falimentar da Rede Econômico e operador de lobbies e grupos de pressão como foi o caso na ULBRA.

Um leitor mais atento pode se perguntar. Diante desses personagens, podemos esperar algo além de tudo o que for possível e mais alguns lances fora de roteiro? Não, realmente não. E, sejamos justos. Esta não foi a primeira vez que deixa de viajar temendo pelos atos de governo de Feijó. O vice em rebeldia podia utilizar da força de decretos criando uma lambança jurídica com os contratos entre o Piratini e agentes econômicos e financeiros. Isto, além de incidir sobre as jóias da Província, o Banrisul.

Por isso a ex-professora da UFRGS não saiu. Dizendo-se evitar o pior, Yeda suspendeu um cronograma relevante para seu governo, com visitas de aumento de prestígio. Dentre elas, uma larga agenda no Banco Mundial, instituição de onde tomou um empréstimo contratualizado por trinta anos, na prática emparedando os governos futuros a cumprir as metas da instituição financeira, ou entrando para o clube dos quebradores de contrato. Avaliamos o nível de risco para seu governo por isso. Portanto, ao abrir mão desta pauta, é porque ao menos parte de sua equipe tomou a ameaça de golpe estadual em sério.

De minha parte considero um exagero. Somente a mídia mais palaciana chegou a considerar a possibilidade real de “golpe”. Em tese o movimento paredista aconteceria quando o presidente da Assembléia Legislativa, deputado estadual Ivar Pavan (PT-RS), considerasse vacante o Poder Executivo, uma vez que a titular estaria fora e o vice fosse impedido de assumir. Uma manobra judicial garantiria a entrada de Feijó no Palácio, e simultaneamente, seguiria o bombardeio midiático para cima da governadora eleita. Ainda segundo a fonte palaciana, a ofensiva jurídica partiria do brioso Fórum de Servidores Públicos, entrando com ação para que Feijó tomasse posse. A maré de defesa anti-golpe veio junto de mais um problema sério na relação entre o patrimônio público e a vida privada de Yeda.

Toda semana tem alguma difusão ruim de sua imagem. A penúltima, além da confusão na CPI do Impeachment (no bate boca entre os deputados estaduais Raul Pont/PT e Zilá Breitenbach/PSDB), foi a divulgação da compra de móveis, com verba pública, para sua residência privada uma vez que nem ela e nem sua família vivem na ala residencial do Palácio Piratini. Segundo a análise midiática do Executivo provincial, o bombardeio viria seguido do abandono. E, esta carga somada com os depoimentos “espontâneos” de Feijó ao MPF, poderiam criar um clima de “revolução de veludo” em pleno feriado.

Voltando ao “golpe”, supostamente o emparedamento político-judicial fora bloqueado quando Yeda anuncia que não mais viajaria para o exterior. É fato, poderia haver alguma tentativa de posse ou interpelação, mas esta resultaria apenas em outro fato político depondo contra a governadora. Mais um nas dezenas de ataques, denúncias e erros crassos cometidos por ela e pelos seus desde antes de tomar posse em 1º de janeiro de 2007, quando no final de 2006 conseguiu ser derrotada sem ocupar o cargo ainda. Mas, mazelas de condução política à parte, daí a se organizar um golpe branco em um governo estadual com maioria na Assembléia, faltando um ano das eleições gerais de 2010, soa como absurdo ou factóide. E era.

A governadora tampouco se calara diante da intermediação do Grupo RBS, a quem parece temer, mas respeitar. Em seu blog Yeda afirma que não viajar foi decisão dela e alega estar evitando dois elementos midiáticos protagonizados por Feijó. O primeiro diz respeito às críticas dos projetos da área fiscal. Detalhe, todos estes projetos estão nos encargos de contrapartida do empréstimo junto ao Banco Mundial. Ou seja, quem eleito foi pela cidadania gaúcha é quem executa a ação de tipo vende-pátria dos financistas globais. Tal decisão foi sempre fielmente respaldada na unanimidade obtida para o empréstimo na Assembléia Legislativa (lembrando: com PT, PSB, PC do B e PDT votando com Yeda) assim como o foi em Brasília, diante do mui nobre e ilibado Senado da República. Voltando aos motivos midiáticos, segundo ela própria, o segundo é evitar aumentar a repercussão do depoimento gravado em vídeo – e sem acordo judicial – pelo próprio vice junto ao Ministério Público Federal e amplamente difundido pela mídia local. 

Tudo isto me pareceu um intento de criar um contra-ataque de estilo factóide baseado apenas em uma especulação. Na política virtual, se combate com bens simbólicos cujos significados estão longe dos cenários de participação. E, para alegria deste analista, a governadora confirma minha hipótese com suas próprias palavras.

Bruno Lima Rocha ([email protected]) é cientista político com doutorado e mestrado pela UFRGS, jornalista graduado pela UFRJ; docente de comunicação e pesquisador 1 da Unisinos (vinculado ao Grupo Cepos/PPG Com: www.grupocepos.net); é editor do portal Estratégia & Análise (www.estrategiaeanalise.com.br). 

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