Segurança e (in) segurança – por Carlos Dominguez
Existem hoje no Brasil duas correntes principais na defesa de modelos de segurança pública. Um, herança dos tempos coloniais, onde a violência e a criminalidade eram atribuídas aqueles que não detinham o poder e não faziam parte da elite branca. Ou seja: os que não eram da oligarquia portuguesa dominante no país. Contra eles, o monopólio de violência era usado de forma coercitiva. Morte ou prisão, quando sobrava alguém para ser preso.
O segundo prega a solução social de tudo que está relacionado a crime e violência. São estudos de iminentes professores doutores de nossa academia que não tem nenhuma aplicabilidade real.
Esses dois modelos são baseados na questão da violência relacionada com a questão do território. O problema é que a questão territorial, da década de 70 para cá, não mais é relevante para a sociedade virtualizada nas comunicações.
Portanto, uma terceira possibilidade deve ser implantada pelo Estado. A proposta prevê que as relações entre as polícias (federal e estadual) sejam ampliadas nos municípios em um formato de gabinete de segurança pública que utilize-se da capilaridade do poder municipal em suas relações com a população somado aos órgãos como o Ministério Público e Poder Judiciário. Quem está em contato direto com a população (poder municipal).
Essas idéias acima vem sendo divulgadas pelo Ministro da Justiça, Tarso Genro, em suas peregrinações pelo país. O PRONASCI – Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania já está implantado como projeto piloto em Londrina (PR) e vai entrar no Rio Grande do Sul na Região do Médio Alto Uruguai, capitaneado pela cidade de Frederico Westphalen.
Em reunião na região, na última segunda-feira, Tarso buscou atrair autoridades policiais e municipais acenando com financiamento de projetos, equipamentos, treinamento e até bolsas que complementariam o baixo salário das corporações policiais, como a Brigada Militar e a Polícia Civil. Tudo voltado para buscar os jovens que estariam na chamada “zona gris”, aqueles que já até cometeram algum crime (tráfico de drogas na maioria das vezes) mas ainda não optaram definitivamente pela delinqüência. Estes jovens, dentro do programa, não são encaminhados para a polícia e sim para projetos profissionalizantes.
Um trabalho louvável, de médio e longo prazo, que busca interromper a lógica do crime organizado. Nas intervenções de segurança norteadas pelo uso exclusivo da força, típico das invasões de morros no Rio de Janeiro onde a polícia entra, mata e vai embora, fortalecendo apenas o crime organizado que reocupa o território momentos depois que a Polícia Militar deixa o local. É o jovem que deve ser alvo das políticas de Estado. Em qualquer local do país, de qualquer esfera de governo.
Quando os pais despejam os filhos nas escolas abrindo mão de educarem em valores diferentes da cultura de morte e violência do padrão hollywoodiano de cinema e televisão, estes mesmos pais estão deixando seus queridos filhos nas portas da criminalidade. Que, é bom que se diga, não tem mais endereço. Não é mais das áreas pobres da cidade, como nas décadas de 50 e 60. Se temos mobilidade no nosso consumo de informação isto é igual para todos. O fenômeno das redes via Internet possibilita acesso irrestrito de informações, em qualquer hora, em qualquer lugar.
E este legado de conhecimento pode e deve ser usado para obter conhecimento e formar cultura. Não para produzir aliens sociais. Indivíduos sem a mínima capacidade de viver em sociedade isolados em seus mundinhos virtuais próprios.
A lógica perversa de segurança pública oferecida pelo estado sempre serviu para que o aparato de segurança mandasse a classe pobre para bem longe das áreas ocupadas pelos mais ricos. Era uma polícia feita para prender e arrebentar quem invadisse o mundo dourado dos membros da oligarquia dominante. Também era (e as vezes ainda é) instrumento político para atacar adversários políticos ou econômicos. Não recordo de outras tentativas que busquem subverter esta lógica oferecendo às polícias a possibilidade de aderir voluntariamente aos programas de ações comunitárias, sem abrir mão, é claro, do aparato de controle social. O crime sempre existiu e dificilmente deixará de existir. Mas o que é inconcebível é que o Estado abandone o setor mais carente da sociedade. Se é feito, é porque alguém no circuito superior está ganhando muito com isto tudo.
Todo mundo na polícia sabe que a criminalidade organizada não esta organizada apenas nos morros, favelas e bairros pobres. Ela está, sim, refugiada nos condomínios fechados e mansões de luxo.
Carlos Dominguez, jornalista
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