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Vergonha alheia – por Luciano Ribas

Diferentemente do que alguns podem supor, meu assunto de hoje não será nem futebol, nem o aniversário da UFSM. Embora estas sejam questões muito interessantes, desejo falar de algo bem diferente, a chamada “vergonha alheia”.

Não sei quem inventou a expressão, mas já existe até um site com esse nome, o www.vergonhaalheia.com.br, que se define “como um repositório desse Sentimento Universal que é a Vergonha Alheia”. Ou seja, o assunto tem ares de coisa séria.

Basicamente, se estou certo, vergonha alheia é o sentimento de envergonhar-se pelo vexame dos outros. É como se nos colocássemos no lugar da outra pessoa e sentíssemos a vergonha que ela sentiu (ou deveria ter sentido) por algo que fez, sofreu ou esteve envolvida de alguma forma.

O que complica um pouco, porém, é que o “sentir vergonha” de algo importa um mínimo de consciência a respeito do vexame, o que nem sempre existe. O que nos leva a concluir que é possível sentir vergonha alheia por quem não sabe que está sendo exposto a uma situação vergonhosa, ao menos na opinião dos outros. Podemos questionar se nesse caso a vergonha seria mesmo alheia, mas aí é filosofia barata demais até mesmo para este que vos escreve. Prefiro que busquemos exemplos práticos e concretos, dando destaque para os locais, já que “cantar” a nossa aldeia geralmente rende mais.

Suponho que podem ser enquadrados como vergonha alheia o vereador flagrado pedindo aos assessores “contribuições ao seu projeto social” e o outro que queria averiguar a “cercabilidade” de uma determinada área. Também o ato de enroscar um balão numa torre de telefonia às vésperas de um pleito (especialmente se a pessoa consegue reincidir no fiasco eleitoral) e escrever “conheçe” numa propaganda institucional de um órgão público são “vergonhosidades” dos outros, creio eu. Mas na área política talvez nada supere o parlamentar que, ao saudar a colega que assumiria um cargo na capital federal, declarou que ela “estava indo dessa para uma melhor”…

Outros exemplos vêm do rádio local. Um dia desses um veterano radialista convidou o colega para “obrarem”, sem esclarecer exatamente se isso ocorreria no vaso sanitário ou no estúdio mesmo. O mesmo profissional não entendia como o piloto do Airbus da Air France que se acidentou há cerca de um ano não viu pelo “pára-brisa” a chegada do mau tempo (talvez ele imagine que o piloto poderia ter posto a cabeça para fora da janela pra enxergar melhor). Mas na área radiofônica eu gosto mesmo é do spot de um medicamento fitoterápico que cura de “boca seca” a hemorróidas e “já vem pronto para tomar” (aonde, ninguém sabe).

Mas se há vergonha alheia deve também existir orgulho alheio, que ocorreria quando sentimos a satisfação pelo que outra pessoa fez. Eu, por exemplo, sinto profundo orgulho em ver uma mulher torturada pela ditadura suceder um retirante nordestino na presidência do meu país. Na verdade, sou extremamente orgulhoso do país que eles ajudaram a fazer com que se encontrasse com seu povo e que, hoje, tem a chance de corrigir as injustiças que ainda persistem.

E nessa semana também tive a oportunidade de me orgulhar de um pequeno time africano que, contra tudo e (quase) todos, provou que as coisas já não são mais as mesmas. O Mazembe mostrou que um outro mundo realmente é possível, ao menos nos gramados do Oriente Médio.

Ok, eu disse que não falaria de futebol, mas foi inevitável. A vergonha alheia foi mais forte.

Luciano do Monte Ribas é designer gráfico, graduado em Desenho Industrial e mestre em Artes Visuais pela UFSM. É sócio da Inox – Ideias Sempre Novas, agência santa-mariense de publicidade e propaganda, há dez anos. Para segui-lo no Twitter: www.twitter.com/monteribas.

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4 Comentários

  1. Felipe Martins :
    Boa Tarde Luciano,
    Antes de mais nada,bom saber que nos encontrou pesquisando sobre o assunto!
    Em segundo lugar, gostaria de dizer que nosso site não tem a intenção de levar nada a sério! Pelo contrário…exploramos esse termo por ser o que melhor se adequava ao objetivo do site.
    Sites de humor tem como objetivo mostrar coisas engraçadas (sério?rs) e infelizmente as pessoas abusam de situaçoes absurdas, que nos remetem a Vergonha Alheia.
    Gostei muito do seu texto e gostaria de parabenizá-lo. Apenas fazer um adendo, o termo se tornou usual e as pessoas adoraram porque as pessoas nao tem senso.Como deixar parar na internet, um organismo vivíssimo, de onde nada é apagado, essas situações.
    Adicionado aos favoritos e já estou lendo outros textos.
    Abraços

    Felipe, a internet proporciona esse tipo de aproximação entre pessoas que talvez nunca se encontrassem.
    Aprecio esse tipo de humor que combina inteligência e um leve sarcasmo. Por isso quando falei em “coisa séria” não era exatamente sério o que eu dizia, só um reforço no contexto do texto.
    Por fim, agora que tu conheceu nossa Santa Maria, pode visitar. Tem muita vergonha alheia por aqui atualmente.

    Grande abraço!

    Luciano Ribas

  2. Boa Tarde Luciano,

    Antes de mais nada,bom saber que nos encontrou pesquisando sobre o assunto!

    Em segundo lugar, gostaria de dizer que nosso site não tem a intenção de levar nada a sério! Pelo contrário…exploramos esse termo por ser o que melhor se adequava ao objetivo do site.

    Sites de humor tem como objetivo mostrar coisas engraçadas (sério?rs) e infelizmente as pessoas abusam de situaçoes absurdas, que nos remetem a Vergonha Alheia.

    Gostei muito do seu texto e gostaria de parabenizá-lo. Apenas fazer um adendo, o termo se tornou usual e as pessoas adoraram porque as pessoas nao tem senso.Como deixar parar na internet, um organismo vivíssimo, de onde nada é apagado, essas situações.

    Adicionado aos favoritos e já estou lendo outros textos.

    Abraços

  3. Por certo é um sentimento verdadeiro e até comum. Eu, por exemplo, senti vergonha por parte do povo gaúcho, pouco menos do que a metade, naquele episódio do Maracanã, final do ano passado, quando o dito “Imortal Tricolor” transformou-se em “Imoral Tricolor”. É, “as vezes, né mano!”, os outros nos fazem sentir envergonhados!

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