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Aos olhos da excelência: a vaca do judiciário e o advogado leiteiro – por Vitor Hugo do Amaral Ferreira

A intenção posta nestas linhas não é promover a ofensa, nem tampouco atacar os investidos de excelência, mas sim promover a defesa da dignidade do advogado, da advocacia. Mesmo que se pinte a crise do sistema em tom de piada, que a moldure no deboche, não é aceitável que se agrida aqueles que fazem de sua atividade a promoção da justiça.

O fato que passo a questionar compreende quadro que ornamenta a sala de audiência da 2ª Vara de Família, da Comarca de Santa Maria-RS. A tela expõe a figura de uma vaca (litígio), disputada entre as partes (autor e réu), enquanto o juiz observa a situação, o advogado está tirando leite da vaca.

O quadro denigre e compromete a relação entre a advocacia e o Poder Judiciário. Creio que ver o advogado como um usurpador do litígio não seja entendimento da maioria, certamente manifestação isolada. Porém, o juiz em representação ao Estado, enquanto Poder Judiciário, não tem o direito de se prestar à manifestação contrária à dignidade do advogado.

Não precisamos tomar muitas horas de apreciação da obra para reconhecermos o tom pejorativo à advocacia. Retrata a depreciação da figura do advogado como mero tomador de proveitos frente ao litígio instaurado pelas partes. A imagem mostra autor e réu utilizando-se da força para ver quem será o vencedor, enquanto o advogado em nada colabora, não representa os interesses do seu cliente, aproveitando-se da situação em benefício e proveito próprio. O fato é complexo e aproveitando-se da imagem exposta, como diria o gaúcho, a situação é mais complicada que apartar guaxos com balde de leite.

Em que pese, sustenta-se que a igualdade apregoada pela Constituição Federal, no sentido de ausência de hierarquia entre juiz de direito e advogado, deve encorpar-se à realidade fática. Juiz não pode emitir juízo de valor sobre a atuação de advogado no que tange ao desenvolvimento de sua atividade.

Por certo, nossa lida não é fácil e mais difícil se torna quando em espaço (público) de trabalho nos é apresentado quadro que expõe ao ridículo o advogado, materializa parcialidade do juízo que deveria acolhê-lo e não oprimi-lo, ofende-lo. Pendurar o deboche, em figura que ironiza o advogado como sujeito temerário, oportunista do conflito entre as partes, é agredir o próprio Poder Judiciário.

Nada contra aos dotes decorativos, amenizar as tensões das salas de audiência é inclusive adequado, mas o juiz-decorador deveria ter tomado o cuidado que ali estão também advogados.  Ornamentar a sala de audiência com quadro que ostenta ironia escrachada aos advogados, que agarrados às tetas da vaca não atendem às partes, é ofensivo à advocacia.

É do conhecimento de todos, que o Poder Judiciário sofre de suas mazelas, comporta suas crises, como é próprio de qualquer instituição. Ainda é oportuno discutirmos a ampliação do acesso à justiça e tratarmos a morosidade do judiciário. Precisamos combater os efeitos da má justiça, travestida pela parcialidade, consubstanciada à má prestação jurisdicional. Na mesma proporção, é pertinente identificarmos os advogados absorvidos pelo sistema, na contramão da justiça, que dos litígios alheios angariam benefício próprio, distantes dos anseios das partes.

Ora, reconhecer tais questões é necessário, enfrentá-las é urgente. Cada um tem sua parcela de colaboração à boa justiça, negligenciar o seu papel é permitir que o judiciário torne-se o reino, daqueles que atribuídos de poder, agridem o sistema. Ao contrário de honrar o Poder Judiciário acabam por ultrajá-lo.

Excelência! O Poder Judiciário gaúcho é reconhecido por sua grandeza e manifestações que vão ao encontro da justiça, o que muito me orgulha. Nossos problemas são diversos, mas nossas qualidades ainda são tantas. Neste sentido, é dos pagos gaúchos a lição de que não basta pra ser livre, ser forte, aguerrido e bravo. Povo que não tem virtude acaba por ser escravo. Das nossas virtudes, aprendi que peão que tem cachorro bom de faro não tem vaca desgarrada; que em suas lidas sempre é tempo de tomar às rédeas, pois se o cavalo troteia aos moldes de quem o encilha, não há doma perdida.

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4 Comentários

  1. O Judiciario gauchi, conhecido por decisoes justas e inovadoras, e por ter em seus quadros pessoas que exercem a magistratura cm dignidade, pode tambem como em qualquer outra profissao ter em seus quadros quem nao dignifica o cargo que exerce. Quem existem advogados nao merecedores de serem “operadores do Direito”, por outro lado temos muitos que o exercem a advogacia com dignidade. O “Juiz” Rafael, com certeza esqueceu que para ser o que hoje é (magistrado),precisou sim de uma formação como “operador do Direito”, e ao “escrachar” de forma indigna a figura do Advogado, o fez contra si mesmo, mas pelo jeito e pela postura deve ele fazer parte dessa “parte” nao digna de exercer o ” Direito”, e afinal como bem colocou o Promotor Adede Y castro, ao querer criticar a classe dos advogados ao “apenas observar” e nada fazer fica apenas “silente”.Parabens Vitor Hugo. ” o que me preocupa nao é os grito dos maus. Mas o silencio dos bons”(Martin Luther King), ainda bem que tu nao fostes um silencioso.

  2. Como se não existissem advogados que ganham dinheiro com a eterna briga de seus clientes, e pior, nada fazem, pois não querem deixar de mamar !!!

  3. Caros amigos e colegas,
    A questão levantada pelo nobre colega Vitor Hugo e vários outros advogados da região pode ser considerada como somente a ponta do “iceberg”. Ou seja, o quadro posto pelo referido juiz é somente aquilo que visivelmente por ser observado por todos.
    Na realidade existem muitas outras situações, levantadas pelo mesmo magistrado e por alguns outros, que colocam a situação do advogado (profissão que eu, dentre vários, exercem com muita nobreza e por convicção pessoal) em uma situação de submissão.
    O mais importante, além de punir aos que utilizam a nobre classe de advogados como “bala de canhão” para suas indignações ao sistema, é também refletir sobre o verdadeiro papel da nossa profissão. Existem muitos temas a serem debatidos como lembra o colega Bruno, mas nunca é demais reforçar os temas que venham a impedir o livre e digno exercício de nossas prerrogativas.
    Lembro do famoso Norberto Bobbio que me ensinou um dia que as questões relativas a direitos humanos/fundamentais não devem ser somente debatidas do ponto de vista filosófico de sua justificação, mas principalmente do ponto de vista político da sua garantia real, seja nas casas, ruas, corredores e salas de audiência.
    Fica o pequeno e humilde comentário de um jovem advogado, que talvez pelo jovem ainda possuo ganas de alterar a realidade.
    Um abraço, Cristian.

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