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E um marginal dos estádios virou ‘pop star’ – por Anderson Santos e Dijair Brilhantes

Coluna Além das 4 linhas –  edição da semana de 27 de dezembro de 2011 – por Anderson Santos (editor) e Dijair Brilhantes

POLÍCIA X FUTEBOL

Na teoria, o Brasil é um país democrático, onde todos têm o direito à liberdade de expressão. Nos estádios de futebol tudo é diferente, nem mesmo o Estatuto do Torcedor, aprovado em 2003, que entende o torcedor como consumidor, só assim um possuidor de direitos, é respeitado.

A segurança pública prefere tomar suas próprias decisões, tendo total respaldo do Estado. Assim, a vida do cidadão fica na mão de policiais despreparados – e mal remunerados. Estamos às vésperas de sediar o maior evento esportivo do mundo e queremos saber como serão tratados os torcedores turistas: privilegiados ou como marginais, semelhante ao que ocorre com os brasileiros?

POLÍCIA OPRESSORA     

Os articulistas da Além das Quatro Linhas já frequentaram diversos estádios do Brasil, e em (quase) todos as cenas se repetem: a polícia tenta oprimir o que entende ser desrespeitoso, ou contra a lei. O problema é para nós, simples torcedores, sabermos o que os policiais entendem por isso.

No início deste ano, a PM carioca impediu a torcida do Fluminense de entrar no estádio com uma faixa que dizia “Muricy amarelão” – o técnico abandonou o clube alegando falta de estrutura em meio a Libertadores.

Em agosto, as torcidas de todo o Brasil organizaram um protesto contra o presidente da CBF, Ricardo Teixeira. A rodada foi batizada como o dia do “Fora Teixeira”. Em alguns Estados a Polícia Militar proibiu a entrada de faixas e cartazes alegando que atrapalharia a visibilidade do jogo, ou que o material das faixas era tóxico, o que poderia causar um incêndio.

Em outubro, a torcida do Grêmio preparava uma grande manifestação contra Ronaldinho (Ex-)Gaúcho no jogo Grêmio X Flamengo. A Brigada Militar proibiu a entrada de faixas contra o R-10, alegando ser um ato hostil e que em nada contribuiria para o espetáculo (?).

Torcedores do Grêmio foram diversas vezes agredidos pela Brigada Militar quando faziam protestos pacíficos contra o presidente do clube, Paulo Odone. Detalhe: o agora mecenas Odone – afinal, pagar R$ 500 mil só a um jogador… – é deputado estadual pelo PPS do Rio Grande do Sul.

A “segurança pública” parece ser contra qualquer tipo de manifestação popular.

ACUSADO TEM DIA DE POP STAR

No início do mês de dezembro o estádio Beira-Rio foi o palco de um jogo beneficente. A partida marcava a despedida do ex-jogador Fabiano, ídolo do Internacional no final da década de 90. Uma briga entre torcidas organizadas do próprio clube (!!!) deixou quatro pessoas feridas.

A briga foi fruto de uma confusão com um dos líderes de uma das facções no clássico Gre-Nal, pela última rodada do Brasileirão 2011, semanas antes. As ofensas continuaram via redes sociais e acabou terminando no jogo festivo.

A falta de segurança foi notória, já que um torcedor estava armado com uma faca nas dependências do Beira-Rio – que será sede da Copa do Mundo FIFA 2014, “graças” à leitura por 15 minutos de cada conselheiro colorado do contrato da Andrade Gutierrez.

Na última sexta-feira, o jornal Zero Hora (Grupo RBS) optou por fazer uma entrevista exclusiva com um dos acusados, que não merece ter seu nome citado neste espaço. Este já alcançou o objetivo, ter seu dia de Pop Star.

Curiosamente, a maioria dos meios de comunicação, com raras exceções, opta por mostrar as torcidas organizadas como grupos de vândalos, sem querer adentrar a questões importantes que cercam a relação entre clubes, atletas, TOs e torcedores – veja aqui um dos raros casos, da estatal TV Brasil. Ir além dos fatos, seguir o rastro, fazer jornalismo, … é difícil de se fazer?

TRISTE REALIDADE

Vivemos uma triste realidade sobre o que diz respeito à segurança pública, por vezes chegamos a duvidar se ela existe ou, no mínimo, para quem ela existe.

Todas as vezes que vimos brigas entre torcidas, dentro ou fora dos estádios – cada vez mais fora, refletindo a falta de segurança geral –, quando a polícia chegou a violência aumentou ainda mais. Parece-nos que ao invés de tentar manter a ordem, opta-se por esperar a desordem ocorrer e combatê-la, primeiro batendo e só depois querer saber quem eram os culpados.

Não é raro ver no meio da torcida a polícia batendo em senhores de idade, em pais que tentam proteger seus filhos ou espalhando spray de pimenta para tudo o que é lado. Na prática, isso pouco serve para punir quem merecia.

O Estatuto do Torcedor, renovado ano passado, propunha que o torcedor preso não entrasse mais nos estádios, mas pouco é visto ou ouvido de algo de prático, para além das punições a entrar no estádio com símbolos das organizadas ou extinção das mesmas. Como se a faixa saísse batendo em todo mundo… Dificilmente alguém é preso ou punido mesmo nos casos mais graves – como a da Supercopa de juniores de 1995, entre São Paulo e Palmeiras.

Quando as empresas de mídia fazem campanhas para as famílias irem aos estádios, a nós fica a dúvida de quem lhes dará segurança, principalmente fora das arenas, em que mal temos isto no cotidiano.

NADA DE “TORCIDAS” E DE “POLÍCIAS”

Na Inglaterra, os tão famosos hooligans foram responsáveis pela “limpeza” dos estádios do Reino Unido, por mais que continuem existindo para os clássicos mais ferrenhos. O mundo não os vê mais, porém não vê também torcidas de futebol e sim receptores de espetáculos teatrais, que só gritam e aplaudem quando “autorizados”.

Para o bem do futebol, a exclusão dos “torcedores” que iam aos campos não para ver as partidas e apoiar os seus times, mas para xingar a “torcida” do rival – por mais que o jogo não envolva os dois clubes – e para praticar atos de vandalismo, poderia ser uma boa alternativa. Mas será que o problema é só esse?

Será que a Polícia, no caso brasileiro, contentaria-se a ter que trabalhar em pleno domingo, sem receber nada a mais para isso – a não ser, de vez em quando, um lanche, para ficar só olhando a torcida vibrar, gritar e xingar, quando necessário? Há preparação dos funcionários desta instituição, em qualquer parte do país, para saber tratar os torcedores, identificar quem começou uma confusão e que efetivamente merece punição?

Querer “público teatral” é tirar, mais uma vez, o futebol do povo, aumentar o valor dos ingressos, “elitizar” os receptores das partidas e acabar com o incentivo dos torcedores. O que é outra questão ainda mais problemática.

Nada, nada mesmo, vale a pena se modifica o que o futebol tem de melhor: que é a possibilidade da paixão ser aflorada naqueles 90 minutos, sem que você tenha que receber um sermão do patrão ou de qualquer entidade repressiva. Nem violência entre torcidas, nem violência da polícia, mas também muito menos um comportamento teatral.

Se futebol é um espetáculo também é graças a nós torcedores, que estamos ali para aplaudir, apoiar, criticar, xingar, construir a sonoridade e a visualidade da partida. Mas também que pagamos ingressos, impostos – inclusive para as polícias nos darem segurança e não medo –, geramos todo um mercado através do marketing e da transmissão pela Indústria Cultural.

Enfim, já passou da hora de as entidades que organizam o futebol, o Estado e os clubes entenderem que as estrelas são os torcedores.

PAUSA

Continuando com esta premissa de atuação no escrever sobre o esporte que já foi bretão, brasileiro e agora parece ser catalão, que esta coluna se despede d@s noss@s leitor@s em 2011. Desejando um 2012 muito melhor para o futebol aqui no Brasil, especialmente “Além das Quatro Linhas”. Paramos por algumas semanas. Até o início dos Estaduais!

QUEM ESCREVE:

Anderson Santos é jornalista e mestrando em comunicação social na Unisinos ([email protected]), Dijair Brilhantes ([email protected]) é estudante de jornalismo

Twitter da coluna: @alem_das4linhas

 

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