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Violência e futebol – por Anderson Santos e Bruno Lima Rocha

Coluna Além das 4 linhas –  edição da semana de 29 de março de 2012 – por Anderson Santos (editor) e Bruno Lima Rocha

Mais uma vez a pauta pensada para a coluna era outra, no caso, a pauta derrubada abordava propostas de mudanças na gerência do futebol brasileiro. O assunto mudou, mas não tanto, já que o assunto aqui tratado também deve entrar no bolo de propostas de alterações.

A violência ganhou as manchetes dos jornais esportivos do Brasil e mudou a rota das notícias sobre a rodada do final de semana para as páginas policiais. Violência, mortes e agressões das forças da “ordem”. Esta coluna se dedica a entender o porquê há tantos que tentam igualar futebol a estas práticas nefastas.

(MAIS) DUAS MORTES…

Tarde de domingo. A rodada do Paulistão colocava frente a frente o melhor ataque e a melhor defesa do campeonato. O líder contra o terceiro colocado. Um clássico que há anos não tinha os rivais em boa fase ao mesmo tempo. O Corinthians venceu o Palmeiras em campo por 2 a 1, mas, no dia seguinte, não foi a virada em três minutos que tirou a invencibilidade de 22 jogos do rival a manchete nos meios de comunicação.

Antes da partida, um confronto entre 500 “torcedores” das duas principais organizadas dos clubes ocorreu na Avenida Inajar de Souza, na zona norte paulistana, passou por cima da escolta policial e, até o momento, deixou dois mortos, jovens de 19 e 21 anos. A saber, Gaviões da Fiel e Mancha (Alvi)Verde promoveram o confronto. São “torcidas-empresa”, com escolas de samba, uma legião de afiliados e muita força na interna de seus clubes.

A Federação Paulista de Futebol – dando resposta para o óbito e para os “gringos” que virão para a Copa – proibiu as torcidas de entrarem em campo no decorrer do Paulistão. Já a Polícia Militar, surpreendida com a ação dos “torcedores” corintianos frente à guarnição de duas viaturas para “proteger” “torcedores” palmeirenses, fez apreensão de computadores nas sedes das organizadas e prendeu cinco diretores da Mancha.

Dois tipos de crítica foram realizadas sobre o assunto. O primeiro tipo é a tradicional execração das organizadas. De fato, por conta do “código de ética” das T.O.s, a corintiana resolveu se vingar de outros fatos no dia desse jogo. Num confronto no ano passado, a palmeirense teria ido para o confronto com armas de fogo. Na disputa pelo Carnaval de SP, em meio à confusão de rasgar as cédulas com as notas, um integrante da palmeirense teria dado um soco numa “torcedora” da organizada corintiana.

Do outro lado, há grande questionamento sobre a inevitabilidade desse fato ter ocorrido. Mensagens em redes sociais já anteviam o confronto, dias antes do clássico, e nada foi feito – e, nesse caso, não precisa de muito mesmo, é só “seguir” membros de T.O.s… O código da vendetta foi evocado, mas nos dias de hoje não precisa de motivação para a idiotice coletiva de promover a guerra entre a base da pirâmide social.

Para se ter uma idéia de como a PM que promovera “ações humanistas” como a Chacina do Carandiru e a vingança após o Salve Geral de 2006 foi “surpreendida” pelo local do confronto, o Ministério Público de São Paulo solicitou às organizadas de Palmeiras e São Paulo no ano passado a indicação de locais mais perigosos no caminho ao Pacaembu ou ao Morumbi. Um deles era a Av. Inajar de Souza. Ainda assim, um torcedor morreu após confrontos entre as torcidas.

Na terça-feira (27 de março), a edição paulista do diário Lance! afirma: “Muita gente sabia e ninguém fez nada para evitar, nem a polícia”. A capa traz também o editorial “Basta querer!”, reproduzido em outros estados. Quando todos sabem e as autoridades nada fazem, são no mínimo cúmplices por omissão.

Afinal, o que adianta proibir torcidas organizadas, camisas, tambores, bandeiras com mastros, balões,… de entrarem em campo? Enquanto a inércia judicial que varre o país nos mais diversos flancos imperar, nada muda. Quando os responsáveis por atos assim terão um julgamento e uma punição séria? Será que só quando os bandidos de colarinho branco também o tiverem, inclusive os que dirigem clubes e a Nação?

“POLÍCIA! PARA QUEM PRECISA”

Já tratamos aqui do quanto a polícia é preparada para tratar com os torcedores. Na maior parte dos casos, primeiro se bate para depois saber quem estava envolvido no caso.

Em Alagoas, um vídeo gravado antes de CSA X ASA, no último domingo (25/03), foi parar em sites de notícia.. Policiais mandavam ver os cassetetes em torcedores do CSA do lado oposto ao da principal organizada do clube. Detalhe: como as torcidas dos clubes são “parceiras”, não há problema algum nesse confronto – com exceção das emboscadas da torcida do CRB, rival de ambos, que pode ocorrer. Assim, a igualmente “bem apreciada” Polícia Militar alagoana baixou o sarrafo em um jogo onde não havia risco algum. E para quê? Para exercitar o sadismo da tropa rasa?

Esse não é um caso isolado. Quantas vezes não vemos imagens de câmeras encontrarem policiais baixando o cacete no meio de uma torcida, geralmente por conta de uma discussão mais áspera? Crianças, mulheres e senhores de idade não são diferenciados na hora da pancada. Foi o que ocorreu no Beira-Rio em 2005, num domingo imperdoável para a Brigada Militar (a PM do RS, nascida para auxiliar o Exército Caramuru na luta contra os Farrapos).

A história e a tragédia se repetem. Tudo isso para tratar do que ocorreu no Rio Grande do Sul na rodada do Gauchão do final de semana. No sábado, Caxias e Novo Hamburgo refizeram o confronto da final do primeiro turno. O resultado final foi vitória do Nóia por 1 a 0. Mas o que marcou o jogo foi a mordida que o cachorro (rottweiler) da BM deu no atacante Vanderlei, do Caxias.

Segundo o comandante da Brigada, a função do cachorro não é ser aproximado em meio a uma confusão – como foi o caso, reclamação com o auxiliar de arbitragem. Inclusive porque o animal tende a reagir quando vê algo de errado, uma bagunça, o que aconteceu.

Para piorar, no mesmo Estádio do Vale, no domingo, Grêmio e Cruzeiro-POA empatavam em 1 a 1 até os 49 minutos do segundo tempo. Vuaden, árbitro FIFA (vai entender o critério para essa indicação!), só marcou o toque da mão na bola do jogador cruzeirense por conta do auxiliar. Nova confusão, com muitas reclamações do futuro time de Cachoeirinha. A resposta do Choque da BM foi jogar spray de pimenta no rosto de um dos jogadores. O Cruzeiro que já fora prejudicado ao perder pontos na primeira fase, agora sofre a marcação de um pênalti existente, mas perde ao ter os descontos do jogo e ainda leva para casa a vergonha de ter um jogador profissional ferido pela Brigada com arma não letal.

Mais uma vez o descaso com o procedimento padrão. A regra é que isso só seja feito em caso de agressão, o que ainda não ocorrera. Ainda assim, com uma distância mínima de 1 metro. Jamais esvaziar o spray no rosto de uma só pessoa. Pelo menos dessa vez as emissoras grandes (no tamanho e não em sua grandeza) deram o caso e apertaram razoavelmente o capitão do BOE (operações especiais do RS) presente no estádio.

Também em Alagoas, um clássico entre CSA e CRB foi interrompido, pelo Alagoano de 2008, porque os policiais militares jogaram spray de pimenta em jogadores azulinos.

Se ainda o fizessem em uma sessão plenária da Assembléia Legislativa (mui nobre e ilibada por sinal), até seriam perdoados, mas em jogadores profissionais – que necessitam do corpo para trabalhar – aí é demais!

Para ambos os casos, a promessa da BM gaúcha é que o relatório seja apresentado num período de 20 a 30 dias. Um mês para relatar o que foi filmado e gravado por TVs de sinal aberto! Depois falam em eficiência, PGPQ e outras sanhas neoliberais. Quanta bobagem…

Vale salientar que, no geral, os militares estaduais não recebem nenhum extra por trabalharem para instituições privadas (clubes e federações), por mais que o Estatuto do Torcedor exija que os responsáveis pelo evento definam como será a segurança na partida. Assim, quem paga a conta da barbaridade é o arigó que paga imposto embutido em tudo e, ao levar o filho para a cancha no fim de semana, ainda se arrisca de levar paulada das forças da “ordem” ou ver-se no meio da confusão promovida por torcedores profissionais através de imbecilizados com roupa parecida.

ORGANIZAÇÃO

Também já falamos das torcidas organizadas antes, inclusive as elogiando quando foi pertinente – campanha “Fora Ricardo Teixeira” na rodada final do primeiro turno do Brasileirão do ano passado – e as olhamos para além do preconceito rotineiro, no caso da agressão com o jogador palmeirense João Vitor.

Não defendemos público de “orquestra” para jogos de futebol, que só aplaude quando é solicitado; porém, tampouco, nós, apaixonados por um clube de futebol, queremos ser afastados dos estádios por aqueles que colocam a organizada como prioridade, acima até mesmo dos times.

Um claro exemplo do potencial dessas torcidas está nos protestos ocorridos no Egito por mudanças políticas. Duas torcidas rivais se juntaram para participar das manifestações. Esse, inclusive, pode ter sido o motivo para a polícia egípcia ter permitido o massacre de Port Said, com a morte de dezenas de torcedores do Al Ahly – esta semana, torcedores do Masry protestaram contra a suspensão do clube por 2 anos e uma criança, de treze anos, teria morrido.

Futebol é jogado dentro de campo, discutido nas arquibancadas, ambientes de lazer e de trabalho – que os chefes não nos leiam! A zombaria, cornetagem ou “flauta”, como dizem aqui no Sul, também faz parte, com o limite que cada um dá e permite receber. Violência entre torcedores, não.

A pancadaria prometida antes da partida de futebol, inclusive, apaga todos os problemas de segurança que vivemos em várias partes do país – quer dizer, aqueles que não podem pagar por carro blindado ou segurança particular. Se a polícia não está preparada para casos “marcados”, como estará para o nosso dia a dia?

Como diz o slogan da Ultras Resistência Coral, torcida do cearense Ferroviário, a ideia defendida por estes colunistas é rápida e objetiva: “Nem guerra entre as torcidas, nem paz entre as classes”

 (Para quem quiser sugerir um nome que pudesse ser uma real alternativa para comandar o futebol no Brasil, ou achar que escrevemos muita besteira, entre em contato através dos e-mails [email protected] e [email protected])

QUEM ESCREVE:

Anderson Santos é jornalista e mestrando em comunicação social na Unisinos ([email protected]) & Bruno Lima Rocha ([email protected]) é editor do portal Estratégia & Análise (www.estrategiaeanalise.com.br).

Twitter da coluna: @alem_das4linhas

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