O consumidor e o mínimo existencial – por Vitor Hugo do Amaral Ferreira
A Lei nº 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor (CDC) – passa por sua primeira atualização significativa desde o início da sua vigência. Das diversas inovações que estão na pauta, em especial o comércio eletrônico e a prevenção/tratamento do consumidor superendividado, um novo feito ao contexto jurídico surge da nova redação proposta ao CDC.
Não raramente, o Poder Judiciário amontoa-se de processos, e muitos destes revestem sua causa de pedir à revisão de juros, questionamento de parcelas, financiamentos e empréstimos consignados. Eis a realidade que, por influencia da doutrina francesa, passou-se a denominar de superendividamento, ou seja (sobre)endividamento.
O tema a ser apresentado tem escopo no mínimo existencial para sobrevivência. Ainda que não se tenha uma definição legal, o anteprojeto de atualização CDC inova ao propor em dispositivo jurídico que se entende por superendividamento o comprometimento de mais de trinta por cento da renda líquida mensal do consumidor com o pagamento do conjunto de suas dívidas não profissionais, exigíveis e vincendas, excluído o financiamento para a aquisição de casa para a moradia, e desde que inexistentes bens livres e suficientes para liquidação do total do passivo.
O percentual também é mencionado na redação proposta no art. 54-D nos contratos em que o modo de pagamento da dívida envolva autorização prévia do consumidor para débito direto em conta bancária oriundo de outorga de crédito ou financiamento a soma das parcelas reservadas para pagamento de dívidas não poderá ser superior a 30% da sua remuneração mensal líquida, para preservar o mínimo existencial.
Apresenta-se então o que poderá ser a definição de mínimo existencial, ou seja, mesmo que a doutrina e a jurisprudência apontem para um entendimento, legalmente apenas a nova redação do CDC deixa claro que o comprometimento além de 30% da renda líquida do consumidor, irá permitir a revisão de contratos, pautando-se pela manutenção do mínimo existencial.
Vem aí a possibilidade do consumidor requerer em juízo processo de repactuação de dívidas, visando a realização de audiência conciliatória, com a presença de todos os credores, em que o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de cinco anos, preservado, então, o mínimo existencial.
Na tentativa de oportunizar o acordo, bem como o comparecimento do fornecedor-credor, propõe o legislador que o não comparecimento injustificado de qualquer credor à audiência de conciliação acarretará a suspensão da exigibilidade do débito e a interrupção dos encargos da mora. (neste certame confesso que fico curioso em saber se será aprovado)
Pois bem, em tempos que se anuncia o crescimento da Classe C, fico na dúvida: a qual preço? As investidas do Governo Federal em frear os juros e aumentar a compra de veículos, por exemplo, é contraditória. Hoje se alimenta o consumo para satisfazer o fornecedor-fabricante, amanhã serão necessárias políticas públicas que possam tratar o superendividamento e consequentemente restabelecer o equilíbrio econômico. Missão à frente!
Vitor Hugo do Amaral Ferreira
@vitorhugoaf
Complicado, complexo esse tema, mas bem escrito. Vamos estudar!!! Parabéns pelo texto.