Claudemir PereiraJornalismoSaúdeTrabalhoTragédia

TRAGÉDIA. É uma gente do cacete, esta que se põe a salvar vidas no Hospital de Caridade. Um baita orgulho!

Era qualquer coisa como 4 da tarde. Precisava chegar em casa, ver meu povo. Dei um beijo no Pedro e comi arroz e iscas de carne, preparados algumas horas antes pela Bianca. Meus garotos. Ela com 22, ele com 10. A Bi foi muitas vezes na Kiss. Mas não neste sábado. Nunca, mas nunca mesmo, uma comida tão simples, da cozinheira da casa, me fez tão bem.

Em seguida retornaria ao Hospital de Caridade, de onde voltei só agora há pouco. Minutos indispensáveis de silêncio, tentando pensar no que acontecera durante o dia, iniciado, pra mim, às 5 e pouca coisa da manhã, acordado pela Lis, nossa dedicadíssima assistente social, que não descansou um instante sequer, até perto das 9 da noite quando, sem dó nem piedade, foi mandada para casa. Deve estar dormindo agora. Feliz porque sua filha, que também gosta de uma festa, estava de plantão no Hospital Universitário.

Como falar de um dia como este? Lembrar aquele punhado de celulares colocado numa caixa grande de plástico, na secretaria do Pronto Socorro. E que, vez em quando, tocava, e as meninas olhavam, praticamente sem saber o que fazer – seriam pais, mães, namorados de gente que era atendida no hospital. Quem sabe de alguém que estava a morrer ou… Como saber?

Atender telefonemas em profusão, de colegas dos mais diversos cantos do Brasil e, creia, até do Paraguai – sem falar nas embaixadas australiana, britânica e japonesa – é parte da função do assessor de comunicação. Não me incomodava, embora não esconda certo desconforto com a insistência de produtores de programas sensacionalistas de São Paulo, que queriam porque queriam me por no ar, o que recusei. Aliás, norma seguida em relação a todos os veículos, como havia sido determinado (corretamente) por quem dirigia os trabalhos insanos de buscar salvar o maior número possível de garotos e garotos subtraídos de sua normalidade juvenil.

Afinal, não foi o primeiro dia da vida, nem mesmo o primeiro domingo, de um jornalista em que o trabalho ultrapassou com folga as 16 horas. E é aí que a coisa pega. Os profissionais da nossa área se emocionam, sim, e muito. Mas tentam (e invariavelmente conseguem) esconder, por conta da atividade. É o meu caso. Depois, a gente desaba – como aconteceu nos minutos anteriores à redação deste texto. Mas é depois. Na hora…

Hoje, porém, foi bem diferente. E  por uma nem tão singela razão. Sei que o dito a seguir se reproduziu em outros locais. Sei. Mas falo do que vi. E do que me tocou. E me deixou feliz por estar ali, naquele momento, fazendo o que melhor sei fazer: jornalismo. Estava entre gente que é, simplesmente, demais. Sim, os meus colegas do Hospital de Caridade Dr. Astrogildo de Azevedo.

Se, há uma década apenas, me dissessem que eu trabalharia numa instituição deste tipo, seria alvo de uma baita risada. Agora, oito anos e tanto junto com aquele povo, digo:  não só trabalho, como gosto. E muito. Se havia dúvida, se dissipou neste domingo.

Deu orgulho ver aqueles 200 médicos (quase todos sem precisar estar lá, mas precisando, se dedicando e não esmorecendo). Deu orgulho ver aquela equipe de centenas de enfermeiros, técnicos, auxiliares, porteiros, escriturários, dirigentes, voluntários, e até uma aposentada que apareceu sem pedir licença e se pôs a trabalhar. Todos sem um único instante de hesitação. Gente que estendeu o horário. Gente que antecipou. Gente que apareceu, simplesmente. E se integrou, sem que fosse preciso dizer coisa alguma.

Não sei quantas vidas foram salvas – alô, colegas  jornalistas, não estava mentindo quando dizia ser impossível dizer quantos estavam internados ou haviam morrido – mas de uma coisa tenho certeza. Não seriam tantas, se dedicação e amor ao próximo, combinadas com uma dose extrema de profissionalismo, não presidissem o trabalho daquela gente.

Deu orgulho, um baaaaita orgulho, fazer parte daquele time. Ah, deu. Foi um dia e tanto. E outros virão. Mas esse povo que trabalha do Hospital de Caridade é do cacete – pra usar uma linguagem dos jovens que se divertiam e foram traídos pelo destino numa madrugada domingueira.

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3 Comentários

  1. “Um dos impulsos naturais surgidos logo após uma tragédia dessas, a maior da história gaúcha, é a do justiçamento moral dos proprietários de uma boate que só tinha uma saída física e das autoridades responsáveis por licenciar para o funcionamento aquele local fatídico.” Trecho da cronica de Paulo Santana, Zero Hora 28/01/2013 Leiam.

  2. No Corpo de Bombeiros,sei que não existem técnicos(engenheiros e/ou arquitetos) para analisarem o P.P.C.I .Mas a Prefeitura que dispõe de um exelente quadro, como que emite Alvara de funcionamento, a um estabelecimento,(Boate Noturna)sem saidas de emergencia?? Qual foi a data, da ultima vistoria feita pela por este orgão??

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