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Mil e uma noites com Bob – por Bianca Zasso

Nosso país entrou há pouco tempo em uma discussão que, pelo olhar desta humilde colunista, não vai levar a arte a lugar nenhum. A questão das biografias levantada pelo coletivo Procure Saber, composto por artistas como Gilberto Gil, Caetano Veloso e Chico Buarque, que resolveu colocar uma enorme placa de Pare para o mercado das biografias.

Segundo os integrantes do grupo, nada pode ser publicado sem a prévia leitura e autorização do biografado. Caetano, que já berrou aos quatro ventos que é proibido proibir, agora está cheio de dedos caso alguém queira contar sua história nas páginas de um livro. Me perdoem, mas o nome disso é censura, um total desrespeito ao trabalho dos biógrafos que dedicam anos de suas vidas para registrar as aventuras de outras vidas. Os grandes nomes da música brasileira parecem estar caducando, ao contrário de um senhor de voz fanhosa que já se deixou retratar nas suas múltiplas e encantadoras faces.

Não estou lá, filme dirigido por Todd Haynes, é uma cinebiografia e também não é. É musical e também não é. Complicado? Quando se fala de Bob Dylan até a mais singela das ações ecoa complexidade. Ao contrário de outros exemplares do gênero, a produção de Haynes não se apegou a datas ou ordem cronológica. Aliás, não se apegou nem a um único protagonista. Para retratar as várias fases da carreira e da vida de Dylan, foram escalados seis atores, incluindo a bela Cate Blanchet, numa das atuações mais intensas de sua carreira.

O objetivo do diretor não é transformar as dores e as conquistas de Bob Dylan numa historinha com final feliz, mas dissecar quem é o homem por trás de canções inebriantes como Blowin’  in the Wind e Don’t thint twice, it’s all right. Cada personagem é um pedaço do quebra-cabeça que, depois de montado, nos apresenta um dos maiores nomes da música e da poesia de todos os tempos. O amante abandonado, o astro, o judeu que se converteu ao catolicismo, o cavaleiro solitário, o garoto fã de Hank Williams.

Mil faces seria o clichê mais comum para definir o objeto de estudo de Não estou lá. Dylan está mais para uma Sherazade que inventa histórias sobre si mesmo e enfeita com pitadas de comédia e melodrama suas vivências reais. Um prato cheio para jornalistas e pesquisadores cheios de perguntas. Deixa que digam, que pensem, que falem. Dylan gosta dessa festa.

Que história vou deixar? Que tipo de lembrança vou provocar nas pessoas? Quem nunca se perguntou qual será o rastro que vai ficar na nossa estrada quando chegarmos ao fim da caminhada? Bob Dylan deixou pegadas dos mais variados formatos e tamanhos. Cada um segue o que achar melhor. Tenho certeza que ele não se preocupa em ser retratado como louco ou gênio. Ou os dois. Ou nada disso. A vida dos outros, ainda mais quando este outro é talentoso, nos interessa, não há como fugir. O importante é não esquecer de cuidar da própria história e dos próprios medos. Estes, biografia nenhuma é capaz de esconder ou curar.

Não estou lá (I’m not there)

Direção: Todd Haynes

Ano: 2007

Disponível em DVD

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