Adeus, 2013. E agora, 2014? – por Atílio Alencar
O ano de 2013 se despede com as tradicionais retrospectivas midiáticas – que ora legendam o passado recente como um período trágico, ora relativizam o tom de desgraça com as conquistas brasileiras no esporte – e 2014 vai acenando no horizonte, com nossos votos renovados de paz, saúde, prosperidade, justiça etecétera.
No primeiro caso, a fórmula é tão desgastada que não é necessário muito esforço para reproduzir mentalmente seu esquema: uma sucessão de imagens rápidas, num turbilhão de perspectivas alternando o foco entre a dor e a alegria, narradas por uma voz imponente mas ainda assim capaz de expressar comoção ou ternura, enquanto a trilha sonora sublinha as cenas de horror, superação e perplexidade.
Na versão impressa, substitua as tomadas aéreas por fotos espetaculosas e subtraia os efeitos sonoros, e está pronto. Quase perde o sentido começar um ano novo, do zero, sabendo que ele está fadado a ser contado de um jeito igualzinho ao anterior pela imprensa lá no próximo dezembro. Pra que, afinal, arriscar-se na imprevisibilidade dos 365 dias do calendário se, conforme nos dizem os periódicos, estamos girando em círculos?
Ironias à parte, 2013 teve momentos que constrangeram essa narrativa monótona, ao menos no tempo real dos acontecimentos. Talvez nunca, em anos recentes, a sensação de falta de controle por parte de governos, mídia e teóricos tenha ficado tão em evidência quanto em junho (e em seus desdobramentos), o mês que não coube na História. As ruas foram ocupadas por ondas tão contagiosas quanto irredutíveis aos discursos de quem jurava entender e, no grau máximo da prepotência instituída, até prever os possíveis desarranjos no sistema.
Nem a resposta protocolar dos governos, nem a diplomacia lacrimogênica da polícia, tampouco os métodos usuais da grande mídia para manchar a reputação dos protestos: as pessoas foram às ruas – e saíram delas – à revelia completa dos mecanismos de controle. Para 2014, ano de Copa do Mundo e eleições, não é preciso nenhum dom profético para imaginar que não faltarão motivos para um revival dos protestos.
Em Santa Maria, no calor de um ano que começou da pior forma imaginável, o luto foi gradativamente tornando-se luta, e milhares somaram indignação e revolta ao caldo da tristeza causada pelo desaparecimento de centenas de jovens numa ocasião que deveria ter sido apenas festiva. De novo, o inexplicável sob o ponto de vista dos especialistas: um prefeito recém-reeleito, com apoio da maioria esmagadora da população, viu sua popularidade se desmanchando no ar enquanto revelava-se o chefe arrogante de uma administração marcada por cisões até então insuspeitas.
Com a Câmara de Vereadores ocupada por centenas de manifestantes no meio do ano, a crise alastrou-se pelos gabinetes do Executivo e Legislativo locais, deixando claro que há algo de podre no reino da Boca do Monte: trocas de acusações, demissões, revelações sobre acordos obscuros nos bastidores, inaptidão para dialogar com a sociedade organizada e o ócio administrativo frente às demandas sociais foram apenas alguns dos episódios da atual novela política em cartaz na cidade.
Por isso tudo, e pelo modo como o ano vai chegando ao seu fim pela terra do vento norte, os meus votos são, claro, também aqueles lá de cima, no início do texto. Mas por conta de tudo que vivemos em 2103, e pela forma cínica como os vereadores municipais conduzem temas de interesse público nesse fim de ano – em meio à mais nova crise gerada por desentendimentos no tráfico descarado de influências na Câmara -, eu desejo mesmo é que a gente não volte mais à condição de meros espectadores do espetáculo de mau-gosto protagonizado pelas instituições que deveriam nos representar.
O ano novo só pode ser bom se encararmos as crises como fatores de mudança. Ou nos entregamos ao acaso e nos deixamos levar, ou levamos a conversa num tom de igualdade, nunca de submissão, entre povo e governantes.
Desejo uma feliz escolha para todos nós em 2014.
Muito bom o texto do amigo seco, ou para os mais íntimos, Atílio. Postei em meu perfil um texto que fala um pouco sobre o ano de 2013 e o “facebuqui”.