O discreto charme da diferença – por Bianca Zasso
Eu sobrevivi à adolescência. Ainda vou estampar esta frase em uma camiseta. Assim como eu, muitas pessoas não sentem a mínima saudade dessa peculiar fase da vida. Isso porque a adolescência tem as suas pedras independente de quem seja o seu caminhante. Quem é popular e cobiçado sofre para se manter no cargo. Fútil, mas traz tanto sofrimento quanto o vivido pelo excluído que precisa lidar com o bullying dos colegas.
O lado bom desse turbilhão de hormônios e mudanças é que é na adolescência que costumamos viver nossas histórias mais interessantes. De lembranças agridoces, elas podem se tornar grandes livros, como O apanhador no campo de centeio, de J.D. Salinger ou filmes tocantes e inteligentes, como é o caso de Juno.
O diretor Jason Reitman (filho de Ivan Reitman, diretor de Os Caça Fantasmas, que fez a alegria de muitos adolescentes nos anos 80) levou para as telas um roteiro diferente escrito por uma moça mais diferente ainda. Diablo Cody (pseudônimo de Brook Busey) era ex-stripper e gostava de escrever. Porém, ao invés de fazer como algumas colegas de profissão, que relataram suas experiências no mundo do sexo por dinheiro, a garota resolveu escrever um roteiro que não tem sequer uma pitada de erotismo.
A protagonista que dá nome ao filme é uma menina de 16 anos que descobre estar grávida do melhor amigo e decide dar o bebê para a adoção. Até aí, a história é simples. O que diferencia o filme de Reitman de outras produções sobre o tema, como O jovem pai, da inglesa Éva Gárdos, é o tom. A gravidez de Juno é apenas uma ponte para diálogos bem-humorados, referências pops e obscuras e para o talento da atriz Ellen Page. A cada cena, não conseguimos definir onde começa Juno e onde termina Ellen.
Seus companheiros de cena, como J.K. Simmons e Michael Cera não deixam por menos e colaboram para contar a trajetória de uma menina que não sabe qual é o seu tipo nem se interessa em saber e que precisa lidar com um amor que cresce quase no mesmo ritmo que sua barriga. Afinal, Juno se apaixona como quase todos nós já nos apaixonamos na juventude. E o que poderia descambar para um romance piegas e juvenil se mostra uma paixão das boas, com direito a declarações como “ele é o queijo do meu macarrão”.
Algumas críticas da época do lançamento do filme apontavam que Juno era um filme surreal e que não existiam meninas como a personagem. A contraprova veio com a boa bilheteria e a centenas de comentários nas redes sociais onde a frase “Eu sou Juno” foi vista algumas centenas de vezes.
Reza a lenda que esse sucesso foi um dos responsáveis pelo filme ter entrado na lista de indicados ao Oscar de 2008. O resultado foi uma excêntrica e linda Diablo Cody voltando para casa com o prêmio de melhor roteiro original. Mais do que merecido. Naquele ano, sua criatividade salvou o público da mesmice e da onda de adaptações que invadiu o cinema americano.
Juno não é revolucionário, nem na estética, nem na linguagem, já que um ano antes uma outra produção de baixo orçamento, Pequena Miss Sunshine, também tinha conquistado as plateias com a história de uma família fora dos padrões. Mas vale uma ida até a locadora para descobrirmos que nem só de choradeira vive a adolescência e que maturidade não é questão de tamanho.
No fundo, o filme é um tapa na cara das pessoas que acham que, por serem mais velhas, merecem ter suas opiniões respeitadas acima de qualquer coisa. Meninas também podem tomar boas decisões sem deixarem de ser meninas. Juno tem uma família incomum e o abandono de sua mãe é citado apenas uma vez durante as quase duas horas de filme. É um detalhe. Ela não decide doar seu filho por motivos que só Freud explica, mas porque sabe que não dará conta de um bebê naquela altura da vida.
Mesmo com alguns momentos dispensáveis, como o que Juno tenta seduzir o futuro pai adotivo de seu rebento, o filme conquista até o mais duro na queda dos espectadores. Mesmo que a história não lhe diga muita coisa, preste atenção nas referências musicais, que incluem The Runaways e Iggy Pop, e também na pequena amostra de um filme do diretor Herschell Gordon Lewis. Quem é roqueiro e cinéfilo, no mínimo, se diverte.
Talvez o grande trunfo de Juno seja ser despretensioso. Em tempos onde diretores e roteiristas adoram rotular suas produções e buscar justificativas para toda e qualquer escolha, saber que uma garota com um pseudônimo escreveu um roteiro porque queria apenas contar uma história é um achado. Juno é uma personagem e tanto justamente por ser como muitas outras meninas por aí. Diferentes, porém não menos adolescentes.
Juno
Ano: 2007
Direção: Jason Reitman
Disponível em DVD
ATENÇÃO
1) Sua opinião é importante. Opine! Mas, atenção: respeite as opiniões dos outros, quaisquer que sejam.
2) Fique no tema proposto pelo post, e argumente em torno dele.
3) Ofensas são terminantemente proibidas. Inclusive em relação aos autores do texto comentado, o que inclui o editor.
4) Não se utilize de letras maiúsculas (CAIXA ALTA). No mundo virtual, isso é grito. E grito não é argumento. Nunca.
5) Não esqueça: você tem responsabilidade legal pelo que escrever. Mesmo anônimo (o que o editor aceita), seu IP é identificado. E, portanto, uma ordem JUDICIAL pode obrigar o editor a divulgá-lo. Assim, comentários considerados inadequados serão vetados.
OBSERVAÇÃO FINAL:
A CP & S Comunicações Ltda é a proprietária do site. É uma empresa privada. Não é, portanto, concessão pública e, assim, tem direito legal e absoluto para aceitar ou rejeitar comentários.