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Drama e ficção – por Márcio Grings

Alguém está se escondendo, buscando o anonimato e fugindo do sol. É muito fácil perceber esse fato. Típicas coisas que as pessoas fazem quando batem asas deliberadamente por aí. No início, essa sensação de liberdade infla o coração, mas… Em pouco tempo, somos tomados pelo vazio.

Como visitantes do espaço, é difícil encontrar um lugar nesse planeta estranho. Nada encaixa. Por isso precisamos nos misturar à multidão, e assim, muitas vezes passamos despercebidos. Eu, por exemplo, consigo enganar por um tempo, mas em um momento ou outro, a máscara cai. Não dá pra fingir o tempo todo. Eu estou esperando por um sinal, aqui no mesmo lugar de sempre, parado, em pé no lado mais ermo da estrada, antenas ligadas e mente conectada a tudo que vivi. Eu estou pegando algo, mas sinto que também ‘tô deixando alguma coisa importante passar, como um cachorro buscando um brinquedo esquecido que o dono atirou.

Quantos anos aquele troço ficaria esquecido no fundo do quintal? Em inúmeros episódios ao longo dos anos, eu simplesmente me esqueci de pequenas coisas que pareciam tão insignificantes. Negligenciei, e esses fragmentos de meu passado, agora parecem jurássicos esqueletos dentro do armário. A porta não fecha mais. De jeito nenhum.

Imagens dançando na memória, milhares de dentes-de-leão entrelaçados com a paisagem campestre. Logo depois, uma engrenagem tecnológica tritura todos os desenhos que flutuavam na minha mente. O campo florido nunca existiu. Enquanto eu sonhava, tudo parecia tão real. Fotos em preto e branco na galeria do meu cérebro, energia elétrica rateando, a brigada de combate às drogas está colocando algemas no beija-flor que pousou na minha janela. Ouvi o barulho do bico do bicho tocando a vidraça e fazendo téc. Os olhos do pássaro estavam vidrados. Pontinhos pretos balançando de um lado pro outro.

Um bocado de dor não derrete em segundos como um cubo de gelo no asfalto quente. Nem a pau. Há uma guerra explodindo dentro de mim, trepidações que fazem os quadros despencarem da parede. Procurando um novo emprego. Já nem sei mais o que raios eu estou fazendo nessa vida e se há necessidade de continuar insistindo.

Dá pra perceber que meu software não bate com o seu. De jeito maneira. Mesmo assim, por que será que continuamos insistindo nesse trampo? Incompatibilidade. Isso eu não posso negar, mas eu sei: você pode voar tão rápido que seu deslocamento de um lado até o outro é tão instantâneo quanto um piscar de olhos.

Coisa estranha isso. Porque eu estou jogado num quarto escuro, sem ninguém por perto. Anjo sem asas, proprietário de coisa alguma. Eu sou um drama, você um filme de ficção. Eu sou um blues acústico tocado por uma abelha perdida da colmeia, você é Jimi Hendrix com pedal wah wah gritando como um predador. Lá vou eu vestir o meu uniforme camuflado. Um franco atirador que se sensibiliza com sua vítima. Distraído aos extremos.

Fico pensando em mil coisas ao mesmo tempo. Por exemplo: o caminho que costumávamos andar, juntos, lado a lado, agora está tão diferente. Vejo tudo desmoronando como se uma bola de canhão estivesse atingindo uma parede de isopor. Um barco de papel que parecia tão perfeito, mas que se desmancha quando a chuva mostra todo seu vigor.

Inspirada em “Without Rings”, música de Neil Young.

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