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Refugiadas: a face silenciada das guerras

O drama das mulheres, normalmente esquecidas pelos estudos sobre conflitos

Em 2013, a escritora Svetlana Aleksiévitch, vencedora do Prêmio Nobel de Literatura em 2015, publicou o instigante “A guerra não tem rosto de mulher”. A partir do resgate da memória de mulheres que lutaram no Exército Vermelho durante a Segunda Guerra Mundial, o livro problematiza o porquê da história das guerras ser sempre contada através do olhar masculino. Os marcantes depoimentos das combatentes romperam o silenciamento das vozes femininas sobre seus dramas e seus desejos em um momento profundamente hostil de suas vidas.

Além das mulheres combatentes existe um outro grupo de mulheres silenciadas durante um conflito: as Refugiadas. Poucos são os estudos sobre elas. Menor ainda são os interesses sobre seus destinos, quando são traçadas as negociações de paz. Na maior parte do tempo, a política internacional é um espaço tão ou mais masculinizado do que as próprias políticas internas.

Em 2019, o Global trends Forced Displacement, relatório publicado pela Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) indicava que havia 20,4 milhões de pessoas refugiadas ou em condições similares no mundo. Dessas, 48% se identificam com o sexo feminino e 52% se identificam com o sexo masculino. A ACNUR alertava também para o fato de que refugiados e solicitantes de refúgio são frequentemente obrigados a fazer uso de contrabandistas e outras medidas de risco para atravessar fronteiras internacionais, fugindo de perseguições e conflitos. Em tais condições, estão sempre sujeitos à exploração, aos abusos e ao tráfico.

No que tange às mulheres refugiadas, além desses mesmos riscos, estão frequentemente expostas à violência sexual e de gênero. Em 2016, a Anistia Internacional ouviu um conjunto de refugiadas sírias e iraquianas, quase todas afirmaram que, quando de suas passagens por acampamentos ou assentamentos provisórios, foram coagidas a manterem relações sexuais em troca de comida, roupas e, principalmente, segurança. Muitas refugiadas recorriam ao trabalho sexual para cobrir suas necessidades básicas e de seus filhos.

Uma em cada cinco refugiadas é vítima de violência sexual no mundo. Normalmente, as violências contra as refugiadas são mais frequentes à medida que seu deslocamento se prolonga. Porém, muitas mulheres relatam que os primeiros dias após a saída de seu país são os mais difíceis, sobretudo para aquelas que estão desacompanhadas, grávidas ou são idosas.

Por tudo isso é um absurdo ver “beleza” na condição de refúgio. Mais absurdo ainda é fazer declarações machistas, misóginas e sexistas observando uma fila de refugiadas, como fez o deputado Arthur do Val. É cruel, é desumano, é indigno! Por mais que seja coerente com um parlamentar e um grupo político acostumado a atacar minorias e pessoas em condições de vulnerabilidade, as refugiadas ucranianas não merecem esse olhar. As refugiadas do mundo todo não merecem esse olhar. A estupidez não está acima dos dramas humanos.

(*) Leonardo da Rocha Botega, que escreve no site às quintas-feiras, é formado em História e mestre em Integração Latino-Americana pela UFSM, Doutor em História pela UFRGS e Professor do Colégio Politécnico da UFSM. É também autor do livro “Quando a independência faz a união: Brasil, Argentina e a Questão Cubana (1959-1964).

Nota do Editor. A imagem (sem autoria determinada, mas distribuída pela Agência Brasil) é de ucranianas fugindo de seu país e da guerra. Foi reproduzida do site do jornal A Crítica, de Campo Grande (MS) (AQUI)

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Um Comentário

  1. MBL, de longe, sempre pareceu um amontoado de picaretas arrogantes. Dois adjetivos que juntos aumentam a possibilidade da casa cair. No mais, existem ‘refugiados’ e refugiados. La por 2015 a Polonia era muito pobre para recebe-los. Gente da Siria e do Iraque. Numero agora é perto de 100 mil ucranianos(as) recebidos por dia. Caso é um pouco mais complicado nos campos. Agentes realizam casamentos por procuração e transferem as meninas para outros paises. Depois de um tempo algumas são ‘repudiadas’ e voltam para os campos, não raramente gravidas. Nos EUA se um cafetão atravessa uma fronteira estadual e é preso toma 20 anos sem guspe. Daí o problema de semantica, os ‘direitos humanos’ liquidam com os verdadeiros predadores e o que prolifera são os necrofagos da desgraça alheia.

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