DAY-AFTER. Maciel, cassado, sai metralhando. Ao jornal A Razão, diz que foi ‘abandonado’ pelo PMDB
Por FABRÍCIO MINUSSI, na versão online do jornal A Razão
Um dia após ter o mandato de vereador cassado pela maioria dos vereadores, João Carlos Maciel (PMDB), disse que foi abandonado pela sigla, fez críticas à postura da bancada governista da Câmara que teria sido engolida pela oposição e afirmou que dentro do partido do prefeito Cezar Schirmer “existem bactérias que contaminam, desarticulam, desmembram e destroem a própria vida do PMDB”.
Em entrevista exclusiva para A Razão, na sexta-feira, o peemedebista campeão de votos falou sobre a sua cassação, o projeto social e anunciou o fim da sua carreira política marcada por três eleições consecutivas ao Legislativo Municipal.
Maciel foi condenado pela maioria dos vereadores durante sessão realizada na última sexta-feira, em duas acusações por suposta quebra de decoro parlamentar – ter utilizado, em 2009, servidores da Câmara para fins particulares e de ter exigido parte dos salários de funcionários, quando era presidente do Legislativo.
Na sexta-feira, antes da entrevista concedida com exclusividade para A Razão, Maciel esteve na Câmara acompanhando o trabalho de desocupação da sala que passará a ser ocupada pelo também peemedebista Isaias Romero. Ele falou sobre a relação com os demais colegas de bancada e de oposição, sobre o trabalho de liderança de governo na Câmara e o projeto social que realiza há 40 anos.
Mesmo tendo anunciado o fim da carreira política, o advogado de Maciel, Gustavo Moreira, estuda ingressar na Justiça com recurso para tentar reaver o mandato do ex-vereador e radialista, pois entende que Maciel não poderia perder o cargo por fatos supostamente ocorridos em 2009 e já averiguados pela legislatura passada.
O peemedista não economizou críticas “a figuras do primeiro escalão do Executivo” que, segundo ele, comemoram a sua saída da Câmara e diz ter sido abandonado em seu mandato parlamentar. Confira, no quadro, a entrevista concedida pelo ex-vereador João Carlos Maciel.
ENTREVISTA
MACIEL: “DENTRO DO PMDB EXISTEM BACTÉRIAS QUE CONTAMINAM”
A Razão: Após a cassação do mandato como o senhor está reorganizando a tua vida?
Maciel: Minha vida sempre foi organizada. Tinha duas atividades, que se confundiam muito, pois o radialista é um grande prestador de serviços. Às vezes, muito mais que um vereador. Agora, minha primeira missão continua sendo cumprida à risca. Vim para servir e faço isso há 40 anos. Só não entende quem não quer.
A Razão: Quem não te entendeu?
Maciel: Algumas autoridades, que é óbvio não têm obrigação de me entender, pois não convivem com a gente 24 horas por dia. Alguns politiqueiros, oportunistas que, certamente… Enfim!
A Razão: Em algum momento tinha a convicção de que o senhor poderia escapar da cassação por quebra de decoro?
Maciel: Sim. Antes mesmo do início da sessão na quinta-feira. Esperava que alguns deles (vereadores) que conviviam mais intimamente com a minha carreira profissional, alguns dos quais chegaram a participar do meu projeto social pudessem ter um entendimento diferenciado. Em segundo lugar, continuo afirmando o mal que não cometi, pois toda a minha assessoria continua a mesma. Aliás, nunca barganhei cargos. Tinha três nomeados por minha conta no Executivo, um saiu e não fiz questão de recolocar outra pessoa. Ai valeu para a Justiça o depoimento de duas pessoas que eram cargos da Mesa Diretora, sob minha responsabilidade, mas que não entendo até hoje como esses depoimentos se sobrepõem com os nove que trabalharam comigo.
A Razão: De quem o senhor esperava mais respaldo na votação de quinta-feira, do PT ou do teu partido, o PMDB?
Maciel: Claro que esperava mais apoio da bancada do PMDB, cujo presidente ajudei a eleger. Foi um golpe que atingiu de forma destruidora e que ainda terá repercussão, inclusive, para o próprio PMDB.
A Razão: Que tipo de repercussão?
Maciel: A pergunta é curta, mas ampla. O PMDB matou a oportunidade de fortalecer a sigla. Havia uma vontade do próprio povo da nossa atuação ir mais além. Essa caminhada seria muito difícil sem apoio do partido o qual represento. O maior constrangimento que passei na minha legislatura foi ter sido colocado líder de governo Cezar Schirmer, que além de correligionário é amigo particular. Não tive o respaldo que um líder do governo deveria ter.
A Razão: Mas há quem diga que o Maciel como líder de governo era mais oposição que a própria oposição?
Maciel: Era verdade. Pois era meu dever e questão de honra dar as boas notícias de parte do Executivo, mas também cobrar respostas que não vinham e que a sociedade cobra até hoje.
A Razão: A atual legislatura tem sido marcada por problemas envolvendo o PMDB na Câmara e seus vereadores. Qual a leitura que o senhor faz desse quadro?
Maciel: A Boate Kiss foi uma tragédia que deixou a cidade em estado de choque. A perda de uma pessoa que era uma líder, a Maria de Lourdes Castro… Ela seria muito mais que uma vereadora. O Claudio Rosa, um grande combatente, um político eloquente… Cassado por denúncias que, pelo que sei, partiram de dentro do próprio governo. Esse conjunto de situações forma um cenário que se contaminou ao longo do tempo e culminou com a minha cassação. Esse contexto nos remete a algo muito estranho.
A Razão: E a tua relação com o Schirmer, hoje, como ela está? Faltou apoio do prefeito no processo da tua cassação?
Maciel: Ele não teria como ajudar, pois a própria bancada governista composta por ele mesmo nunca foi, em toda a extensão do mandato, coesa. Haja a vista a última eleição da Mesa Diretora da Câmara em que o próprio PMDB ficou de fora. A maioria dos vereadores é da bancada governista e foi engolida por oito parlamentares de oposição.
A Razão: O senhor alertou o prefeito em algum momento sobre essa questão envolvendo a coesão da bancada governista no Legislativo?
Maciel: Inúmeras vezes senti o desacordo ou o não alinhamento de pensamentos pelo fato do Executivo ter dado as costas para a bancada do próprio governo.
A Razão: O senhor se sentiu traído em algum momento?
Maciel: Não tenho esse sentimento, não consigo ter essa leitura.
A Razão: Mas o senhor disse que esperava apoio, na votação de quinta-feira, por exemplo, da bancada do PT, citando como exemplos a campanha feita para o deputado federal Paulo Pimenta e a articulação para a aprovação das contas do deputado estadual Valdeci Oliveira?
Maciel: Se nem todo o irmão abraça o próprio irmão, como esperar algum retorno do PT? Talvez o que fiz por eles não teve valor algum.
A Razão: O senhor pretende se desfiliar do PMDB?
Maciel: É um caso muito sério. Tenho que avaliar se a sigla merece contar ainda com o meu nome. Dentro do PMDB tem bactérias que contaminam, desarticulam, desmembram e destroem a própria vida do partido.
A Razão: Quem são as bactérias?
Maciel: Não adiante nominar, mas é do primeiro ao último escalão, mais do primeiro, de gabinetes de secretários. Um deles chegou a abrir uma champagne quando fui preso injustamente, num processo o qual nada tenho a ver, já dito pelo próprio delegado da Polícia Federal. Mas a Vigilância Sanitária da Prefeitura de Santa Maria foi quem deu o primeiro parecer para que a Polícia Federal levasse as doações de todos os medicamentos encontrados na sede do meu projeto social, o que causou tristeza e comoção na opinião pública.
A Razão: Mas o senhor, com 40 anos de rádio e trabalho social, não sabia que não podia trabalhar com a distribuição de medicamentos? Não é muita ingenuidade da sua parte?
Maciel: Não é ingenuidade. Fiz esse trabalho ao longo de 40 anos, criando uma linha social que era uma verdadeira central de doações de remédios doados todos por ouvintes, médicos, clínicas e diversos colaboradores. Trabalho feito esse explicitamente no ar e nunca fui advertido sequer por um órgão. Ou será que não conseguiria uma farmacêutica voluntária para regularizar esses procedimentos? Recebi duas indicações da ONU pelo meu trabalho social.
A Razão: Qual a repercussão que o senhor espera ter com essas declarações, que são muito fortes?
Maciel: Estou expondo um sentimento que é um desabafo. Não penso em repercussão.
A Razão: E a sua relação com Schirmer?
Maciel: A de amigo continua. Ele foi na vida pessoal um parceiro muito grande. Meu fiador da sede, em empréstimo bancário. Sempre me ajudou em muitas questões pessoais.
A Razão: O senhor está inelegível por oito anos. Pretende retornar à vida pública?
Maciel: Não. Só queria encerrar o mau mandato de forma digna, pelos méritos da minha votação. Se eu fosse a Dilma, estaria lá hoje ainda, mas sou pítoco.
A Razão: Como assim, se fosse a Dilma?
Maciel: Comparando hoje o que levou à cassação de Collor de Mello, os supostos delitos, em comparação ao que está acontecendo nos últimos dez anos é uma gota d´água no oceano. E mesmo assim ela está firma no poder.
A Razão: E a família?
Maciel: Sofreu. Mas ao mesmo tempo eles sabem que eu tirava da minha mesa.
A Razão: Depois disso tudo, muda alguma coisa no teu projeto social?
Maciel: Essa é a minha paixão e missão. Aprendi a praticar a solidariedade desde pequeno, quando sofri na carne uma infância pobre a qual com seis anos via TV por uma janela de um vizinho. Infância esta em que sonhava ganhar uma bicicleta e meu pai sempre dizia que não poderia me dar. Até o momento em que eu refleti sobre ações em que eu vi meu pai adotivo praticar. As cenas como a que eu vi em Porto Alegre, quando meu pai tirou o casaco e pediu que eu tirasse os pertences do casaco e segurasse a maleta dele. Quando descemos do ônibus, ele colocou o casaco nos ombros de um velhinho. Era um inverno rigoroso. Depois que eu fui entender esse gesto, quando ele me mandou na Rádio Gaúcha, no programa do Dilamar Machado, para entregar um bilhete. Nele, estava a doação de um puxado para uma família que havia perdido tudo em um incêndio. Isso me marcou. E levo isso para dentro do meu projeto social que tem 99 ações, desde doação de livros para formar bibliotecas nas escolas, roupas e calçados às famílias pobres, Caravana da Missa da Saúde, volta às aulas e o Natal do Amor Maior, que é nesse domingo, no CDM a partir das 14h. Serão 7.5 mil crianças sendo presenteadas e recebendo o braço das madrinhas e do papai Noel.”
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