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ESPORTE. Arnaldo Recchia, de SM a Phoenix, EUA, a trajetória do comunicador e atleta de Taekwondo

Ele: “quando botava aquela roupa de super herói do esporte, me transformava”

Comunicador/atleta santa-mariense Arnaldo Recchia (Foto Facebook/Reprodução)

Por Pedro Pereira

No universo das histórias em quadrinhos, cidadãos comuns como Bruce Wayne e Clark Kent vivem civilizadamente sob as alcunhas dos super heróis Batman e Superman. Fora do mundo imaginário, um exemplo desta “vida dupla” pode ser refletida na realidade de Arnaldo Recchia, que “veste a capa” de duas áreas extremamente distintas: o taekwondo e a comunicação social.

Diante disso, conheça a história do jornalista e taekwondista, natural de Santa Maria. Das pequenas academias do Coração do Rio Grande aos grandes palcos da arte marcial sul-coreana – passando, nesse meio tempo, por diferentes veículos de comunicação -, o atleta será um dos representantes do Brasil no Campeonato Mundial de Taekwondo de 2023.

A origem

Embora a sua primeira experiência com artes marciais tenha sido em 1992, com o karatê e um kimono confeccionado pela avó, foi a partir de 2003 que o taekwondo realmente passou a fazer parte da vida do comunicador. Nesta época, o “rolê da galera”, como diz Recchia, era o seguinte: ir para uma loja de videogames local para jogar o consolidado jogo de luta “The King of Fighters”, beber coca-cola, comer um xis e alugar um Playstation 1.

Certo dia, em outubro daquele ano, um dos funcionários desta loja comentou sobre a existência de uma pequena academia de artes marciais no centro de Santa Maria, após ver o taekwondista e seus amigos se divertindo com o jogo de luta. Recchia e sua turma, então, resolveram ver uma das aulas para entender como funcionava o local.

“Assisti à aula e me apaixonei na hora. ‘Morri’ no treino, me deu dor em tudo, mas achei massa”, relembrou o jornalista. Entretanto, o valor da mensalidade para continuar praticando era “impagável”, em suas palavras, e Recchia precisou achar outra maneira de seguir naquela academia.

Um mês depois, aconteceria a Feisma – principal feira comercial, industrial e de serviços de Santa Maria -, e surgiria a oportunidade de divulgar a modalidade e a academia no evento, em troca da mensalidade. Abusou de seu carisma e sua “cara de pau”, que tinha somente quando vestia um dobok (uniforme do taekwondo), e alcançou seu objetivo. “Eu não articulava as palavras. Sabe aqueles adolescentes que não sabem se comunicar? Eu era desse. Em casa, eu não sabia falar. Mas, quando eu botava aquela roupa de super herói do taekwondo, eu me transformava. Falava ‘para fora’ e, até, adotava uma postura diferente. Isso ainda faixa branca”, destacou saudosamente o atleta sobre a importância que seria poder seguir praticando.

Depois desta aventura, mais oportunidades surgiram. O professor daquela academia, André Navarro, seguiu dando chances para que o santa-mariense conseguisse praticar. “Ele disse ‘vem mais mais cedo. Tua aula é às sete? Vem às seis, me ajuda com as crianças dessa turma, treina às sete, me ajuda a limpar a academia e tua mensalidade está paga’, aí eu fazia isso. Não durou muito, eu ia às cinco, ficava às seis, treinava às sete e oito e, depois, ficava até às dez limpando a academia”, revelou o taekwondista. Ainda, o santa-mariense conta que, neste mesmo período, estudava para o vestibular e faltava aos treinos para se dedicar à arte marcial.

Arnaldo Recchia, hoje residindo em Florianópolis, jornalista santa-mariense em ação, anos atrás, na TV Santa Maria (Foto Arquivo Pessoal)

Voos maiores e o início na comunicação

Uma vez que sua evolução e seu desejo por se desenvolver no taekwondo era visível, Navarro ofereceu-lhe o programa de formação de instrutores. Em 2005, aos quase 20 anos de idade, Recchia decidiu procurar desafios maiores e mandou um e-mail para o órgão responsável pela arte marcial sul-coreana na América do Sul afirmando que queria ser professor, embora não fosse nem faixa preta, e acabou sendo convidado para trabalhar em Miami, nos Estados Unidos.

Entretanto, foi desencorajado pelo seu mestre. “Meu professor falou assim: ‘cara, acho que você vai quebrar a cara’. Vai para uma cidade maior aqui no Brasil, para você ter mais noção, e depois você vê o que quer fazer. Então, fui para Curitiba morar, treinar e dar aulas. Saí de lá faixa preta e professor”, disse Recchia, de maneira nostálgica.

Apesar desta fase ter sido boa, uma vez que, além de ter chegado à faixa preta, treinou com a seleção brasileira da modalidade, a intensa pressão familiar e “aquela coisa do santa-mariense de ser muito apegado a sua terra”, como afirma Recchia, o fizeram retornar à cidade natal. “A frase da minha mãe foi muito clara: ‘você acha que vai viver a vida sendo professorzinho? Não vai dar certo, você deve procurar outra carreira”.

Enquanto havia aberto uma academia de taekwondo em Camobi – ou seja, seguia tendo conexões com o universo da modalidade -, passou no vestibular da então Unifra (hoje Universidade Franciscana – UFN) para jornalismo. Mas, por ser membro de uma família humilde, não conseguiria pagar a mensalidade.

Recchia afirma que o professor Carlos Alberto Badke, da UFN, deixou-o fascinado pela profissão ao mostrar que “tem algo que o jornalismo proporciona, que é uma certa arrogância. ‘Meu trabalho é estudar e saber sobre as coisas, eu sou o cara que pode falar e saber sobre tudo. Eu sou tudologista”. Após um semestre, de qualquer forma, abandonou a faculdade por problemas financeiros.

Começou a trabalhar no Diário de Santa Maria como vendedor de assinaturas porta a porta, indo de casa em casa para divulgar o jornal impresso. “Conheci Santa Maria de um jeito que poucas pessoas conhecem. Eu conheço cada rua, cada vila, cada beco, porque eu ia, literalmente, na porta das pessoas, e falava ‘você quer um mês de Diário grátis?’ Aprendi a falar com pessoas estranhas, comecei a me relacionar com elas como se fosse repórter e voltava (para a sede) com um monte de assinaturas”, contou o taekwondista.

Com o incentivo de seus colegas de trabalho, decidiu fazer um curso de radialismo e logo iniciou na extinta Rádio Guarathan, em Santa Maria. Passou por todas as etapas da rádio até que, quando percebeu, estava substituindo o apresentador principal em suas férias. Entretanto, jamais deixou a prática da arte marcial de lado. “Eu terminava o programa e ia treinar. Seguia aquela coisa: comunicação e taekwondo”, afirmou Recchia.

Em 2007, ingressou na UFSM e, a partir daí, deslanchou na área da comunicação. Passou por emissoras como TV Campus, TV Santa Maria e Rádio Atlântida, como também pelo jornal A Razão. Neste período, parou com o taekwondo, pois “estava bem complicado sair do terno e gravata para o dobok”, segundo o atleta.

O refúgio para Santa Catarina e o retorno ao taekwondo

O atleta (em ação) será um dos representantes do Brasil no Mundial de Taekwondo de 2023, em Phoenix, nos Estados Unidos (Foto Arquivo Pessoal)

Devido a tragédia da Boate Kiss, que aconteceu em 2013, o jornalista já formado se mudou para Chapecó para trabalhar na Rádio Atlântida da cidade, com o objetivo de “fugir” dos desastres e focar na área da música. Lá, sua vontade de retomar a carreira no taekwondo surgiu quando descobriu que não havia academias da arte marcial na região.

Naquele ano, voltou a praticar a modalidade e, uma semana antes do ano novo, passou a morar em Porto Alegre para fazer parte da equipe de cobertura da Copa do Mundo de 2014 da Rádio Gaúcha. A rotina, em compensação, era a mesma: saia do trabalho e ia para uma academia treinar.

Contudo, para Recchia, embora fosse um desejo de muito tempo chegar naquele patamar, não estava compensando. “Trabalhar na Gaúcha era emocionante, a realização de um sonho. Só que, financeiramente, era algo extremamente efêmero. Desolador. E eu via que o pessoal do taekwondo não era assim”, expôs o santa-mariense.

Determinou, então, que voltaria a trabalhar com a arte marcial e, ao fim da Copa do Mundo, abriu uma academia em Chapecó. Na cidade catarinense, recebeu um convite para coordenador uma nova rádio local e, rapidamente, voltou a se envolver suas duas paixões: comunicação e taekwondo – durante três anos.

A consolidação na arte marcial

Nesse meio tempo, disputou seu primeiro campeonato Pan-Americano e assumiu algumas outras escolas da modalidade pelo sul do Brasil. Até a paralisação das atividades do taekwondo no país em 2020, em função da pandemia de Covid-19, participou de outros torneios e teve resultados variados.

Na temporada de retorno, em 2022, chegou ao vice-campeonato no Pan-Americano e se classificou para o Mundial de 2023. Recchia declara que, em relação a suas metas, já se sente realizado. “Meu grande sonho é estar lá. A maior medalha de todas é ter chegado lá. Acho muito pouco provável um título mundial. Estamos em um mundo muito diferente. O americano vê o esporte de outra forma. A gente não tem incentivo, nem patrocínio, é a gente pela gente”, assegurou o atleta.

Porém, revela que nem chegar na segunda colocação do pan-americano estava em seus planos, inclusive, planejando se aposentar após a competição – mas não acredita mais nessa ideia, uma vez que, no taekwondo, não há uma limitação etária para competir.

Uma família taekwondista

Arnaldo Recchia e sua família de taekwondistas, Andressa e Agnes (Foto Arquivo Pessoal)

Jornalista e atleta de taekwondo como seu marido, Andressa Recchia conheceu seu parceiro em meio à loucura das coberturas jornalísticas de Santa Maria e seguiu seus passos na prática da arte marcial. Após ouvir do comunicador, fardado de seu dobok, se ela estava “preparada para vê-lo assim pelos próximos trinta anos”, viu a paixão do santa-mariense pelo esporte e, então, resolveu assistir a uma aula da modalidade.

Treino a treino, Andressa foi desenvolvendo o interesse pela categoria e aumentando a intensidade de suas práticas. Em um pan-americano realizado no Chile, e disputado por Recchia, teve a oportunidade de participar de um “torneio aberto”, com taekwondistas de diferentes faixas, e se apaixonou definitivamente pela arte marcial.

Seguiu competindo no Estado de Santa Catarina, treinando e disputando torneios – até mesmo grávida -, e, em 2018, conseguiu sua faixa preta. Agnes, filha do casal, também é uma taekwondista – porém, visto que, segundo o jornalista, a pequena passava os dias na academia, o resultado não poderia ser diferente.

“Ela aprendeu a caminhar em cima do tatame”, relembrou o pai. Por estarem isolados de suas famílias fora de Santa Maria, na época, era necessário levar Agnes às práticas de taekwondo. Com o tempo, ela foi crescendo, se familiarizando cada vez mais com o ambiente taekwondista e participando de competições infantis. Em 2022, inclusive, participou de seus primeiros torneios. Agora, assim como Recchia, tanto a mãe quanto a filha disputam campeonatos da modalidade.

Atualmente, Arnaldo vive em Florianópolis e continua “vestindo duas capas de super herói”: dá aulas e possui quatro escolas de taekwondo divididas em Santa Maria e Chapecó, e é sócio de duas em Floripa. Ainda, presta serviços de comunicação para redes de academias de taekwondo, para se manter na área. Até o momento, não foram anunciadas as datas que será realizado o Campeonato Mundial de Taekwondo do próximo ano. Entretanto, a sede será em Phoenix, Arizona, nos Estados Unidos.

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Um Comentário

  1. Que bela história de superação, força de vontade , determinação e amor pelo esporte. Parabens Arnaldo, um grande abraço. Abraço também a Andressa que abraçou está paixão e fez dela um elo de ligação da família.

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