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Esquerdismos – por Luciano Ribas

Quando disse que a inimiga da verdade não é a mentira mas a convicção, Nietzsche “decifrou” boa parte desse mundo complexo e angustiante em que vivemos. Da esquerda à direita, do futebol à religião, sobram convicções e falta disposição e radicalidade para compreender (ou tentar) a complexidade contemporânea e as causas das muitas angústias. Os resultados disso todos conhecemos: de uma forma geral, as pessoas não ouvem umas as outras e, se ouvem, não se entendem.

Na filosofia, o sentido das palavras é estudado pela hermenêutica, como uma teoria geral da compreensão. Entendo pouco do assunto, mas me arrisco a dizer que um pouquinho de hermenêutica nos ajudaria muito por esses dias. Muitos conflitos seriam evitados e muita gente deixaria de pagar alguns “micos” – como uma estudante de jornalismo que me disse, certa vez, que estava revoltada com o Beto São Pedro, então vereador, pois ele queria “tombar a Vila Belga” e que seria “um absurdo alguém querer derrubar algo tão bonito”.

A Vila Belga continua em pé, mas as pessoas cada vez mais dão às palavras o sentido que bem entendem. Por exemplo, Lênin jamais imaginou quando escreveu “Esquerdismo: Doença Infantil do Comunismo” que “esquerdista” viraria, nessa guerra de bugios das redes sociais, sinônimo de “pensamento de esquerda”. Para o líder russo, o “esquerdista” presta inúmeros desserviços à esquerda, por representar uma caricatura do pensamento marxista e revolucionário, oscilando entre a ingenuidade espontaneísta e a recusa ao estudo e à reflexão política.

O problema é que muita gente, a maioria talvez de forma bem intencionada, acaba por se comportar de uma maneira “esquerdista”, o que normalmente resulta em sectarismo e no consequente afastamento de outras pessoas também bem intencionadas. O “esquerdista”, portanto, tende ao fundamentalismo e este é a ruína de qualquer movimento.

Muitas causas possuem algum nível de rejeição, em parte, por causa do esquerdismo bobo e das manipulações e preconceitos que ele ajuda a fazer prosperar. O feminismo talvez seja um dos movimentos que mais sofre com isso, quando é situado como o outro do machismo e não como a afirmação da igualdade de direitos e do respeito às diferenças entre os gêneros.

Porém, a responsabilidade por quebrar os preconceitos não está, fundamentalmente, naqueles que se aproveitam deles, especialmente a grande mídia e os movimentos e partidos de direita. A maior parcela dela está em quem defende uma ideia, endurecendo sem perder a ternura jamais. Ou seja, tendo coerência e firmeza, mas buscando o convencimento pelos argumentos e a interlocução com todas as pessoas que possuam algum nível de abertura a eles. Essa é a essência de um pensamento democrático de esquerda.

O 8 de março expôs muito do que existe de mais generoso e de mais desprezível em homens e mulheres. Por isso e por sua importância, os motivos e os símbolos que fazem do Dia Internacional da Mulher uma data tão importante precisam ser defendidos e afirmados, sem ceder a exploração comercial crescente, mas também sem hostilizar os gestos de carinho que motiva.

Não há contradição entre direitos e flores ou entre lutas e amores quando todos convergem para a elevação da humanidade. É o que modestamente penso e essa é uma das causas da minha vida.

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