KISS. “Não se supera a morte de um filho”, afirma a Luiz Roese a autora de “Todo dia a mesma noite”
Por LUIZ ROESE, Colunista do Site, com montagem sobre fotos Reprodução
A jornalista Daniela Arbex é que abrirá a programação dos eventos em Santa Maria, relacionados aos cinco anos da tragédia da Boate Kiss. Ela vem à cidade para lançar o livro “Todo Dia a Mesma Noite”, que relembra e homenageia os 242 mortos no incêndio de 27 de janeiro de 2013, no centro de Santa Maria.
Daniela participa de um evento nesta quinta-feira (25), às 19h30, no Theatro Treze de Maio (Praça Saldanha Marinho). Será uma conversa com a radialista Marcia Denardin, com participação especial do jornalista Marcelo Canellas.
Daniela, 44 anos, é repórter especial do jornal Tribuna de Minas, de Juiz de Fora (MG) há 22 anos. Ela recebeu mais de 20 prêmios nacionais e internacionais, estreou na literatura com “Holocausto brasileiro” e, em seguida, lançou “Cova 312”. Com os livros, ganhou dois prêmios Jabuti. Recentemente, virou documentarista, e seu filme “Holocausto brasileiro” ganhou as telas da HBO em 40 países.
Em dois anos de trabalho, Daniela mergulhou na rotina de famílias que viram sua vida mudar completamente. Classificada por ela como “a maior experiência da carreira”, a jornalista conta no livro, com muita sensibilidade e delicadeza, a história de pais que tiveram sua maior perda e de outras pessoas eu trabalharam intensamente no episódio. Ela dá voz a muita gente que sempre foi ignorada.
Esse livro incrível, da Editora Intrínseca, já está em venda nas principais livrarias do país. Confere lá, é um trabalho impressionante, de muita qualidade. Confira a entrevista realizada com a autora, direto de Juiz de Fora:
Pergunta: De onde surgiu essa ideia de escrever um livro sobre a tragédia da Boate Kiss sob esse viés tão humano?
Daniela Arbex: Nem sempre é o jornalista que escolhe as histórias que vai contar, muitas vezes, ele é escolhido por elas. Esse é o caso de “Todo dia a mesma noite”. Em 2016, um radialista do meu grupo de comunicação, Marcos Moreno, me mandou uma mensagem pelo Facebook dizendo que precisava conversar comigo. Na redação, ele me disse que tinha conhecido uma enfermeira de Santa Maria e que eu “precisava contar essa história”. Na hora, sorri, e disse que Santa Maria ficava do “outro lado do mundo” e que todo mundo já tinha contado essa história. Mas ele insistiu e a atitude dele mexeu comigo. Comecei a procurar as famílias pelas redes sociais, para saber como estavam, e a primeira mãe que me respondeu, a Ligiane, disse que eles precisavam ser ouvidos. Depois disso, peguei um avião e fui para o Rio Grande do Sul. Essa é uma história que escancara a nossa humanidade e que precisa ser tratada com delicadeza. Queria que esse trabalho fosse um memorial de palavras.
Pergunta: Quantas vezes você foi a Santa Maria para construir essa história?
Daniela Arbex: Cinco vezes em dois anos. A cada viagem eu permanecia na cidade por cerca de 15 dias.
Pergunta: Como você viu essa estrutura de emergência montada em poucas horas em Santa Maria?
Daniela Arbex: Fiquei impressionada como uma cidade tão pequena conseguiu se unir para dar respostas rápidas. O atendimento em rede que se viu aí deveria virar uma realidade no país.
Pergunta: Quantas pessoas você entrevistou para construir o livro?
Daniela Arbex: Mais de cem pessoas.
Pergunta: Convivo com muitos personagens do livro desde a madrugada do dia 27 de janeiro de 2013, porque trabalhava em Santa Maria e hoje assessoro a associação dos familiares, mas muitas histórias contadas no livro são inéditas para mim. Na sua avaliação, você conseguiu construir dessa forma por ser de uma pessoa de fora? Isso facilitou?
Daniela Arbex: Estar geograficamente longe foi importante sim. Cheguei ao Sul sem pré-julgamentos, disposta a ouvir, com vontade de enxergar o que não tinha sido visto. Mas não acho que apenas isso me ajudou. Tenho 22 anos de jornalismo voltado para dar voz aos socialmente mudos. As experiências anteriores me ajudaram, mas não conseguiram me blindar do tsunami de emoções que foi contar essa história.
Pergunta: Durante muito tempo, e até hoje, os pais de vítimas eram vistos por algumas pessoas como uma espécie de “leprosos”, que levavam Santa Maria para baixo. Qual sua opinião sobre isso?
Daniela Arbex: Os pais têm o justo direito de querer que seus filhos sejam lembrados. Meu livro tem 55 mil palavras, nenhuma que se refira a superação. Não se supera a morte de um filho. Pedir superação é uma total falta de empatia com a dor do outro. A indiferença, muitas vezes, é uma defesa, é a forma que as pessoas encontram para lidar com aquilo que não são capazes de suportar. Acho que o livro vai trazer entendimento e compreensão da devastação provocada pela ausência.
Pergunta: Qual sua opinião sobre tudo o que aconteceu no Judiciário diante dessa tragédia? De que forma é abordado no livro? Gostaria de pedir sua opinião a respeito de pais processados
Daniela Arbex: O livro é um retrato sem filtros do Brasil atual. De um país que não confia mais na sua justiça e que não se vê representado por ela. Quando a gente desacredita nas nossas instituições, a democracia está em risco.
Pergunta: De onde vem o título do livro?
Daniela Arbex: Queríamos algo que representasse a dor das famílias. “Todo dia a mesma noite” fala de um tempo que parou naquela madrugada terrível, de uma vida que não pode mais ser vivida. É como se o tempo não passasse.
Pergunta: Para terminar, qual a mensagem que você gostaria de deixar com esse livro?
Daniela Arbex: Primeiro, que as pessoas, ao lerem, consigam se colocar no lugar do outro. Depois, meu desejo é construir memória desse episódio. A gente só não repete se conhecer o que realmente aconteceu. Precisamos nos mobilizar e criar uma cultura de prevenção em favor da vida e da segurança. O livro existe para denunciar, ainda, o efeito da falta de justiça na vida de uma pessoa e de um país.
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