Deus ajude o monstro em mim – por Márcio Grings
Sempre encarei “The Beast in Me” não apenas como uma música. Posso senti-la como uma prece. Esse tema escrito por Nick Lowe versa alegoricamente sobre o constante confronto entre o bem e o mal, uma guerra muitas vezes travada de forma silenciosa dentro de cada um de nós. A letra me soa como um pedido de misericórdia ao Criador. Em consequência disso, o personagem da história está visivelmente atormentado pelo convívio íntimo e indivisível com o monstro fundido em seu íntimo. Contudo, ele clama por uma trégua, quem sabe alguém dê uma aliviada. Por isso o constante clamor a Deus, provavelmente a parte mais confiável no espectro desse convívio.
Enquanto humanos e portadores de espíritos turbulentos, invariavelmente nos deparamos com dilemas semelhantes. O convívio com a Fera é tão antigo quanto a história da nossa civilização. Lembre-se de Jesus sendo tentado pelo diabo no deserto…
Em tradução livre, eis o que Lowe nos diz:
O Monstro em mim / É um bicho enjaulado por barras fracas e frágeis / Inquieto de dia / E, quando chega o anoitecer, essa Fera cria confusão e se enfurece com as estrelas / Deus ajude o Monstro em mim.
O Monstro em mim / Teve que aprender a viver fustigado pela dor / Ele sabe como se abrigar da chuva / E num piscar de olhos / Precisa ser contido / Deus ajude o Monstro em mim.
Às vezes, Ele tenta me enganar / Diz que é só um inofensivo ursinho de pelúcia / E, de alguma maneira, até consegue desaparecer num passe de mágica / E é justamente nesse momento que devo ter medo do Monstro em mim.
Todos o conhecem em algum momento…
Ele foi visto com minhas roupas / Passeando irreconhecível / Se é Nova York, [Santa Maria] ou Ano Novo / Deus ajude o Monstro em mim.
No entanto, nada se compara a versão que Johnny Cash nos apresentou em 1994, só voz e violão. Uma interpretação que arrepia a alma. Vejo Cash sintetizando esse modelo humano que briga contra antigos vícios, e que mesmo assim, segue em frente, tentando consertar as coisas na medida em que a carruagem entorta no horizonte. O homem tinha habilidade em lidar com o céu e o inferno buscando espaço dentro do mesmo espírito. Sua história pessoal passa por enevoados momentos de crise, em que certamente brigou feio com a Fera dentro dele. Recaídas no álcool e drogas, momentos de baixa na carreira e outros tantos percalços.
Quase sempre ouço Cash cantando “The Beast in Me” quando estou dirigindo. E eis que “Let the Train Blow the Whistle” se aproxima do fim, na fração de segundos que antecipa a faixa três do CD, inevitavelmente fico reflexivo. Então, atento a letra, conto as estrofes como se fosse um terço imaginário, usando de guia a voz grave do Homem de Preto. Fora do automóvel, blindado pelo para-brisa, vejo o mundo lá fora desbotando igual um jeans surrado. Tela de cinema que projeta um documentário em câmera lenta. Sim, porque dentro do carro, é o filme da minha vida que está em exibição. Piso no tom da trilha sonora mais apropriada, “The Beast in Me”, minha oração.
Deus ajude o Monstro em mim. Amém.
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