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CRÔNICA. Orlando Fonseca, o “dinheiro nosso” que ajuda mais pobres e a defesa da democracia no Brasil

Sinal fechado

Por ORLANDO FONSECA (*)

Eles venceram, e o sinal está fechado pra nós, que não somos mais jovens. Quando Belchior cantou isso, o país passava por uma ditadura, havia censura, perseguição, prisão e morte de opositores ao regime de exceção. Estava em vigência o AI 5 e não havia como dizer o que se pensava. Depois de muita luta, enfrentando os perigos na esquina, a democracia e o estado de direito voltaram à nossa República.

Nesta longa convalescença democrática em que vivemos, desde o fatídico 1985 (com a assunção e morte de Tancredo Neves) já vivenciamos de tudo. Mas podíamos celebrar, ainda que com reservas, o estado democrático e o exercício sadio das liberdades individuais. Convivia-se com as divergências dentro de um mínimo de civilidade. Desde as eleições do ano passado, no entanto, vivemos um ambiente tóxico que está, de novo, colocando enferma a República.

O fascismo, que andava disfarçado, mostra a cara com as redes sociais, nas manifestações de rua, e agora não tem mais vergonha de erguer a voz, de dar a sua opinião. O que antes era feito de modo velado, hoje não tem mais temor, nem pejo de vir a público e escrachar quem pensa de um modo diverso.

A democracia é um ambiente de diálogo, não de disputa insana. Vemos se levantarem vozes contra a Economia Solidária, por exemplo, pelo fato de que busca uma forma de garantir renda sem os vícios do capitalismo. Esse mesmo, que empobreceu os povos, que gerou, pela primeira vez, desde que se faz esta conta, um grupo de trilionários.

O grupo dos bilionários alcança 1% da população, e este pequeno clube privé junto detém um volume de riqueza igual ao da metade da população mundial. O cooperativismo, em termos de política partidária, pela sua essência, mobiliza os representantes de partidos no espectro que vai do centro para a esquerda. Uma obviedade. Assim como Feiras Agropecuárias, ou ambientes de negócios, mobilizam mais os políticos do centro para a direita.

E aí se ouve a reclamação de que recebe dinheiro público para isso – “dinheiro nosso”. Tudo o que o governo dispensa para quem quer que seja da população é através da arrecadação de impostos. Portanto, é uma platitude afirmar isso, pois tudo é nosso. E as disparidades do sistema permitem, inclusive, que a contribuição dos mais pobres e dos assalariados seja maior – no volume total – do que a dos mais ricos e rentistas.

Ora, quando se fala em juro subsidiado para a produção, fala-se em quê? Quem subsidia? É com o dinheiro nosso que o governo paga a conta. E aí se fala em garantia de emprego, o que é uma falácia, pois o parcelamento de salários, a demissão em massa, e a mecanização que substitui mão de obra (seres humanos) é um efeito colateral do investimento feito com dinheiro público na produção.

Socializar o custo, mas não compartilhar o lucro, é distribuir a riqueza do país de modo desigual e injusto; produzir seletividade com o investimento público é aumentar a pobreza.

Os estados republicanos se consolidaram como o modo de produzir garantias de realização do bem comum – a tal da gestão da res publica, como coletivo e não como propriedade privada. Para isso, o ambiente de convívio social com o melhor resultado é o da democracia. Os representantes escolhidos pelo povo precisam se comportar como mediador, e não como o estimulador de discórdia de toda ordem.

É certo que os programas partidários se diferem em propostas e em práticas, mas, uma vez entronizados como gestores dos recursos públicos, precisam agir em nome do “bem comum”. O dinheiro arrecadado pelos tributos e taxas é propriedade do povo, seja para o lado ideológico em que esteja.

No entanto, erguer a voz para falar sobre isso é um risco hoje, como já foi no passado do cantor da MPB. E na parede da memória, este é o quadro que dói mais: tudo o que fizemos para que a realidade fosse hoje melhor do que foi para nossos pais.

(*) ORLANDO FONSECA é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.

OBSERVAÇÃO: A foto que ilustra esta crônica é reprodução de internet. Seu local de origem, em matéria sobre a morte de Belchior, citado no texto, é este site: https://www.redebrasilatual.com.br/cultura/2017/04/belchior-sera-velado-em-sobral-e-em-fortaleza/. Não há registro da autoria.

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Um Comentário

  1. Quanta verdade numa crônica, prof. Orlando!? Meu aplauso de pé.
    Vou tomar a liberdade para usar como referência para minhas aulas e dividir com meus alunos.
    PARABÉNS.

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