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CRÔNICA. Orlando Fonseca e os ‘memes’ que, a seu modo irreverente, interpretam a nossa triste realidade

Memes

Por ORLANDO FONSECA (*)

Em conversa com amigos, em uma mesa de bar, no final de semana, a conclusão é de que, quando o presidente abre a boca, faz a festa dos humoristas, dos cartunistas, dos fazedores de memes da internet, dos comediantes – e bebediantes – em rodas informais pelos botecos do país.

A verdade é que o descalabro geral, que atende pelo nome acadêmico de conjuntura, não enseja outra coisa. Logo, rir da desgraça é uma forma de não cair no choro, um samba cairia melhor com tira-gosto ou pizza. Se isso tudo se resumisse a conversas jogadas fora em ambientes sociais, não haveria maiores problemas, como soe acontecer com o nosso famigerado futebol. Caem treinadores, craques são vendidos, times são rebaixados para a segunda divisão, mas a vida segue.

Acontece que, no caso da realidade atual verde amarela – desbotando para um marrom – é que isso prejudica a vida de milhões de brasileiros. Alguns que sequer se dão conta da origem de seus infortúnios.

Daí é que me angustia, como efeito colateral do divertido parlamento botequinal, o que nos mostram os cartunistas: o mais trágico disso tudo é que a história republicana atual poderá ser sintetizada, no futuro, por uma série de memes.

Veja-se o caso das gozações digitais das redes sociais e das charges, nos jornais do país, sobre a subserviência ao governo dos EUA deste governo brasileiro (esse daí, democraticamente eleito; legitimamente já estou em dúvida depois do laranjal revelado em investigação da PF, e das fake news da campanha eleitoral, admitidas agora pelo Whatsapp). Mais precisamente de outro hilário, Trump, só que com o agravante de este estar à frente da maior potência do planeta.

Bolsonaro entregou a base de Alcântara aos americanos, de mão beijada; aceitou as regras sem contrapartida dos vistos para turistas gringos visitarem o Brasil; foi bonzinho – e com declarações de amor – com o governo americano no caso das prerrogativas da OMC, e tudo o que ganhou para trazer ao seu povo foi um boné do Trump. Um membro do Itamaraty sintetizou o caso magistralmente: “Essa foi a melhor visita que já tivemos desde a época em que a gente ganhava espelhinhos”.

Quando os portugueses aportaram nas areias tupiniquins, os silvícolas os tomaram como deuses, vindos daquele horizonte nunca devassado por alma parente. E aceitaram quinquilharias em troca de bens preciosos.

No entanto, no caso diplomático brasileiro, na atualidade, deveria existir – deveria – mais Inteligência e menos mito. Alguém postou em uma rede social um provérbio antigo: “quem lambe botas só encontra barro”. Estou cada vez mais convencido de que aqueles que elegeram o atual presidente não fazem ideia da encrenca em que estamos metidos.

Caso contrário, não se tomariam de ofensas, vindo a público defender as diatribes e pataquadas perpetradas à guisa de gestão pública federal. Acham que as notícias que chegam do exterior são mentiras, porque preferem aceitar fake news que os bolsominions fazem proliferar nas redes sociais.

O certo, contudo, é que nos tornamos chacota internacional. O que significa das duas uma: os investidores do grande capital – sim, o Brasil precisa de dinheiro para “alavancar” a economia e retomar o desenvolvimento – se aproveitam ou fogem.

Se tudo o que tenho lido e visto no anedotário político trouxesse consequências apenas para a família do presidente, e seus correligionários, ficaria na minha. Mas não, os memes da internet – um derivado do termo criado por Richard Dawkins, para aproximá-lo da noção de genes, só que nesse caso, próximo a “vírus” – têm reflexos profundos sobre a vida dos brasileiros, a nossa vida, sobre a economia, sobre a produção, sobre os índices de desemprego, sobre a cultura e a educação.

Aliás, a falta dessa é que nos trouxe até aqui, e bem se vê, pelo que os ministros estão fazendo com a ciência e a tecnologia no país, a coisa vai se agravar. Só espero que não estrague o humor do brasileiro, que tem treinado muito nos últimos meses.

(*) ORLANDO FONSECA é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.

OBSERVAÇÃO: A imagem que ilustra esta crônica é um meme produzido a partir de um vídeo do YouTube, da visita do presidente brasileiro ao norte-americano em março passado (AQUI). Na ocasião, Bolsonaro ficou calado, nada entendendo do que Trump falava, obviamente em inglês.

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