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CRÔNICA. Orlando Fonseca e o inusitado na guerra contra o Coronavírus: estamos todos do mesmo lado

A lição

Por ORLANDO FONSECA (*)

Por que a Humanidade é que pode sair vencedora desta guerra contra o coronavírus? Falo no sentido de Humanidade, refiro-me ao sentimento de humanidade, aquilo que nos significa em essência. Em uma guerra literal em um campo de batalha, com dois exércitos se enfrentando, ou num embate intelectual com dois polos, sempre haverá a possibilidade de que os que não estejam na arena de combate tomem partido de um dos lados.

Pela primeira vez na história humana, temos uma pandemia que toma conta do planeta inteiro. Por termos também a possibilidade de percepção desse nosso mundo em sua totalidade, sabemos em pouco tempo que a doença se alastra em todos os quadrantes, atingindo sem distinção as pessoas. Ela não respeita idade, condição social, nacionalidade ou gênero.

Do mesmo modo, tomamos conhecimento do verdadeiro esforço de guerra para combater a Covid-19, envolvendo cientistas e profissionais da saúde, governantes e órgãos de imprensa, ao redor de toda Terra.

Esse vírus ataca países indiferente a posições ideológicas. Pode parecer uma platitude o que digo, mas vírus não é de esquerda ou de direita, conservador ou democrata, capitalista ou comunista. Sequer, nesse caso, podemos considerar uma variante social-democrata. Vírus não está em cima do muro, ele chega e ocupa o que tem de ocupar e faz os estragos que tem de fazer.

Em um mundo cheio de polaridades, com misóginos contra feministas, ambientalistas x devastadores, amantes da Amazônia contra madeireiros, caçadores contra sociedades protetoras dos animais, ateus contra fundamentalistas, no caso da pandemia, não existe a possibilidade de que alguém venha em defesa do vírus. Nesta luta, são todos contra o mesmo inimigo.

Mesmo que a origem possa ter sido animal, não se tem notícia, como no caso da gripe aviária, que o Covid-19 ataque os bichos. Isso quer dizer que se trata de uma circunstância restrita aos humanos. Portanto, o que estamos vendo nesta guerra é que um elemento da natureza mexeu conosco.

Estamos sendo violentamente atacados, o que exige unanimidade contra o novo coronavírus. O inimigo não está entre nós. Não existe a hipótese de que alguém o defenda, lute pelas razões dele. Pela primeira vez na História, estamos todos do mesmo lado contra um adversário comum.

O mundo conectado permitiu-nos uma visão planetária, o que Marshall McLuhan preconizava, nos anos sessenta do século passado, como aldeia global. A doença está em nossa aldeia, e, como nunca antes na história humana, temos consciência disso. Hoje em dia, quando falamos da nossa aldeia, somos universais. A tal ponto que permite às pessoas pensarem que o mundo parou, como na canção do Raul Seixas.

As ruas estão desertas, não apenas em Santa Maria, mas em Porto Alegre, Buenos Ayres, Wuhan, Nova Iorque, Tóquio e isso passa na TV, está nas redes sociais, está no conhecimento do nosso cotidiano. E dentre as medidas de prevenção, a mais acertada é essa: ficar em casa. Na Idade Média, a cidadela protegia só os nobres. Hoje, a cidadela – nossa casa – é democrática; a rua é perigosa e sofre a suspeita de estar ao lado do inimigo.

Isso vai nos ensinar sobre união, solidariedade e fraternidade. É quase o ideal iluminista, pois até mesmo a igualdade se pode perceber, quando o vírus ataca ricos e pobres indistintamente. Embora as condições possam ser diferentes, todos estão sujeitos à sua letalidade, morrem da mesma forma.

Pela primeira vez temos a oportunidade de entender que juntos podemos vencer; que a vitória não será de um lado ou de outro, pois a vitória será nossa – com muitas baixas, infelizmente – ou não será. Falo em possibilidade, falo como cronista e não como profeta. Não se trata de uma previsão, mas de um desejo: a beleza disso será compartilhada por todos igualmente. E isso é ser humano.

(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.

Observação do editora imagem que ilustra esta crônica é uma reprodução da internet.

 

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4 Comentários

  1. Depois da tormenta há que se preparar para a próxima. Cadeias de suprimento global vão se rearranjar. Muita gente perdeu dinheiro, certeza de que algo vai acontecer. Suprimentos médicos tendem a se tornar estratégicos, não dá para ficar dependendo de mascaras e respiradores chineses.
    Pessoal do aquecimento global vai tentar surfar a onda. Nesta área as coisas já estão andando, talvez não no ritmo necessário, mas não haverá grana para acelerar muita coisa. Só que daí é bola de cristal.
    Antes que esqueça, modelos matemáticos indicam tendência não certeza. Gripe espanhola teve segunda onda. As regras do jogo terão que ser inventadas enquanto a partida acontece.

  2. Trump falou no remédio aquele. Macaco vê, macaco faz, B38 falou também. Cronologia é confusa, mas já estava na internet antes. Até programa de tv aqui no RS já tinha abordado o tema. Saiu da França.
    Organização Mundial da Saúde (que faz recomendações técnicas, não determina nada) afirma que remédios já existentes são testados em casos como este. Alguns efeitos são conhecidos. Problema? Medicamento de uso continuo para algumas moléstias, faltou nas farmácias. Pessoal que se acha esperto geralmente não tem o equipamento correto.
    Qual o busílis? Médicos com paciente praticamente condenado a morte na UTI não vai esperar por ‘evidencias cientificas’. As pessoas morrem. É coisa que não entra na cabeça dos David Trás os Montes da vida (que fala até em Talidomida). Por isto que o governador de NY (que parece ser razoável) comprou 70 mil doses de hidroxicloroquina, 10 mil doses de zithromax e 750 mil doses de cloroquina.
    Testes clínicos. Pegam 200 caboclos com a doença. Dão remédio para a metade. Outra metade fica no controle. Fazem a conta de quantos melhoram com o remédio e quantos melhoram sem. Grosso modo é isto. Mecanismos do vírus e dos remédios fica para depois. Assunto que tem muito mais a ver com a biomedicina (UFN tem curso na cidade) do que a medicina.

  3. Impressiona também o comportamento do pessoal de humanas (onde ‘ciência’ é só um modo de expressão) e o pessoal de exatas querendo aparecer. Estes últimos querendo fazer respiradores no estilo MacGyver como se não existissem normas, esterilização, etc.
    Pessoal de humanas tem uma visão mecanicista. Acham que tudo é causa e efeito. ‘Não saber’ é algo inadmissível. Aleatoriedade é coisa da Globo (defeito de formação, são aficionados com Freud e abandonaram Jung). As mortes por Covid terão causa determinada, as resultantes da crise econômica depois não. Logo poderão ser ignoradas, tratadas como coisa do cotidiano, nada que pese na consciência. Problema? Não existe resposta certa. Não existe ‘se fizermos tal coisa vai dar certo e todos sairemos bem’. Não ficar preocupado (família, parentes, amigos) seria psicopatia.

  4. Terminada a Segunda Guerra Mundial voltaram os soldados para casa. Ajudou a disseminar a Gripe Espanhola. Perto de 3% da população mundial sucumbiu (perto do que aconteceu na Segunda Guerra). Faixa etária preferencial entre 18 e 25 anos. Hoje seria facilmente algo como 200 milhões de pessoas.
    Polaridade é questão de ponto de vista. O que se vê são grupos se intitulando donos da verdade e querendo impor as próprias decisões.
    Para que olha com certo distanciamento, entre o preto e o branco existem muito mais de 65536 tons de cinza. Também é ‘humano’ e por isto existe estatística (e Big Data). Alás, tem gente falando em ‘planejamento’ que nunca planejou nada na vida e gente que não abre um livro de ciências desde o segundo grau defendendo a ‘ciencia’.
    Discurso do ‘inimigo comum’ funciona até o segundo paragrafo. Não há porque haver unanimidade nos meios de enfrentamento da questão. Já tinha acontecido no caso do aquecimento global, para resolver o problema ‘temos que acabar com o capitalismo’. Alás, irracionalidade também é algo muito ‘humano’. Basta ver os americanos saindo no soco por causa de papel higiênico nos supermercados (aconteceu e virou piada). Também por lá os picaretas começaram a vender vacinas falsas pela internet.

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