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ARTIGO. Leonardo da Rocha Botega, 3 de outubro e o significado da Revolução de 30 para a história do País

90 anos do Dia em que o Brasil foi sacudido

Por LEONARDO DA ROCHA BOTEGA (*)

Porto Alegre, 3 de outubro de 1930, três horas da madrugada. Oswaldo Aranha, Coronel Góis Monteiro e Virgílio de Melo Franco adentraram no palácio do governo do Rio Grande do Sul. No pequeno gabinete da presidência do Estado encontram Getúlio Vargas. O presidente do Estado e candidato derrotado nas fraudulentas eleições ocorridas alguns meses antes, ouve atentamente os planos do levante previsto para ser conflagrado horas mais tarde. Retira da gaveta o manifesto que será divulgado explicando os motivos da revolta e se dirige aos três companheiros dizendo: “só temos duas alternativas, vencer ou morrer, não poderemos emigrar”.

Essas palavras pareciam um prenúncio do dilema que seria vivenciado quase 24 anos depois, após o ultimado golpista recebido pelo presidente. No início da madrugada de 24 de agosto de 1954, segundo relatos de sua filha Alzira, Getúlio Vargas teria encerrado a última reunião ministerial de seu governo com a seguinte frase: “Se vocês não decidem, tomo eu a decisão”. Horas depois cometeria o suicídio que se transformou em um dos principais atos políticos da trágica História do Brasil.

Em que pese uma possível semelhança de predisposição para a morte, os contextos eram diferentes. Em 1954, um presidente isolado das elites política e econômica demonstrava para essas mesmas elites que havia um povo que se via representado no presidente. Um povo que ao ver o seu presidente “sair da vida para entrar para a História” tomou as ruas e impediu a concretização do golpe.

Em 1930, Vargas representava uma frente de oligarquias regionais opositoras que, apesar de serem parte da elite, tinha a clareza de que era necessário ouvir aos apelos dos grupos sociais até então relegados ao segundo plano. A Aliança Liberal, grupo que compusera nas eleições, propunha em seu programa, como bem lembra a historiadora Claudia Wasserman, a união dos vários setores “excluídos das benesses republicanas” em uma integração que incorporaria a Nação “as gentes e as terras”.

Segundo os revoltosos de 30, era preciso sacudir o Brasil. Produzir um novo projeto político, uma mudança que tirasse o país do atraso gerado pela condição de ser unicamente uma economia agroexportadora.

Enquanto os países desenvolvidos já haviam consolidado a Segunda Revolução Industrial, o Brasil sequer havia dado os passos mais sólidos da Primeira Revolução. Enquanto países vizinhos como Argentina, Chile e Uruguai já possuíam sistemas educacionais públicos consolidados, o Brasil sequer tinha uma política de governo destinada ao combate ao analfabetismo.

As revoltas da década de 1920 haviam demonstrado que o povo já não aceitava as mazelas impostas pelas oligarquias dominantes. Para as oligarquias opositoras era preciso mudar de luva para não perder os dedos.

A frase atribuída ao governador mineiro, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, “façamos a revolução antes que o povo o faça”, indicava o caminho e os limites do movimento.  Getúlio Vargas chegou ao poder com esse intuito. Na próxima década e meia o país viveria um significativo processo de transformação. A identidade nacional seria ressignificada, a urbanização e a industrialização seriam impulsionadas, os direitos trabalhistas seriam conquistados. O Brasil em 1945 era diferente do Brasil de 1930.

A “Revolução” iniciada naquele 3 de outubro mudou a História do Brasil. Propiciou uma modernização cheia de contradições. Entre o avanço e a conservação, impulsionou reformas bastante radicais para o atraso que o país vivenciava. Reformas que evidenciaram as necessidades de outras reformas, ainda mais radicais, para que a Nação tomasse o rumo da igualdade e da justiça social. Reformas constantemente adiadas por diferentes tipos de Golpes, proferidos em diferentes contextos para que as mínimas mudanças não ocorram. Afinal, quem lucra com as injustiças não deseja que a plenitude nacional se realize.

(*) Leonardo da Rocha Botega, que escreve no site às quintas-feiras, é formado em História e mestre em Integração Latino-Americana pela UFSM, Doutor em História pela UFRGS e Professor do Colégio Politécnico da UFSM. É também autor do livro “Quando a independência faz a união: Brasil, Argentina e a Questão Cubana (1959-1964).

Observação do editor: a imagem (sem autoria determinada) de revoltosos nas ruas do Rio de Janeiro em outubro de 1930 é do arquivo do CPDOC, da Fundação Getúlio Vargas.

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Um Comentário

  1. Tudo isto pode ser até verdade. Questão de interpretação. Getúlio rasgou a Constituição de 1891. E a de 1934. Fez a de 1937 e não cumpriu em grande parte. Foi ditador, Estado Novo. Perdeu apoio das Forças Armadas, deu uma guinada populista. Havia o receio fundado da volta do Estado Novo. Isto também é verdade.
    Fez muito, mas tomou uma providencia bastante inteligente. Contou a própria historia através de diários, cartas e farta documentação. Efeagá, com seus livros, faz a mesma coisa. Pessoal do Molusco aparentemente não deu por conta disto. Tática simples, não deixar ao acaso e não permitir os críticos falarem sozinhos.

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