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Eleições Municipais, Cidadania e Participação Popular – por Michael Almeida Di Giacomo

No próximo domingo milhões de brasileiros irão mais uma vez às urnas depositar um voto de confiança aos agentes políticos, que terão como responsabilidade resolver problemas estruturais e propor políticas públicas no encontro do bem-estar do coletivo social.

O exercício do voto, é interessante, para alguns torna-se um grande fardo. Eu penso que esse sentimento tem por fundo, primeiro, o fato de o voto no Brasil ser obrigatório, pois ninguém gosta de ser obrigado a fazer algo. E segundo, não há como negar, o distanciamento entre a classe política e a grande massa da população. Esse é um fato que corrobora para que o cidadão deixe de se identificar com um ou outro nome para lhe representar.

Em relação ao primeiro, o voto obrigatório, é parte da nossa vida eleitoral desde a Carta Constitucional de 1988. Nossa sociedade, à época, já trazia em sua história muitos períodos de rupturas democráticas. Os legisladores, a fim de fortalecer a incipiente esfera democrática, entenderam que o exercício do voto não deveria ser somente um direito e sim uma obrigação.

Parece ser uma razão controversa, porém é necessário compreender que oligarquias estabelecidas, colonialismo espoliador, voto a cabresto, anos de chumbo sob o manto de ditaduras, esses e outros tantos contextos foram responsáveis para que as pessoas não tivessem sua cultura formada a partir do autoconhecimento enquanto sujeito de direitos e, obviamente, deveres, sendo protagonista do seu próprio meio social.

Há países em que a democracia, como um regime consolidado, tem o exercício do voto facultativo. É possível ver relação entre os institutos? Creio que sim. E se esse for o caminho que deve ser percorrido para que o voto nos seja tutelado somente como um direito, e não uma obrigação, penso, será longo.

O motivo é possível de ser aferido por meio da observância de inúmeras rupturas institucionais presentes na história dos países na América Latina. Veja o caso da Venezuela e, mais recentemente, da Bolívia.

O segundo motivo, o distanciamento dos agentes políticos da grande massa da população, é um fator inerente à democracia liberal adotada em nosso país. O cidadão, em regra, somente no período eleitoral é alçado à condição de protagonista do destino da sua comunidade e da sua nação.

A previsão constitucional de participação popular, por meio de plebiscitos ou referendos, é praticamente nula em nosso país. Com isso, o diálogo entre representante e representado acaba por ser prejudicado. O cidadão, que deveria exercer seu direito a voz de forma constante, ser o protagonista, torna-se coadjuvante após o dia da eleição.

Em 2020 fechamos 32 anos da promulgação da nossa Carta Constitucional. Nesse tempo, já tivemos dois processos de impeachment que mudaram os cenários políticos do país. Outros tantos ocorreram ou estão a ocorrer em municípios e estados da federação.

O grande número de partidos políticos e a confusão ideológica que resulta dessa liberalidade partidária, também são um fator a ser considerado. O resultado é que movimentos sociais apartidários, mas nem por isso menos ideológicos, restam por se legitimar em meio àqueles que se mostram insatisfeitos com o sistema.

Vivemos um processo de amadurecimento da nossa cidadania. Um exemplo são as experiências a ampliar a participação cidadã, como as candidaturas coletivas, que surgem especialmente nos partidos de esquerda.

É sob esse contexto que o encontro do conhecimento e da história que nos trouxe até aqui torna-se fundamental para solidificar os pilares democráticos da nossa nação.

Dia 15 de novembro seremos novamente ouvidos. E decidiremos. Espero que em pouco tempo possamos ser protagonistas todos os dias, e não somente um dia a cada dois anos.

(*) Michael Almeida Di Giacomo é advogado, especialista em Direito Constitucional e Mestre em Direito na Fundação Escola Superior do Ministério Público. O autor também está no twitter: @giacomo15.

Observação do editor: A foto de urna eletrônica, que ilustra este artigo, é de Nelson Jr, da Assessoria de Comunicação do Tribunal Superior Eleitoral.

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Um Comentário

  1. Eleição tem duas características (e muita gente fala nisto) primordiais. População tem que olhar o processo e achar que é razoavelmente confiável. Ao contrário do que afirma autocraticamente o ministro Barroso, é necessário que em alguns lugares exista impressão para auditoria do processo. Não pode ficar somente na base do ‘la garantia soy yo’. Não é a urna, seria muito trabalhoso e caro atacar dezenas de milhares de urnas. TSE utiliza infraestrutura já instalada e não é invulnerável. Não são somente hackers, temos que ter garantia que os governantes não são escolhidos pelos integrantes setor de tecnologia de informação do tribunal. Aconteceu uma invasão cibernética do STJ. Ramsomware. Talvez um spear-phishing de uma única conta. Ministério da Saúde também teve problemas, como universidades anteriormente. E possível saber mais do hackeamento de uma usina nuclear no Irã do que acontece no Brasil.
    Cenário é simples. No dia da eleição para presidente uma penetração não detectada acontece e paralisa a apuração. Recorrem aos backups Independente de quem perder, vai alegar fraude. E não haverá nada além do ‘la garantia soy yo’.
    Segunda característica: eleições tem que fazer diferença na vida das pessoas. Para melhor.
    Barroso, que fora do direito é uma nulidade, terá que passar. Alás, trocaria o sistema de votação brasileiro pelo americano na hora que quisessem. Bastava vir o padrão de classe média ianque pré-pandemia de contrapeso.

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