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MULHER. Mães docentes da UFSM relatam as suas angústias e os desafios de trabalho no modo remoto

Professoras enfrentam o adoecimento psíquico e ainda sobrecarga de trabalho

Por Bruna Homrich / Assessoria de Imprensa da Seção Sindical dos Docentes da UFSM

Desde o dia 16 de março de 2020, as aulas presenciais estão suspensas na UFSM. Quase que imediatamente após a interrupção da presencialidade, a universidade já instituiu o Regime de Exercícios Domiciliares Especiais (REDE), modelo de ensino remoto que, num primeiro momento, foi justificado como uma forma de manter os vínculos entre estudantes e professores (as), e hoje já vem sendo adotado como um caminho para viabilizar a formação acadêmica durante a pandemia. Ocorre que tanto estudantes quanto docentes tiveram de se adaptar muito rapidamente às atividades mediadas pela tecnologia. E a falta de diálogo entre a reitoria da UFSM e os segmentos discente e docente vem sendo duramente criticada pelas entidades representativas desde o ano passado.

Se a adaptação para o trabalho remoto careceu de preparação e vem sendo difícil ainda hoje para a categoria docente, a divisão sexual do trabalho leva a que o ano que passou, e o que se inicia, sejam ainda mais duros para as docentes mulheres. Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) divulgada em 2020, as mulheres gastam, com serviços domésticos, 10 horas e 24 minutos a mais por semana que os homens. Soma-se a isso o fato de que elas ainda são as principais responsáveis pelo cuidado com as pessoas vulneráveis da família – em se tratando do contexto da pandemia, com as pessoas consideradas grupos de risco para Covid-19.

Roberta Forgiarini (foto ao lado), docente do departamento de Fundamentos da Educação da UFSM, é mãe de Maria Clara, de 3 anos e 5 meses, e praticamente a única responsável pelo cuidado com a filha. Embora tenha o auxílio de uma senhora que a ajuda desde o nascimento da nenê, as demandas têm sido gigantes.

Somos só eu e ela. Eu sinto que tudo se misturou. Tem momentos em que estou participando de reuniões e tenho que fechar câmera e áudio para ir fazer algo com ela. A sensação que eu tenho dentro de casa é que estou sempre me escondendo. Tenho um escritório, mas ela [Maria Clara] tomou conta. Eu vou me acomodando em outros espaços e ela vai me procurando pela casa. Já terminei reunião com a Maria Clara literalmente montada nos meus ombros. Terminei reuniões dentro do banheiro porque ela estava brincando, jogando as coisas, e eu precisei de um lugar para me afastar e poder fazer as coisas. O lugar que eu encontrei foi o banheiro”, conta Roberta, que num primeiro momento, por inseguranças e incertezas relativas a como o processo se desenrolaria, não aderiu ao REDE. Quando o modelo foi normatizado pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPE) é que ela começou a fazer a recuperação dos conteúdos do semestre.

“Diferente daquele modelo presencial em que eu conseguia sair de casa, dar minha aula, fazer minhas coisas na universidade, agora não tenho isso. Faço tudo e ao mesmo tempo”, completa.

Em escritórios caseiros improvisados, atendendo às demandas de burocracia, de docência, de pesquisa e, muitas vezes, de extensão, tais docentes veem a linha que antes separava o local de trabalho e o local de descanso ser borrada até praticamente inexistir. Entre as urgências de estudantes, dos órgãos de fomento, das unidades de ensino e da própria família, de que forma elas vêm internalizando e elaborando psiquicamente a pandemia?

Segundo dados da Perícia Oficial em Saúde da UFSM, desde o início da pandemia (dados de 16 de março de 2020 a 10 de março de 2021), 147 professoras solicitaram afastamento do trabalho. Dessas, 44 entraram no período de licença gestante; 5 afastaram-se em decorrência de doença em pessoa da família; e 98 atestaram licença para tratamento de saúde.

Dentre as 98 que se afastaram para tratar algum problema de saúde, a maioria (20) teve como motivo as Doenças Mentais e Comportamentais; 18 tiveram como causa as Neoplasias Malignas; 16 afastaram-se por Doenças Osteomusculares e Traumatológicas; 10 por Doenças Cardiovasculares e 8 por Doenças Infectocontagiosas. Os demais afastamentos foram relacionados a outras doenças: gastrointestinais, oftalmológicas, neurológicas, respiratórias, renais e outras.

Para Giuliana Redin (foto acima), docente do departamento de Direito da UFSM, embora já exista um amplo reconhecimento acerca das duplas e triplas jornadas de trabalho assumidas pelas mulheres, o agravamento dessa situação no período de pandemia parece “totalmente desconsiderado”. Mãe de uma bebê de 1 ano e 8 meses e de um menino de 8 anos, ela diz que vem ocorrendo uma total invasão do trabalho na vida privada, tendo em vista que o cuidado integral dos filhos pequenos acontece em meio ao trabalho. Seu marido solicitou flexibilização da jornada de trabalho para dividir os encargos domésticos, mas, por ser profissional da saúde, teve o pedido negado.

“Ao invés de a universidade olhar para a singularidade dos impactos da pandemia na vida das mulheres mães, buscou padronizar as condições de trabalho, como se o problema se resolvesse ensinando as professoras a usar o Meet e o Moodle. Como se acessar Meet, Moodle e REDE pudesse nos colocar em igualdade de condições de trabalho e produção em relação a docentes sem encargos familiares. Portanto, eu não aderi ao REDE, tive que trabalhar neste sistema quando se tornou obrigatório na UFSM”, critica Giuliana.

Preocupação semelhante tem Eliana Menezes (foto acima) docente do departamento de Educação Especial da UFSM, e mãe de duas crianças: uma de 9 e uma de 5 anos. “Não é possível que a gente mantenha a mentalidade de que dá para trazer o presencial para dentro de casa e está tudo bem. É preciso não ser conivente com práticas excludentes que podem intensificar as desigualdades”, pondera. Para ela, nesse contexto de trabalho e ensino remoto, é necessário que se levem em consideração as condições singulares de vida de cada docente, aluno e técnico-administrativo em educação que constituem a comunidade acadêmica da UFSM.

“Me preocupa muito o quanto o REDE pode se configurar como uma prática bastante excludente porque as condições de acompanhamento das disciplinas definitivamente não são as mesmas. Me entristece saber que alguns alunos vão ficando para trás. É uma montanha russa diária”, desabafa Eliana.

Ainda que sempre tenha sido um desafio conciliar a maternidade com as obrigações da docência e da pesquisa, antes da pandemia a docente contava com uma rede de apoio bem construída e que tornava possível a ela cumprir com esses dois papéis sociais. Além da escola das crianças no turno da tarde, Eliana também contava com o apoio de uma trabalhadora que cuidava das crianças no turno da manhã, e também de sua mãe. “Tudo isso se decompôs a partir de 16 de março do ano passado, quando nos fechamos dentro de casa. Começamos a cuidar da casa. Isso significa cozinhar, limpar, lavar, pendurar, guardar roupa, guardar brinquedo. Associado a isso a gente começou a ter as demandas das escolas das crianças”, conta.

Ela e o marido estão em home office até então e se revezam para cumprir todas as tarefas necessárias à manutenção da rotina doméstica e ao cuidado com os filhos. Geralmente ela concentra suas aulas e orientações de manhã, pois no final da manhã e à tarde o esposo tem de cumprir seus horários de trabalho e as duas crianças em idade escolar, com aulas remotas, necessitam de acompanhamento.

Contudo, como sabe que não é possível dar conta de todo trabalho em apenas uma manhã, Eliana acorda entre 4 e 5 horas da madrugada. “Até às oito eu faço um turno, e das oito ao meio dia faço outro turno…”

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