O inconformismo dos inimigos da justiça – por Paulo Pimenta
Avaliação à reação midiática ao que decidiu o STF, liberando Lula para 2022
As decisões tomadas pelo Supremo Tribunal Federal a partir de 8 de março último, sacramentaram a incompetência da 13a Vara Federal de Curitiba para conduzir os processos movidos contra o ex-Presidente Lula e a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro no julgamento das ações.
Tais decisões anularam os processos e devolveram ao ex-Presidente seus direitos políticos ilegalmente suspensos. Produziram então a necessidade das diferentes forças sociais se posicionarem diante da perspectiva dos desdobramentos imediatos e de médio prazo da crise brasileira. O próprio ocupante do Palácio do Planalto se movimentou no sentido de redefinir suas posições negacionistas frente à pandemia. Cobriu o rosto com uma máscara e afirmou que jamais se opôs à vacina…
Nesse 19 de abril se completam quarenta e um anos da prisão do então líder dos metalúrgicos de São Bernardo e Diadema, Luiz Inácio da Silva, o Lula, por dirigir uma greve considerada ilegal pela Ditadura civil-militar, já em declínio. Em lugar de arrefecer o movimento, a prisão de Lula revigorou a mobilização e consolidou em nível nacional sua liderança à frente dos trabalhadores brasileiros.
Esse registro é importante porque demonstra que o patronato e o Estado brasileiro não foram capazes, naquele momento, como agora, de compreender o significado da presença desse ator que se tornaria central na cena política do país, ao longo desses quarenta anos.
Mesmo alguns setores das esquerdas não conseguiram decifrá-lo. Alguns o veem até hoje somente como vítima da máquina opressiva de um Estado autoritário. Têm razão apenas em parte. Lula foi vítima quando acompanhou a mãe na carroceria de um caminhão entre Garanhuns e Santos. Ele apenas colhia, naquele percurso, ainda sem consciência do que significava a longa viagem dos retirantes, os resultados da exclusão social vigente no país em que nasceu.
Lula deixou de ser só uma vítima, desde que iniciou sua trajetória política. Tornou-se alvo permanente – o que é outra coisa – do combate das forças conservadoras do país. Adquiriu plena consciência dos riscos que este caminho lhe apresentaria. Perante os setores oligárquicos da sociedade brasileira ele sempre responderá pelos crimes da progressão do salário-mínimo, de assegurar as três refeições por dia aos setores excluídos da população, do acesso à escola, à moradia, à saúde, ao trabalho com carteira assinada. Sempre responderá pelo crime de ter incluído os pobres no orçamento público, quando se elegeu Presidente da República.
Essa luta sem tréguas movida contra ele e contra o Partido dos Trabalhadores reproduz a cultura de desqualificação, exclusão e posterior aniquilamento do adversário – aqui tratado como inimigo – que prevalece desde sempre nas disputas políticas, na história do Brasil.
Em fevereiro de 1980, Lula fundara o Partido dos Trabalhadores, o instrumento de luta que unificaria as forças populares mais avançadas, naquele momento da história. Desde então, converteu-se no Inimigo Número 1 dos setores políticos conservadores pelo que simbolicamente representava: o pé na porta, a voz que se fez ouvir sem pedir licença, no círculo fechado da democracia dos patrícios, um mundo que desde sempre fora privativo dos oligarcas. Deste contexto e do arraigado preconceito de classe, deriva o profundo ódio que o patronato e seus representantes devotam a ele. E por essa razão, entre outras, o atacam.
No último sábado, 17 de abril, o jornal “O Estado de São Paulo” debruçou-se sobre as decisões do STF para examinar suas consequências e produziu um editorial que expressa de forma cristalina a leitura da direita neoliberal derrotada em 2018. Como todos se recordam, a direita brasileira não vacilou em subordinar-se à extrema-direita e abrir caminho, no segundo turno, para a ascensão do neofascismo e assim evitar uma a quinta vitória consecutiva do Partido dos Trabalhadores.
Porta-voz mais emblemático das oligarquias paulistas, dos barões do café do século XIX, aos yuppies do século XX, o “Estadão”, em pleno século XXI, arremete furioso contra o voto do Ministro do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski: “No caso anterior, que resultou na prisão do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva por 580 dias e lhe custou a candidatura à Presidência da República no momento em que as pesquisas de opinião indicavam que estava bem cotado, o que aconteceu nesta Suprema Corte? Rememoremos, a bem da História. Houve uma opção de trazer o Habeas Corpus, que era uma questão subjetiva que envolvia o ex-Presidente Lula tirando-o da Segunda Turma e trazendo-o ao Plenário, antes de decidir as ações diretas de inconstitucionalidade impetradas pela Ordem dos Advogados do Brasil. Se essa inversão não tivesse sido feita, a história do Brasil poderia ter sido diferente”.
“A História do Brasil poderia ter sido diferente…” concluiu o Ministro, para indignação do editorialista. Incomodado talvez pela evidência da tragédia institucional e sanitária que vivemos sob o governo que ajudou a eleger em 2018. Lembrem-se do editorial “A difícil escolha”, entre o professor Fernando Haddad e o notório defensor da ditadura e da tortura, Jair Bolsonaro. Não há como apagar a cumplicidade da direita neoliberal, que tem no “Estadão” um dos seus porta-vozes, com o neofascismo que assumiu o governo em janeiro de 2019.
Mestre da impostura que atribui a seus adversários, o “Estadão” não comenta a decisão da 2ª Turma que declara a parcialidade do ex-Juiz e ex-Ministro da Justiça de Bolsonaro, Sérgio Moro, saudado e aplaudido pelo jornal durante as tropelias da operação lava-jato. O que significa inequivocamente que a Suprema Corte devolveu de forma plena os direitos políticos do ex-Presidente Lula. Aparentemente, o tribunal da família Mesquita não acolhe nem o princípio jurídico que atribui ao acusador o ônus da prova.
O editorialista se sente emparedado por uma situação gerada, entre outras razões, por sua própria cumplicidade e inconsequência: “Neste cenário, (leia-se com o retorno do ex-Presidente Lula ao palco da disputa) a política partidária institucionalizada não tem lugar, e o debate racional para articular saídas para a imensa crise nacional corre o risco de ser interditado pela gritaria populista. E os cidadãos de bem deste país serão, mais uma vez, as verdadeiras vítimas, como sempre, da mediocridade, da ignorância e da má-fé.”
Esta última frase, deve ser o inconsciente remetendo à opção deste segmento pela ultra direita alicerçada na mentira, no preconceito, no fundamentalismo e nas fake News.
O jornal reconhece: “De certa forma, os muitos excessos do lavajatismo não apenas alimentaram o clima que viabilizou a vitória de Bolsonaro em 2018, como, agora, que Lula da Silva revigorasse sua força eleitoral e política, que vinha declinando depois de tantos anos de corrupção e desastre econômico.”
O desastre econômico a que se refere o editorial trata do período em que o país recuperou o PIB, gerou mais de vinte milhões de empregos com carteira assinada, elevou em 70% o poder de compra do salário-mínimo, alcançou o “investment grade”, pagou a dívida externa, tornou-se credor do FMI e deixou o país com U$ 370 bilhões em reservas internacionais.
E sobre a corrupção, certamente o referido articulista, para conviver consigo mesmo, deve ter renomeado este tipo de atividade, para “passar pano” nas ações mais do que explícitas protagonizadas pelo clã Bolsonaro. Uma desesperada tentativa de vender um governo austero. Afinal, a “mamata acabou”…., menos para a família presidencial, seus amigos e aliados.
O editorial do “Estadão”, a partir do próprio título, “Recidiva”, anunciando a possível volta de Lula e do Partido dos Trabalhadores ao governo, soa afinal como uma confissão do fracasso da direita neoliberal ao apoiar a ascensão do neofascismo e, ao mesmo tempo, sua impotência de constituir um programa de desenvolvimento soberano para oferecer ao país e em torno dele construir um nome competitivo para se apresentar na disputa de 2022.
Não será um caminho fácil até 2022.
Todos os defensores da Democracia atentos ao que ocorrerá no STF, na próxima quinta-feira, 22 de abril!
Justiça para Lula!
Justiça para o povo brasileiro!
(*) Paulo Pimenta é jornalista e deputado federal, presidente estadual do PT/RS e escreve no site às quartas-feiras.
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