Artigos

Segunda dose – por Orlando Fonseca

Como, a estas alturas, se pode formular o pensamento de ser “contra a vacina”?

Nesta semana tomo a segunda dose da vacina contra o coronavírus. Foram quatro semanas de expectativa para que se complete a imunidade desejável, e em minha vida de sexagenário, não imaginava que tomar uma injeção no braço pudesse me encher de algum gozo.

E não apenas em mim esta sensação de feliz tranquilidade está batendo, ela se estende por familiares, por amigos, por todos os que de alguma forma se importam com a minha existência. “Então, finalmente, vais tomar a segunda dose”, eles me dizem como se estivessem celebrando o meu ingresso na Universidade, a publicação de um livro, a vitória em algum concurso literário.

Para além do sentido de fraternidade que estas sensações se apresentam, em mim elas adquirem um significado que eleva as minhas circunstâncias – aquelas que, junto como meu eu informam o que sou – para a positividade.

É o triunfo da ciência, diante da arrogância do senso comum e da ignorância do negativismo. Então, imagina meu susto ao ler no início da semana que as doses ainda não chegaram, e a euforia dá lugar à apreensão e a tristeza com os desmandos que presidem as políticas públicas em nosso país.

Enquanto escrevo estas palavras para introduzir a crônica desta semana, me ocorre que muitos dos que tomaram a primeira dose não retornaram para o reforço. Uns porque não se deram conta desta necessidade, outros porque perderam a carteirinha e não sabem a data.

Há também os que têm dificuldade de encontrar as informações no bombardeio diário em que a pauta da Covid se transformou na mídia. Contudo, estes ainda têm uma justificativa razoável, diante daqueles que não vão tomar a segunda dose porque entendem que sequer deviam tomar a primeira.

Não consigo entender, a estas alturas, que alguém possa formular o pensamento de ser “contra a vacina”, não apenas dessa. Entretanto, é incompreensível que, nessa vacinação de agora, diante de uma pandemia que tomou conta do Planeta, que modificou a rotina das cidades em todos os países, e que tem levado vidas de gente que estava conosco ainda ontem, alguém possa dizer: “não vou tomar, porque sou contra”.

É o mesmo absurdo que levasse alguém a tacar fogo em seu apartamento, pela razão de que é sua propriedade e ninguém tem nada a ver com isso. A imunidade contra um vírus letal que se espalha de pessoa a pessoa só será eficaz se todos estiverem em condições de barrar o contágio.

Não é por outra razão que os laboratórios ao redor do mundo se aplicaram a criar o imunizante em tempo recorde. A indústria farmacêutica mobiliza-se pelo dinheiro, é fato, mas nesse momento temos uma guerra contra a humanidade, que precisa se defender. Nada justifica ser “contra” neste momento.

Da mesma forma, fico estarrecido ao perceber que autoridades, no Brasil, ainda insistem em recomendar um tratamento precoce que não tem eficácia com relação ao coronavírus. Basta dar uma olhada, atenta, aos vários sites que apresentam dados sobre a epidemia.

Não apenas a OMS, não são apenas as Associações médicas, não são os comunistas que estão dizendo. São especialistas: não foi realizada pesquisa que comprove que vermífugos ou cloroquinas possam prevenir o sujeito contra o ataque do vírus.

Tudo o que as redes sociais propagam a respeito de seu uso é observação clínica, que não tem capacidade de avaliar se é efeito placebo, se a pessoa usou sem necessidade – pois assim como 90% da população, não desenvolveria a doença mesmo – e o pior, quais os efeitos colaterais, que já estão colocando em UTIs um número razoável de pessoas com problemas sérios no fígado ou no coração.

Embora eu esteja feliz com a segunda dose fico apreensivo pela falta de doses, ainda preciso conviver com o desagrado de observar a inversão de prioridades na indicação de tratamentos não abalizados pela ciência.

Ao fim e ao cabo, por observar na História a caminhada da civilização, estou certo de que a razão e o método é que vão prevalecer – é o que me consola. Afinal como diz o antigo provérbio, a esperança é a última que morre – com ou sem vacina.         

(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.

Observação do Editora foto que ilustra esta crônica é de Ariéli Ziegler, da Assessoria de Imprensa da Prefeitura Municipal.

Artigos relacionados

ATENÇÃO


1) Sua opinião é importante. Opine! Mas, atenção: respeite as opiniões dos outros, quaisquer que sejam.

2) Fique no tema proposto pelo post, e argumente em torno dele.

3) Ofensas são terminantemente proibidas. Inclusive em relação aos autores do texto comentado, o que inclui o editor.

4) Não se utilize de letras maiúsculas (CAIXA ALTA). No mundo virtual, isso é grito. E grito não é argumento. Nunca.

5) Não esqueça: você tem responsabilidade legal pelo que escrever. Mesmo anônimo (o que o editor aceita), seu IP é identificado. E, portanto, uma ordem JUDICIAL pode obrigar o editor a divulgá-lo. Assim, comentários considerados inadequados serão vetados.


OBSERVAÇÃO FINAL:


A CP & S Comunicações Ltda é a proprietária do site. É uma empresa privada. Não é, portanto, concessão pública e, assim, tem direito legal e absoluto para aceitar ou rejeitar comentários.

5 Comentários

  1. Negacionismo =Obscurantismo! Mas não esqueçamos que a mãe do negacionista-mor já se vacinou e ele escondeu sua carteira de vacinação por 100 anos! Ridículo! Se a esquerda é burra porque a direita tem tanto medo? Bueno, o Marlon chegou e vou lá ajudar minha avó que está na privada obrando!

  2. Guerra contra a humanidade é um platonismo sem sentido. Caminhada da civilização idem.
    Duas coisas que quase não se fala, India entrou numa segunda onda (a curva está bem definida por lá). Cremações em massa. Confiscaram oxigênio até das siderúrgicas. População vacinável, segundo a OMS, é aquela acima de 18 anos. Logo tem muita gente calculando porcentagem errada por aí.
    Kennedy inventou que em chinês a palavra crise era formada por dois ideogramas, um deles ‘oportunidade’. Hobsbawm inventou uma maldição chinesa ‘que você viva tempos interessantes’. O que os chineses falam de verdade: ‘é melhor ser um cachorro em tempos tranquilos do que um ser humano em época de caos’.

  3. Utilizando Pareto, uma solução 80%, para quem já fez algo além de escrever textos, é mais do que boa. Ainda mais lidando com pessoas. Há quem não vá tomar vacina por problemas psicológicos (vide setembro amarelo). Há quem esteja apavorado com as noticias de mortes por formação de coágulos (casos raros mas amplamente noticiados). Exemplos não inventados, é bom ressaltar. Resumo da ópera: não há o que não haja.
    Tratamento precoce é questão entre médico e paciente, não de opinião publica, que neste caso não passa de ruído.

  4. Modernismo no Brasil é somente um movimento artístico, a parte filosófica ficou de fora. Defeitos do sistema de ensino. Engenheiros de obra pronta, planejadores do passado por aqui não faltam. Nenhum espanto, na aldeia querem salvar a Amazônia mas as sangas recebem esgoto, a coleta seletiva de lixo é incipiente e por ai vai. Negocio é sinalizar virtude ‘olha como sou legal, sou ecologico’. E incapaz de plantar uma arvore.
    Sim, é direito da pessoa não querer tomar vacina. Algo que os autoritários de esquerda não conseguem, como muitas outras coisas, entender. Tanto é que muitos procedimentos médicos exigem assinatura de termo de consentimento do paciente. Coisa do CC ‘Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.’

  5. Hummm….pelo jeito a parada é injeção nos glúteos.
    Pessoal da esquerda não é da ‘positividade’, é uma impossibilidade. É contra tudo, no caso os negadores da ciência, os defensores do senso comum, etc. Motivo é politico, se os outros tivessem posições contrarias teriam sinal contrário. O histórico das coisas não mentem. Alás, alardear as próprias virtudes e ressaltar os defeitos dos outro, reais ou inventados, também faz parte do currículo. Alás, humildade não é o ponto forte, quem vive lembrando os outros das ‘conquistas’, de como é ‘bão’, sinaliza que não é.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo