Do portal especializado Congresso em Foco / Por Rudolfo Lago
O deputado Osmar Terra (MDB-RS) pregou que metade da população brasileira viesse a ser infectada pelo novo coronavírus. Quando isso acontecesse, dizia ele, todos teriam anticorpos e 99% ficaria assintomática. Só aí, assegurava, o contágio da covid-19 iria se reduzir. Fora isso, escreveu o deputado no Twitter, “o coronavírus seguirá na sua trajetória com quarentena ou não”. O deputado Daniel Silveira (PSL-RJ) assegurou que a pandemia da covid-19 é a chegada no que ele chamou de “bio-era”, um tempo em que as armas convencionais são substituídas por armas biológicas, como o coronavírus que, segundo ele, foi construído em laboratório “para atrapalhar e interferir nas eleições americanas”.
Os exemplos acima estão em uma lista da CPI da Covidque investiga a atuação de políticos na disseminação de fake news sobre a pandemia, à qual o Congresso em Foco teve acesso. Durante o período de recesso parlamentar, a organização de documentos que apontam quem foram os responsáveis por produzir e espalhar pelas redes sociais desinformação sobre a pandemia é a nova linha de trabalho das equipes que assessoram os parlamentares na comissão.
A lista foi produzida pelo grupo de 41 voluntários que o relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL) arregimentou e que atuam na busca de informações na internet, especialmente para checar dados. A lista tem o nome de 26 políticos, ministros do governo, deputados e senadores. Alguns, inclusive, de oposição.
Além da lista de políticos, a CPI da Covid investiga a origem de 68 perfis na internet, com milhares de seguidores, que espalharam, por exemplo, notícias amedrontadoras sobre vacinas e outras notícias falsas. Esses perfis a comissão ainda mantém sob sigilo, porque muitos têm a autoria anônima. A CPI quer descobrir quais são seus autores e a origem dos disparos. Teme, assim, que a divulgação dos perfis faça com que seus autores tirem as páginas do ar dificultando a investigação.
No caso dos políticos, a ideia, ao final, é verificar suas responsabilidades na disseminação de ideias falsas ou distorcidas sobre a pandemia. Como pessoas públicas, com credibilidade junto à parte da sociedade, as opiniões desses políticos acabem tendo forte importância na formação de conceitos que podem ter dificultado o combate à doença no país.
Os técnicos da CPI observam que há grande coincidência na maioria dos nomes com os que também aparecem nas investigações da CPI das Fake News e dos atos antidemocráticos apurados pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Casos dos filhos do presidente, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), da deputada Bia Kicis (PSL-DF) e do deputado Daniel Silveira.
O trabalho mostra especialmente a força da atuação de Osmar Terra, uma espécie mesmo de ministro da Saúde paralelo. De longe, ele é o político com maior presença na lista e com maior volume de divulgação de informações consideradas falsas ou distorcidas. Osmar Terra defende o uso de medicamentos sem eficácia comprovada, critica o isolamento social, defende a tese da imunidade de rebanho, distorce dados sobre a doença, de acordo com o levantamento feito.
Ele, por exemplo, divulgou dado falso sobre o crescimento da taxa de mortalidade na Suécia, país que aponta como exemplo porque não teria adotado lockdown. Aponta que a taxa de crescimento da mortalidade no país em determinado período seria de 0,7% quando, conforme o levantamento feito, seria na verdade de 2,5%. Chega a atirar contra o chefe da Organização Mundial de Saúde, Tedros Adhanom, reproduzindo denúncia não comprovada de que Adhanom teria apoiado e tentado conseguir armas para grupos rebeldes da Etiópia. De fato, o governo etíope fez essas acusações, mas não apresentou nenhuma prova disso. “De presidente da OMS a traficante de armas. Pode uma pandemia tão séria como a da covid ser conduzida por uma pessoa tão despreparada na área?”, questionou Osmar Terra no Twitter, conforme o levantamento da CPI.
Suspenso das atividades do Congresso por decisão do Conselho de Ética da Câmara, depois de ter chegado a ser preso por decisão do ministro do STF Alexandre de Moraes após a divulgação de um vídeo em que ameaçava outros ministros da Corte e pregava a adoção do Ato Institucional nº 5 da ditadura militar, o deputado Daniel Silveira aparece na lista como disseminador de teorias da conspiração que apontam o coronavírus como uma arma biológica. Em mais de um momento, o deputado afirma que a pandemia é “o maior episódio de engenharia social e análise comportamental em massa da história”. Para ele, a coronavírus “foi literalmente criado para atrapalhar e interferir nas eleições americanas”. Prossegue: “Claro que, por efeito, atingiu o Brasil e foi instrumentalizado pela esquerda doente”.
Há defesas recorrentes do uso de medicamentos sem eficácia comprovada e do fim do isolamento social. Ministros do governo aparecem na lista. O ministro Onyx Lorenzoni, da Secretaria-Geral da Presidência, por exemplo, faz relato pessoal em favor do uso de medicamentos cuja eficácia hoje nem mesmo o próprio Ministério da Saúde atesta. “Desde sexta, estou seguindo o protocolo de azitromicina, ivermectina e cloroquina e já sinto os efeitos positivos”.
Quando o Brasil atingiu cinco mil mortos pela covid-19 (agora já são mais de 540 mil), o presidente Jair Bolsonaro reagiu em reposta com um “E daí?”. Mais de um político da sua base postou um vídeo editando sem essa parte da resposta afirmando ser essa a verdade.
A lista cita também alguns políticos de oposição ao governo. A deputada Erika Kokay (PT-DF), por exemplo, fez questionamentos considerados insustentáveis sobre as razões pelas quais o presidente Jair Bolsonaro teria anunciado ter sido contaminado pela covid-19. “Alguém mais acha que o @jairbolsonaro testou positivo para covid-19 com o objetivo de fazer propaganda para a hidroxicloroquina?”, escreveu ela…”
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