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Do ouro à desgraça – por Marta Tocchetto

A articulista e as consequências do garimpo ilegal no território amazônico

A exploração de ouro na Amazônia, promovida pelo garimpo ilegal, carrega a desgraça da ganância que destrói não apenas o meio ambiente, destrói a vida.

A mineração de ouro na Amazônia, em grande parte ilegal, destrói os rios não apenas por revirar os sedimentos à procura do precioso metal, mas por envenená-los com o mercúrio usado para a separação da parte estéril que não tem valor comercial.

O mercúrio aprisiona o ouro que, posteriormente, por ação do calor é separado. O aquecimento da mistura vaporiza o mercúrio, restando, na forma sólida, apenas o ouro que origina as pepitas. A quantidade em excesso de mercúrio metálico usado na aglutinação do ouro pelos garimpeiros polui as águas e o solo.

O vapor de mercúrio também ocasiona o mesmo tipo de poluição, pois a chuva lava a atmosfera fazendo com que os poluentes retornem à superfície. Não é apenas o meio ambiente que sofre danos. Os garimpeiros são envenenados ao executarem o processo. Também não ficam livres dos efeitos nocivos, as populações ribeirinhas e indígenas.

O mercúrio é um metal pesado altamente tóxico capaz de atravessar a barreira placentária provocando malformação de fetos e abortos. É bastante volátil e solúvel. A intoxicação se chama hidrargirismo e se caracteriza pela ação sobre o sistema nervoso central ocasionando diversos sintomas como, irritabilidade, ansiedade, depressão, delírio, perda de memória. Ainda causa dores musculares, tremores, sangramento na gengiva, afrouxamento dos dentes, além de hipertensão arterial, alterações renais e alérgicas.

O mercúrio não é exclusividade da mineração de ouro. Ele foi usado por muitos anos no processo de restauração dentário, tendo sido responsável pela intoxicação de profissionais da odontologia. Atualmente, o amálgama foi substituído por resinas sintéticas.

Há relatos na literatura de intoxicação acidental ocasionada pelo contato com a pele ou ingestão, em especial crianças ao brincarem com o mercúrio líquido de termômetros quebrados. Equipamentos substituídos pela versão digital para reduzir os riscos no manuseio. As lâmpadas fluorescentes também são fonte de mercúrio, o que exige descarte adequado para evitar contaminações.

Os sintomas das intoxicações agudas, como acometidas pelos garimpeiros, podem permanecer e até se intensificarem, mesmo após cessada a exposição. A contaminação pode ocorrer também de forma indireta por meio da ingestão de água e alimentos, em especial peixes e crustáceos.

O mercúrio também se caracteriza pela biomagnificação, ou seja, à medida que vai alcançando os níveis mais altos da cadeia alimentar, ele se torna mais tóxico correspondendo à forma orgânica dos compostos.

A fauna que habita os rios busca o seu alimento no sedimento. Estando este contaminado com mercúrio, o mesmo ingressa para o interior dos organismos. O organismo agora contaminado serve de alimento para outros, os quais também são alimento para outros seres. Desta forma, ocorre a disseminação do mercúrio por toda a cadeia alimentar, atingindo inclusive o homem.

A velocidade de excreção do mercúrio é menor do que a de acumulação, por este motivo é considerado um elemento bioacumulativo permanecendo muitos anos no organismo.

A pesca sendo uma atividade econômica importante na Região Amazônica faz com que a contaminação alcance não apenas as populações próximas às áreas de garimpo, mas todos os que consomem peixes contaminados.

A exploração de ouro na Amazônia promovida pelo garimpo ilegal carrega a desgraça da ganância que destrói não apenas o meio ambiente. Destrói a vida levando a morte para lugares distantes da origem de contaminação.

O controle da comercialização do mercúrio metálico é uma alternativa para coibir a atividade ilegal que seduz com a ilusão de riqueza, mas traz somente, miséria, empobrecimento e doenças para a região.

Os governos estaduais, juntamente com o federal têm papel importante no cumprimento da legislação e na fiscalização, porém o que se vê é a conivência deixando a atividade ilegal correr solta pelos rios da Amazônia.

 (*) Marta Tocchetto é Professora Titular aposentada do Departamento de Química da UFSM. É Doutora em Engenharia, na área de Ciência dos Materiais. Foi responsável pela implantação da Coleta Seletiva Solidária na UFSM e ganhadora do Prêmio Pioneiras da Ecologia 2017, concedido pela Assembleia Legislativa gaúcha. Marta Tocchetto, que também é palestrante em diversos eventos nacionais e internacionais, escreve neste espaço às terças-feira

Nota do Editor: a foto (sem autoria determinada) de um garimpo ilegal na Amazônia é uma reprodução obtida na internet. Foi obtida no site do jornal A Crítica, de Manaus (AQUI)

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