Malvinas: 40 anos de uma Guerra Infame – por Leonardo da Rocha Botega
A glória efêmera, a derrota argentina e o começo do fim de uma ditadura
“Solo le pido a Dios / Que la guerra no me sea indiferente / Es un monstruo grande y pisa flerte / Toda la pobre inocencia de la gente”. Os versos acima foram escritos em 1978 por León Gieco. Na ocasião, o cantor e compositor argentino estava em Cañada Rosquín, sua pequena cidade natal, situada ao norte da Província de Santa Fé.
A canção tinha por objetivo (para além de ser reconhecida mundialmente como desejava seu pai) denunciar o contexto do então provável conflito entre Argentina e Chile por conta das disputas por algumas ilhas localizadas no Canal do Beagle.
A Guerra, que se desenhava como iminente, acabou não acontecendo. A partir da mediação do Papa João Paulo II, os governos dos dois países chegaram a um acordo. A “Operação Soberana” que resultaria no desembarque do 4º Batalhão de Infantaria da Marinha Argentina nas ilhas de Picton, Lennox e Nueva foi abortada horas antes de sua execução. Quatro anos depois, porém, a Argentina se viu mergulhada em um dos maiores traumas de sua História: a Guerra das Malvinas.
A questão das ilhas Malvinas é uma reivindicação histórica da Argentina que remete ao ano de 1833, quando o território foi invadido pela Inglaterra. Desde então, diferentes governos argentinos vinham exigindo a devolução das ilhas por parte dos britânicos.
Em 1965, a Organização das Nações Unidos, ouvindo os protestos argentinos, determinou que os dois países deveriam negociar suas diferenças e encaminhar conjuntamente uma saída para a questão. Nada foi feito.
Em nenhum momento os ingleses sinalizaram uma disposição de diálogo sobre um tema que na Argentina assumiu a condição de um dos poucos consensos nacionais. Algo raro, tendo em vista que desde os anos 1930 o país vivenciava, político e socialmente, aquilo que Tulio Halperín Donghi chamava de “instabilidade permanente”.
Em um contexto onde a Ditadura Civil-Militar argentina, instaurada no governo desde 1976, buscava uma saída política para a grave situação do país, mobilizar o sentimento patriótico era uma alternativa. A crise econômica, os milhares de desaparecidos, o isolamento internacional, a falência do consenso liberal das elites do país, faziam crescer ainda mais a impopularidade dos generais no poder.
O Terror de Estado estava cambaleando, com o objetivo de não deixar cair, em 22 dezembro de 1981 tomou posse como novo ditador-presidente o general Leopoldo Fortunato Galtieri.
As primeiras ações do governo Galtieri foram no sentido de retomar as relações com os Estados Unidos. Para isso, procurou se aproximar da estratégia de guerra oculta que o governo Reagan vinha desenvolvendo na América Central, principalmente, contra os Sandinistas na Nicarágua.
Diferentemente de seu antecessor, Jimmy Carter, Reagan abandonou o discurso dos direitos humanos e reaqueceu a lógica da Guerra Fria. Galtieri colocou-se como um apoiador disposto a se alinhar nessa lógica reaquecida e acreditou que por conta disso poderia entrar no jogo das grandes potencias.
Tal crença levou os militares argentinos a darem um passo à frente em sua estratégia de congelar a crise interna mobilizando o país com ações externas. Em fins de março de 1982, foi concebido o plano de ocupação das ilhas Malvinas.
Em 2 de abril, após vencerem uma fraca resistência inglesa, as Forças Armadas ocuparam a região. A ação gerou um frenesi popular e no dia seguinte a Plaza de Mayo foi tomada por uma multidão manifestando apoio a tomada das Malvinas. Até mesmo os dirigentes da CGT, que três dias antes foram duramente reprimidos, estiveram presentes para ouvir o discurso ufanista de Galtieri.
O entusiasmo durou pouco. Como escreveu o historiador britânico Eric Hobsbawm, a guerra deu à impopular primeira-ministra Margaret Thatcher o que ela precisava: uma comoção nacional e um discurso patriótico.
O feitiço virou contra o feiticeiro. A reação britânica foi dura. Em 17 de abril as tropas já estavam mobilizadas e em 1º de maio entraram em ação. A Comunidade Europeia, a OTAN e o Conselho de Segurança da ONU condenaram a ação argentina. O governo estadunidense se limitou a buscar uma mediação distante entre seus dois aliados.
A Guerra das Malvinas se tornou um verdadeiro massacre. A superioridade militar britânica impôs constantes e duras derrotas às tropas argentinas. Humilhado, Galtieri assinou a rendição incondicional em 14 de junho de 1982.
Ao longo de setenta e quatro dias, foram mais de setecentos argentinos mortos e quase mil e trezentos feridos. No dia seguinte à rendição, o governo ditatorial ainda reprimiu duramente um protesto na Plaza de Mayo. O povo enganado pela propaganda governamental não conseguia entender a derrota em uma guerra que estava sendo contada como vitoriosa.
As mentiras desestabilizaram ainda mais a Ditadura. Leopoldo Galtieri foi obrigado a renunciar pelos seus próprios pares. A cidadania ativa que reunia desde jovens estudantes até as mães e avós que buscavam os seus filhos e netos desaparecidos no terror adotado como política de Estado, passando por operários, desempregados e os veteranos da guerra infame, exigia uma nova política. Exigia a democracia. Exigia a reconstrução de um país humilhado, com mais de trinta mil desaparecidos e uma guerra infame para contar.
(*) Leonardo da Rocha Botega, que escreve no site às quintas-feiras, é formado em História e mestre em Integração Latino-Americana pela UFSM, Doutor em História pela UFRGS e Professor do Colégio Politécnico da UFSM. É também autor do livro “Quando a independência faz a união: Brasil, Argentina e a Questão Cubana (1959-1964).
Nota do Editor. A foto que ilustra este artigo, de momentos finais da guerra das Malvinas, sem autoria determinada, é uma reprodução obtida na internet.
E hoje é dia de comemorar a Redentora. Livrou o pais de uma ditadura comunista. Que, como se ve mundo afora, deu errado em todo lugar.
Tipiico. Por isto mesmo que não se deve confiar em militantes de esquerda. As Falklands eram inabitadas. No seculo XVIII foram criadas duas colonias, uma francesa e outra britanica. Posteriormente a França cedeu seus direitos para a Espanha. Quando a Argentina declarou independencia reclamou territorios da Espanha. Quanto a guerra, muito bom que os castelhanos levaram uma pemba. Não é nem um nem dois correntinos que acreditam as missões um territorio perdido.