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CULTURA. Rafa Sieg e Paulo Tavares. Saiba mais sobre os homenageados pela 15ª edição do SMVC

Ator com atuação nacional e o fundador da TV OVO falam sobre o Festival

Mais cedo, você teve a INFORMAÇÃO: na 15ª edição do festival Santa Maria Vídeo e Cinema (SMVC), o ator Rafa Sieg é o homenageado na Mostra Nacional e o diretor Paulo Tavares, fundador da TV OVO, é o homenageao da Mostra Sinprosm de Curtas-Metragens de Santa Maria e Região. 

A seguir, você confere as entrevistas feitas com ambos. Primeiro, Tavares; depois, Sieg.

Por Alexandra Zanela e Luísa Santini / Da Padrinho Agência de Conteúdo

Fala, Paulo Tavares! (com foto de Divulgação)

SMVC – Em 2022, o festival celebra 20 anos e tu esteve junto com o festival desde o início. Fizeste parte da equipe e da concepção do SMVC desde lá. Como tua trajetória se liga a do festival e como é ser homenageado no ano em que o SMVC comemora duas décadas de atividades? 

Paulo Tavares – Minha trajetória se liga com o SMVC pelo menos por quatro fatos. Primeiro, fui bancário e Coordenador Secretário de Cultura, Esporte e Lazer do Sindicato dos Bancários de Santa Maria e região. Em 1995 o sindicato comemorava seus 60 anos e o Luiz Alberto Cassol, nos procurou e propôs fazermos um cineclube ligado ao sindicato, então como uma das ações de comemoração do aniversário da entidade criamos o Otelo Cineclube, onde atuamos em diversas atividades de exibição e formação audiovisual. Inclusive com um evento comemorativa dos 100 anos de criação do cinema, onde exibimos 100 filmes clássicos que marcaram a história do cinema; 

Segundo, motivado pelas ações do cineclube e da discussão sobre comunicação comunitária que na época era forte junto aos movimentos sindical, comunitário e pastorais em Santa Maria, dos quais eu participava ativamente, eu propôs para a Associação Comunitária da Vila Caramelo a realização de uma oficina de vídeo para adolescentes na qual trabalhamos a formação audiovisual. No dia 12 de maio de 1996 foi realizado o primeiro encontro de formação audiovisual na Paróquia São João Evangelista e as duas turmas em dois meses de aprendizado criaram um primeiro programa, com reportagens e criações ficcionais sobre as comunidades da Vila Caramelo e seu entorno (região oeste da cidade). Essa oficina de formação deu origem a Oficina de Vídeo – TV OVO, que este ano de 2022 completou 26 anos de atuação, realizando formação audiovisual, produção de conteúdo e exibições cineclubistas; 

Terceiro, aproximadamente no início dos anos 2000, surge a necessidade dos profissionais do audiovisual se organizarem em torno de uma entidade que os representasse e levasse a frente as principais pautas da categoria, então com a participação de diversos profissionais da área, criamos a Estação Cinema – Associação dos Profissionais de Cinema de Santa Maria, que atuou por vários anos realizando diversas ações na área do audiovisual; 

Quarto, durante os anos de 2001 e 2002, fui Diretor de Ação Cultural na Secretaria de Município da Cultura de Santa Maria, foi nesse período que surge a ideia da criação do festival Santa Maria Vídeo e Cinema, e eu juntamente com o Beto Cassol, Orlando Fonseca, o Bebeto Badke e a Carol Berger assumimos a coordenação do SMVC e realizamos a primeira edição do festival.

SMVC – Foste o criador de um dos projetos culturais mais importantes do RS e do Brasil, a TV OVO. Como foi o início do projeto e o desenvolvimento em todos esses anos?

Paulo Tavares – A TV OVO surgiu como um projeto comunitário de comunicação e teve como ideia base o fomento do conhecimento audiovisual e o estímulo ao protagonismo juvenil. Desde seu início enfrentou muitas dificuldades, pois nasceu numa periferia, sem recurso nenhum e com o objetivo de desenvolver um processo comunicacional que depende de ferramentas tecnológicas. 

Foi graças a diversos apoios que o projeto conseguiu dar seus primeiros passos, começando pela Associação Comunitária da Vila Caramelo, pela Paróquia São João Evangelistas, a EMEF Irmão Quintino, o Sindicato dos Bancários entre outras instituições que foram se somando ao longo do tempo. 
Mas, o que mais motivou e deu suporte ao seu desenvolvimento foi o interesse e a garra dos adolescentes que aceitaram o desafio de aprender, criar e realizar as primeiras produções audiovisuais de forma coletiva e colaborativa. Iniciamos com a ideia de realizar as atividades durante o ano de 1996, mas no final do primeiro ciclo, os próprios adolescentes que participaram do processo de formação decidem que o trabalho deveria continuar e em 1997 o que era uma ação pontual transforma-se em uma associação cultural sem finalidades lucrativas. 

Com o passar do tempo, a TV OVO foi construindo e moldando a sua identidade, se transformando em uma referência audiovisual, tanto na formação e produção audiovisual, quanto na circulação e difusão. Tivemos vários momentos que auxiliaram a TV OVO se desenvolver e se colocar como referência. Para mim, teve um que foi o mais significativo, ela ter sido reconhecida como Ponto de Cultura em 2004 através do programa Cultura Viva do Ministério da Cultura. 

Felizmente, esse programa, em 2014, virou lei e se transformou na Política Nacional Cultura Viva. Foi através das ações dos projetos Ponto de Cultura Espelho da Comunidade e do Pontão de Cultura Fomento Cultural que a TV OVO conseguiu se firmar em Santa Maria como uma instituição cultural séria e comprometida com a produção cultural e a preservação da memória, além de romper as barreiras do município e se projetar como uma instituição cultural em nível estadual, regional e nacional. 
Hoje a TV OVO desenvolve vários projetos culturais, entre eles estão o “Por Onde Passa a Memória da Cidade”, o “Olhares da Comunidade”, o “Narrativas em Movimento” e o mais ousado que está transformando o casarão da esquina das ruas Floriano Peixoto e Ernesto Becker no “Sobrado Centro Cultural”.

SMVC – Além de tua marcante atuação no cinema, desenvolve projetos no teatro e como produtor cultural. Tudo isso se soma em uma atuação marcante em vários trabalhos comunitários. Como é para ti estar presente de forma efetiva em tantos projetos?

Paulo Tavares – Creio que o mais importante é o fato de vivermos em sociedade. A sociedade é formada por várias comunidades e ela só é sociedade justamente pelo entrelaçamento destas diversas comunidades. No campo da arte e da cultura não é diferente. Não podemos nos colocar como um único ente produtor de cultura ou um desenvolvedor de uma única linguagem artística. 

Lógico, que provavelmente em uma ou outra linguagem vamos nos destacar, mas a existência desta linguagem também vai depender da existência das outras, de suas referências e suas características. Então é natural que como realizador cultural e artístico se busque a experiência e vivência em outras linguagens, pois o acúmulo estético vivenciado em uma vai fortalecer a prática e a estética da outra. 
A presença em vários projetos é resultado de uma caminhada coletiva, uma vivência que busca unir forças em prol da arte e da cultura. Uma busca pela valorização do que é mais sagrado para o ser humano, a sua identidade cultural, que é traduzida pelo fazer artístico e sua relação com o ambiente cultural a que está inserido. 

Não é fácil estar presente em tantos projetos, sempre dá a sensação de que não estamos dando o devido tempo, se dedicando como deveria a cada um deles, mas não dá para ser diferente, a minha própria natureza me empurra para isso. O que acabo fazendo é me jogar nos projetos que realmente acredito.

Saiba mais sobre Rafa Sieg (com foto de Carol Beiriz/Divulgação)

SMVC – Neste ano você completa 20 anos de carreira. São os mesmos 20 anos do Santa Maria Vídeo e Cinema (SMVC). Como a tua trajetória se interliga com a do festival, e como foi saber da homenagem?

Rafa Sieg – Fico feliz com a homenagem, agradeço ao festival, aos organizadores do festival, que se manteve vivo ao longo desses 20 anos. Eu entendo que na vida é importante saber receber presentes como esse, mas tendo a olhar para esta homenagem muito mais como um convite para a gente dividir esta comemoração de 20 anos, este encontro de datas, especialmente neste ano tão importante para a gente, de transformações de horizontes. 

Santa Maria é muito especial para mim, eu fui fazer faculdade em 1997. E esse desejo de fazer cinema começou a se concretizar em Santa Maria. Eu comecei a fazer cinema porque cresci nos anos 80/90 em frente à televisão, numa época em que a tv a cabo começou a chegar e os making offs a aparecer além do que tinha no vhs. E isso ficou no meu imaginário, esse exercício coletivo. 

Porque eu sempre olhei para a ideia de a gente fazer cinema como arte coletiva, é claro que eu, enquanto ator, tenho noção do meu papel em frente a tela, de que sou eu que estou sendo visto. Mas é uma arte coletiva e isso foi o que me atraiu no começo, olhar um making off de um filme e perceber que por trás de tudo aquilo que eu estava vendo, daquele close, o plano sequência de um ator em cena, de uma mecânica, tinha um coletivo de pessoas.

Eu falo isso porque eu fui fazer faculdade em Santa Maria sem ter feito teatro na minha vida, sem nunca ter feito cinema. Descobri tudo aí Santa Maria, e a cidade sempre foi muito generosa comigo.

Eu lembro de já no primeiro semestre na faculdade, nos corredores da UFSM, a gente conversar sobre fazer cinema, isso no final dos anos 90. O mecanismo de se fazer cinema, as câmeras portáteis, estavam facilitando novamente. Depois, quando surgiu o núcleo do cinema no curso de Comunicação eu facilmente fui absorvido – e sou muito grato. 

Logo veio o SMVC, um momento de muito, muito entusiasmo na cidade, o começo dos anos 2000, uma atmosfera de entusiasmo com uma expressão artística, o festival de cinema nascendo, o cinema se expandindo, o filme do Sérgio (Sérgio Assis Brasil. filme Manhã Transfigurada) a gente já estava filmando. 

Enfim, 20 anos se passaram e eu segui acompanhando o festival depois que fui embora de Santa Maria, recebi um prêmio anos atrás, vi amigos de outras cidades inscrevendo os seus filmes e fico feliz de ver o crescimento do festival ao longo desses 20 anos – e agora a gente está se reencontrando. 

SMVC – Dentro da programação do primeiro SMVC, você fez um esquete em que interpreta o teatrólogo santa-mariense Edmundo Cardoso, homenageado naquele ano. Ao mesmo tempo, é protagonista do filme “Manhã Transfigurada”, dirigido pelo cineasta Sérgio de Assis Brasil, o primeiro longa de Santa Maria com uma equipe totalmente da região. Como foram essas experiências em estar com pessoas que marcaram para sempre a vida cultural da cidade? 

Rafa Sieg – Naquela  época do primeiro Santa Maria Vídeo Cinema tinha outra coisa acontecendo na cidade que era a TV OVO, que já existia há alguns anos, mas estava começando a fazer mais atividades culturais, integrando a comunidade para além na sua própria produção, tinha eventos no final de semana que misturavam cinema e teatro, e isso foi aquecendo os nossos corações. Assim com esse entusiasmo, vou repetir essa palavra, entusiasmo. Que era de ter uma cidade viva de cultura e esse era o espírito daquele momento. Enfim falando sobre 

Edmundo Cardoso foi uma figura importantíssima para a cultura santamariense. Na época quando eu cheguei em Santa Maria, a Nair D’Agostinho, que foi minha professora e depois tornou-se uma grande amiga no curso de artes cênicas, já estava produzindo um documentário sobre o Edmundo Cardoso, registro importante da memória da cidade que era o Edmundo Cardoso. Eu fiz uma pequena esquete sobre ele, esse ser que impulsionou a cultura da cidade, e isso fez com que eu pudesse conhecê-lo. 
Essa é uma das vantagens de se fazer cinema, de se fazer teatro, e você cruzar com figuras como estas e aprender sobre memória. Eu acho que cinema, memória, valor cultural está tudo misturado nesse encontro, como o Edmundo Cardoso. E o Sérgio, eu conheci quando o núcleo de cinema da UFSM estava nascendo, eu sabia do projeto do filme dele, o projeto tinha uma outra configuração, nós nos aproximamos, e depois surgiu o convite para fazer o filme e a gente acabou se tornando amigos. 
É bonito ver também a trajetória do Sérgio, quando você conhece uma pessoa e vai entendendo sobre os mecanismos de fazer cinema, vai entendendo a trajetória desse sujeito ao longo de anos nessa inquietação. Porque o cinema é isso, uma mistura de inquietação e entusiasmo, é uma coisa contagiosa, quando você está apaixonado pela ideia de fazer um filme vai contagiando as outras pessoas com esse entusiasmo, com essa paixão, que requer uma entrega grande de muito tempo, de muita dedicação e muito amor. 

Tanto o Edmundo Cardoso quanto o Sérgio são pessoas que uniram lindamente essas coisas. O entusiasmo, a ideia de contagiar as pessoas com a sua paixão pelo fazer artístico e um profundo amor pelo que faziam e pelas pessoas que cercaram ela. E eu acho que esse é o grande aprendizado do meu encontro com essas figuras, mais brevemente com o Edmundo Cardoso e mais intensamente com o Sérgio, que me proporcionou poder olhar para essa trajetória e dizer assim, ‘nossa eu com 20 anos já estava fazendo meu primeiro longa metragem, como ator’. 

Depois que eu saí de Santa Maria eu entendi melhor o privilégio e a potência que era ter experimentado isso tudo tão jovem, e de uma maneira tão protegida, porque era uma aventura fazer esse filme no interior, com os recursos que a gente tinha, mas cercado de gente competente e profissional, mas a gente tinha menos pressão comercial que talvez existam em outros circuitos hoje. Éramos loucos e apaixonados pela ideia de fazer cinema, como todos que fazem cinema hoje e sempre, e essa loucura, essa paixão, nos protege sempre.

Quando eu estava fazendo o filme do Sérgio, Manhã Transfigurada, tão, tão especial para todos nós, eu pude ver e experienciar essa coletividade, ver a integração da produção com uma cidade com as pessoas, a mobilização das pessoas que é necessário para fazer um filme, como a gente envolve uma comunidade, como a gente envolve múltiplos trabalhadores dentro dessa cadeia potente e economicamente falando que é fazer cinema.

Quanta gente é contratada para fazer cinema, quanta gente se envolve para uma produção cinematográfica, quanto quando silêncio é feito num set, por um instante você consegue capturar e está todo mundo emanando uma energia amorosa, criadora para aquele momento que será capturado pela lente. E fazer esse primeiro filme me conectou de verdade com o que é essa integração entre o que a gente vê na tela e a comunidade e as pessoas, um coletivo sobre a arte de se fazer um filme.

SMVC – Tua trajetória já conta com dezenas de trabalhos no cinema e no teatro, além de séries e novelas. Como é olhar e ver essa caminhada e quais são teus projetos futuros?

Rafa Sieg – São 20 anos, esse ano que eu parei para pensar nisso. Antes ainda do convite para receber essa homenagem eu pensei sobre a minha própria trajetória, e acho que todo mundo teve bastante tempo para repensar a vida nestes últimos tempos. Eu acho que, não, eu tenho certeza, que tudo que a vida iniciou para mim aí em Santa Maria, em começar a fazer cinema, se refletiu em tudo que aconteceu nesses últimos anos na minha vida. 

Eu sou um ator que gosta de fazer cinema, e fazer cinema é filmando que a gente aprende. E eu fico muito feliz, honrado e agradecido com todas as portas que se abriram, todas as experiências que eu tive, desde de fazer um curta com uma galera da universidade, a fazer longa do Sérgio, a fazer uma grande produção, obviamente. 

E tudo são marcas, no bom sentido, e vão ficando dentro da gente. E é isso mesmo, fazer cinema é filmar, é refilmar. É fazer e experimentar uma cena com um tamanho e depois descobrir que se quer experimentar, entender a linguagem, esse diálogo que existe com a câmera, e deixar a câmera capturar, jogar com ela, são infinitas formas de se fazer cinema.

E eu olho para essa trajetória que começou há 20 anos, em Santa Maria, como algo valioso, precioso, e que está comigo o tempo todo e vou reencontrando as pessoas que cruzaram o meu caminho lá no começo, ao longo da vida assim.

Bom, projetos futuros é continuar filmando, continuar fazendo cinema, obviamente. Eu estou escrevendo um roteiro com a Fernanda Chicolet, que é uma atriz e roteirista de São Paulo. Eu leio roteiros de cinema há 20 anos e descobri que escrever um roteiro de cinema é muito difícil. É um processo de criação longo, dedicado, de muitas versões, de muito entendimento sobre narrativas, sobre o pulsar da vida, isso que vai chegar para um ator lá na frente. 

E estou escrevendo, querendo dirigir também audiovisual, cinema, e estou nascendo agora, no que eu quero nos próximos 20 anos continuar atuando e começar a me expressar pela escrita e por um olhar cinematográfico, que é algo comum por atores que se interessam e se apaixonam por cinema quererem contar suas histórias. Então é isso que eu desejo para os próximos 20 anos e quem sabe daqui 20 anos eu não volto para Santa Maria e não mostro um filme meu, dirigido.

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