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A professores e gestores municipais – por Giorgio Forgiarini

Sobre a Lei do Piso do Magistério, a responsabilidade fiscal e outras questões

O Município de Santa Maria vem se negando a pagar aos docentes o reajuste do piso do magistério previsto para o ano de 2023. Para 2023, o índice calculado para essa atualização foi de 14,95%, mas, segundo a equipe da Prefeitura Municipal, não seria possível repassar tal incremento aos professores porque já teria o Município ultrapassado a margem prudencial e estaria gastando além do permitido Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) com pagamento de pessoal.

Dirijo-me agora, então, a professores e gestores do Município de Santa Maria para dizer que tal argumento não tem respaldo jurídico nenhum. Explico os porquês: a existência de um mínimo remuneratório para o magistério está prevista no artigo 206 da Constituição, que estabelece como um dos princípios da educação brasileira a observância de um piso nacional para os profissionais da educação pública, nos termos a serem definidos em lei específica.

A lei a que se refere esse dispositivo é a Lei n. 11.738/2008, conhecida como “Lei do Piso”, considerada constitucional pelo STF e cuja aplicação foi definida como obrigatória. A mesma lei estabeleceu também os critérios de sua atualização. De acordo com o parágrafo único do seu art. 5º, deve o piso ser atualizado com base no percentual de crescimento do valor anual mínimo por aluno, conforme estabelecido na lei que regulamenta o FUNDEB (Lei n. 11.494, de 2007).

Conforme entendimento do STF (ADI 4.167), esse mecanismo de atualização também é constitucional. É consequência direta da própria existência do piso. A omissão em se proceder à revisão dos valores significa comprometer a própria ideia de um piso remuneratório. Assim, adimplir com tal índice não é uma opção do gestor público. Não se trata de reajuste, mas de mera adequação que, inclusive, não pode ser obstaculizada pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

É o que tem entendido o Judiciário do Rio Grande do Sul em reiterados julgados oriundos de processos movidos por professores contra diferentes Municípios do Estado. Em vários destes, consta textualmente que o cumprimento da lei do piso não implica em violação à Lei de Responsabilidade Fiscal, na medida em que é o Município quem deve adequar seu regime orçamentário “às obrigações previamente estabelecidas pelo Poder Legislativo”.

Além disso, muito embora ainda não tenha o Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul se manifestado explicitamente quanto ao tema, inúmeros outros, de outros estados, dentre os quais os de SC, PR, BA, MS, MT, RN, PI, PB, já o fizeram e, invariavelmente, fixaram o entendimento de que o piso salarial nacional dos educadores deve ser cumprido independentemente dos limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

A conclusão, então, é lógica: Questões orçamentárias, financeiras e de responsabilidade fiscal não avalizam a omissão do município em cumprir com o que é determinado por lei. É, sim, dever do ente público adequar suas contas para cumprir com obrigações que estão previamente estabelecidas pelo Legislativo. Então, Srs. Gestores Municipais, em especial o Sr. Prefeito, não se esquivem. Façam seu dever. Cumpram a Lei do Piso!

(*) Giorgio Forgiarini é advogado. Atua na Forgiarini, Lovato & Soares Advocacia, escritório que assessora juridicamente o Sinprosm. Também professor de Direito Constitucional e Administrativo. O texto acima foi originalmente publicadono site da entidade sindical e também no Diário de Santa Maria.

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4 Comentários

  1. Para o pessoal que vive em Narnia o piso é o menor dos problemas do magisterio municipal. Não consegui confirmar o numero, mas falam num deficit atuarial de 3,5 bilhões no Instituto de Previdencia. Existe uma chance enorme de não fechar a conta algum dia. Ou seja, descontar para receber aposentadoria e acabar ganhando um salario minimo pela previdencia federal. Uma coisa implica na outra. Resumo da opera: o que decidirem para mim está bom.

  2. Obviamente se a LRF pode ser desrespeitada para os docentes, por que não para o resto do funcionalismo? Este assunto tem cara de ir parar nos tribunais de BSB com resultados e repercussões incertas. Outra, municipio demitiria todos os cargos de confiança? Isto traria algum alivio?

  3. Gestão publica e direito administrativo são disciplinas distintas. Vide tributação. Economistas, assessores legislativos e lobistas montam a legislação em BSB (ou POA, ou SM). Grosso modo quem operacionaliza são os/as contadores(as). Interpretação destes é a que resulta no menor desembolso possivel. Poder publico prefere a interpretação da lei que resulta na maior arrecadação possivel. Estabelece-se o conflito e ai entram os/as causidicos(as). Não é a toa que muitos(as) tributaristas sejam também graduados(as) em contabilidade. Não é a toa que muitos(as) contadores(as) acabem cursando direito depois de um tempo (paga melhor inclusive).

  4. Thomas Sowell, intelectual negro conservador, afirmou que ‘Não há soluções, há apenas permutas; e você tenta obter a melhor troca possível, isso é tudo que você pode esperar’. No que há que se levar em conta duas coisas, o desejo de alguns (principalmente os vermelhos) de acabar com a LRF e a obviedade: ‘a opinião que conta é a de quem decide’.

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