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A tarefa da democracia brasileira pós-Bolsonaro – por Leonardo da Rocha Botega

Os democratas brasileiros têm uma grande tarefa para ser cumprida agora

No último dia 30 de junho, o Tribunal Superior Eleitoral declarou, por ampla maioria, a inelegibilidade de Jair Bolsonaro. O fato que determinou sua condenação foi justamente o ataque ao sistema eleitoral proferido pelo ex-presidente em reunião realizada com Embaixadores estrangeiros, em 18 de julho do ano passado.

Na ocasião, uma série de inverdades sobre as urnas eletrônicas, que vinham sendo amplamente difundidas pelo bolsonarismo, embasaram o discurso do então presidente, naquilo que pode ser interpretado como uma tentativa de busca de respaldo internacional para um golpe de Estado.

O golpismo e a negação da democracia são parte da própria trajetória de Jair Bolsonaro. Herdeiro da “linha dura tardia” do exército brasileiro, grupo liderado pelo general Sylvio Frota (militar que tentou derrubar o também general e presidente Ernesto Geisel por discordar do processo de abertura política), Bolsonaro se constituiu como um dos poucos defensores da Ditadura Civil-Militar no Congresso.

Nos anos 1990, chegou inclusive a defender o fuzilamento do presidente Fernando Henrique Cardoso. Na sessão que encaminhou o golpe contra a presidenta Dilma Roussef, dedicou seu voto ao torturador Carlos Brilhante Ustra.

Estes e outros fatos demonstram que certamente democracia e Bolsonaro são palavras opostas. O que ficou evidente ao longo dos seus quatro anos de governo, com o ataque sistemático à democracia se tornando uma de suas principais iniciativas. Os principais alvos destes ataques foram a imprensa, o Supremo Tribunal Federal e o sistema de votação em urnas eletrônicas. Os dois primeiros por serem parte dos mecanismos de contrapeso da própria democracia. O terceiro, por sua vez, se tornou o “bode na sala”, colocado para mobilizar uma horda de seguidores e pavimentar o caminho para o golpe.

Felizmente o golpe não veio. Apesar de o presidente buscar ao máximo esticar a corda para consolidar uma saída autocrática, a sociedade e as instituições do Estado brasileiro não autorizaram está saída. Restou ao presidente o simulacro de insurreição fascista do dia 08 de janeiro. Mais uma vez a nossa jovem democracia não apenas não aceitou ser atacada, como se vingou. Entre os tantos crimes cometidos pelo ex-presidente ao longo de seu mandato foi justamente o crime contra democracia que determinou sua primeira condenação.

A condenação de Bolsonaro, que o tira do jogo eleitoral até 2030, significa o fim do bolsonarismo? Obviamente que não. Um movimento que mobilizou um mescla de elementos nefastos originários da cultura autoritária brasileira com o ressentimento do presente não se esgota de uma hora para outra. Talvez tenhamos que levar décadas para ver o bolsonarismo, a “nova” expressão da extrema-direita brasileira, voltar a ser o que era, um grupo disperso de idiotas autoritários que, apesar de se fazer presente no cotidiano brasileiro, nunca teve força política. Um processo que se alterou profundamente nos últimos anos.

Hoje o bolsonarismo se tornou a principal força do conservadorismo autoritário brasileiro. A condenação de sua principal liderança, obviamente, foi um golpe duro, porém, o bolsonarismo só irá murchar que os elementos autoritários da cultura brasileira que permitiram o seu crescimento também murcharem. Essa é a grande tarefa da democracia brasileira pós-Bolsonaro. Ou a cumprimos ou teremos sempre uma ameaça nos rondando.

(*) Leonardo da Rocha Botega, que escreve regularmente no site, é formado em História e mestre em Integração Latino-Americana pela UFSM, Doutor em História pela UFRGS e Professor do Colégio Politécnico da UFSM. É também autor do livro “Quando a independência faz a união: Brasil, Argentina e a Questão Cubana (1959-1964).

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6 Comentários

  1. Enquanto isto os lobbies chutam a maior aliquota possivel que pode lhes afestar e correm a BSB para ‘defender o deles’. OAB, lobby dos causidicos, já queimou a largada. O que leva a outro assunto, maioria dos deputados e senandores não poderiam ser vereadores em Witmarsum/SC. São ‘temáticos’, ou seja, tem um discurso (são ‘especialistas’) em determinados topicos. Segurança publica, agronegocio, armas, educação, saúde e por ai vai. A grande massa que votou na Reforma Tributaria não tinha a menor ideia do que estava fazendo. Só fingem que entendem. Se alguém perguntar um detalhe sobre o assunto borram as calças. Simples assim.

  2. ‘[…] o golpe contra a presidenta Dilma Roussef […]’ é um ataque as instituições. Alas, tanto a Humilde e Capaz quanto Collor tiveram um aspecto em comum, a economia indo para o vinagre. Cavalão teve pedidos de impeachment. Teve Rodrigo Maia sentado em cima das reformas (Nhonho queria ser presidente e agora tem dificuldades para se eleger deputado). Cavalão liberou emendas (até um ‘orçamento secreto’, narrativa como o ‘golpe’) e limitou o loteamento de cargos. Rato Rouco reservou pastas para o nucleo duro do PT, mas aumentou 14 ministerios. Falou algo como ‘manter a mesma equipe até o fim’, mas já existe zumzumzum de reforma ministerial. Alas, para defender das criticas muitos falam em ‘o projeto da reforma tributaria não é deste governo, veio de antes’. Alguns falam em ‘projeto de Estado’. Interessa muito ao governo porque concentra grana em BSB e quase com certeza aumenta a carga tributária. Resumo da ópera? Centrão não deixou de existir só porque saiu das manchetes.

  3. Lira (que teria um bloco de 173 deputados) em 19/05 declarou que pretendia pautar a Reforma Tributaria no primeiro semestre, idealmente seria 15 de julho (saiu antes). Medida Provisória dos Ministerios foi aprovada em 1ª de junho (45 minutos do segundo tempo), com modificações nas atribuições e recriação de um órgão. E liberação de 1,7 bilhão em emendas. Bota ‘habilidade politica’ nisto.

  4. Deixando de lado Cavalão, o cortina de fumaça, há que se ver as reações a reforma tributaria. Sim, porque não se reforma o sistema tributario sem alterar a CF, logo faz parte. Aconteceu como sempre acontece, unica diferença é que agora nem tentam disfarçar. Justificativa? ‘É do jogo!’. ‘Habilidade politica do Rato Rouco’.

  5. O nivel de picaretagem que se vê por aí é algo incrivel. ‘Analistas’ politicos, enfase no ‘anal’, falam como se o espectro politico tupiniquim, manco, só tivesse ‘extrema-direita’. ‘conservadorismo autoritário brasileiro’ é só na direita. ‘[…] um grupo disperso de idiotas autoritários […]’ só na direita. ‘Há mais a esquerda não pode ser conservadora’ poderia falar algum imbecil. Vamos debater reforma administrativa e reforma universitaria então. Toda a sociedade, não só os servidores publicos.

  6. Kuakuakuakuakua! A cara de pau é algo! Kuakuakuakua! Molusco com L., o honesto, ‘“o conceito de democracia é relativo para você e para mim”. Vermelhos que se dizem ‘democratas’ defendem Maduro e Daniel Ortega.

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