Barbie e feminismo (* com spoilers!) – por Elen Biguelini

Fazemos uma breve pausa na nossa listagem de autoras brasileiras e suas minibiografias para tratar do assunto do momento: a avalanche cor de rosa nos cinemas pelo mundo.

Muitos não entendem o poder de Barbie. Muitos homens não compreendem o furor feminino, e muitas mulheres não compreendem que o filme não é apenas uma historinha de bonecas. Ele vai muito além. É um texto filosófico, uma homenagem a diretores e filmes que o precederam e uma análise da posição social da mulher na sociedade.

O filme da Barbie imagina um mundo comandado por mulheres, um universo no qual o feminismo ganhou e que não existe patriarcado. Não é um matriarcado, no entanto. E não é um sistema ditatorial, ainda que os homens existam sim em uma posição subalterna. Ken realmente não é Ken sem Barbie no início do filme. As mulheres são respeitadas pelo que são e não por seu corpo.

Quando o casal principal chega ao mundo real e tanto Barbie quanto Ken se deparam com o patriarcado há um choque cultural, mas um choque bem diferente para cada um dos personagens.

Enquanto a Barbie percebe a dor, o sofrimento, a violência para com as mulheres e para com os homens e crianças, o Ken percebe apenas uma coisa “eu sou respeitado aqui”, as “pessoas me olham com reverência” (mesmo quando esta reverência é um homem falando coisas obscenas sobre a Barbie).

Demonstra assim, através deste paralelo facilmente compreensível, a visão que as mulheres têm da sociedade (ou que o movimento feminista tem da sociedade) e a visão masculino hegemônica. Isto porque, assim como Ken, muitos daqueles que usufruem dos privilégios do patriarcado são cegos para os problemas dele – mesmo para com outros homens. Ken, por exemplo, só vê os CEOs, só vê os homens o “reverenciando” (novamente, repetimos, quando na verdade estavam depreciando-o). 

Ken poderia ser o vilão de Barbie, mas não é; o próprio patriarcado é o vilão do filme. Assim, o filme é feminista em sua essência.

Mas claro, muitas pessoas não compreendem a pluralidade do movimento feminista e por isso criticam o filme por bater em uma tecla ou não bater em outra. Foi preciso uma Barbie estereotipada para liderar um grupo de mulheres, mas isso não significa que o filme não possa ter outras interpretações, ou que signifique que as mulheres tenham que seguir o modelo da boneca idealizada.

É justamente este o ponto principal de Barbie: todas e TODOS podemos ser quem quisermos. Ken é o suficiente, ele existe por si só. Assim como a Barbie também é o suficiente e existe por si só. Todos temos o direito de ser quem quisermos, e esta é uma mensagem feminista. É também a mensagem do filme, é também a mensagem que a Boneca Barbie já passou ao mundo no passado.

(*) Elen Biguelini é doutora em História (Universidade de Coimbra, 2017) e Mestre em Estudos Feministas (Universidade de Coimbra, 2012), tendo como foco a pesquisa na história das mulheres e da autoria feminina durante o século XIX. Ela escreve semanalmente aos domingos, no Site.

Nota do Editor. A imagem da Barbie, que ilustra este artigo, é da Freepik.