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O poder e os poderes – por Orlando Fonseca

Por “uma imprensa menos partidária, porque isenção realmente não existe”

Tenho defendido que a democracia é o valor máximo da vida em uma sociedade republicana. Tudo o que os cidadãos e os entes públicos precisam fazer em suas atividades oficiais ou cotidianas é mantê-la íntegra. Precisam afastar todas as tentativas de atentados contra a sua eficácia na promoção do bem comum. Desde o voto até a convivência harmônica entre os Três Poderes, tudo deve contribuir para a higidez de seus processos.

No entanto, fomos contaminados no último período com a proliferação de falsidades, pelas redes sociais, e a construção de um falso liberalismo, que visa antes de tudo desacreditar as instituições democráticas para inventar um “novo” estado de direito. E, nem é preciso estar muito atento e forte ao que nos chegam pelos noticiários, basta lembrar o fatídico 8 de janeiro deste ano corrente.

Falando nisso, até mesmo o chamado “Quarto Poder” tem assumido expedientes nada democráticos, e grandes veículos de comunicação têm se esquecido da afirmação dos fatos, para defender os interesses da mídia corporativa. A busca pelo poder tem tantos poderes, alguns nobres, outros pobres e uns tantos podres. O que não podemos é naturalizar tais expedientes.

Digo isso mencionando o fato recente da indicação do economista, pesquisador e professor Marcio Pochmann para presidir o IBGE. Tanto na prestação da notícia, quanto nas páginas de opinião – política ou não – eu vi de tudo. Falou-se em um ruído de comunicação entre o gabinete presidencial e a Ministra do Planejamento, à qual o órgão está afeito. Ainda que possa, inclusive, ter havido inconfidências desta com a mídia amiga.

O que mais me surpreende neste mise-en-scène é que a até mesmo a Ministra se disse surpresa com a indicação. Li, ainda, bestificado, as falas contra a indicação de um petista, como se o partido do Presidente escolhido pela maioria dos eleitores não fosse o Partido dos Trabalhadores. Por isso tratei acima da responsabilidade dos órgãos de imprensa na defesa da democracia. Não se trata de um joguinho entre moradores de um condomínio chamado República.

A escolha de Márcio Pochmann se dá em decorrência de sua vasta experiência no campo da economia e das ciências sociais. Ao contrário de Simone Tebet, mais alinhada ao neoliberalismo, Pochmann ficou conhecido por suas posições a respeito de políticas econômicas de cunho mais social e distributivo. Ele chefiou o DIEESE antes de tornar-se professor titular da Unicamp; foi presidente do Ipea e da Fundação Perseu Abramo.

Por ser da confiança do Presidente, tendo presidido o Instituto Lula neste triênio, é que foi chamado para conduzir um órgão vital para a afirmação do projeto deste terceiro mandato. Ora, meu caro leitor, por mais que tenha sido importante a adesão de Simone Tebet na campanha eleitoral, e na própria vitória de Lula nas últimas eleições, o projeto eleito não foi o da referida ministra.

Entendo que, em um governo de coalizão, os itens programáticos são negociados, no entanto, o eleito, aquele que foi democraticamente escolhido para a gestão do projeto é também o que escolhe os auxiliares na administração. Mesmo que se trate de uma negociação intrapartidária, é da sua caneta que sai o beneplácito.

 Chamar autoridades como Edmar Bacha (ex-presidente do IBGE no governo de Itamar e presidiu depois o BNDES no governo FHC) para falar mal do indicado, argumentando sobre “visão ideológica”, em um órgão eminentemente técnico, só serve para contribuir com a confusão do público.

Por isso faço coro ao Caetano: “Enquanto os homens exercem/ Seus podres poderes/ Morrer e matar de fome/ De raiva e de sede/ São tantas vezes/ Gestos naturais”. Há mais urgências a resolver com políticas públicas para acabar com a miséria e a falta de educação no país. Precisamos de uma imprensa menos partidária, porque isenção realmente não existe.

Assim como as redes potencializaram a difusão de fake news, os órgãos da imprensa sabem do seu potencial, do alcance de suas proposições, que ganham foros de verdade. Inclusive, o contraveneno para a fake news é uma imprensa ciente de suas responsabilidades na afirmação democrática de uma nação soberana, justa e igualitária. Acima de tudo, a verdade dos fatos.

(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.

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7 Comentários

  1. Resumo da opera é simples. Não têm credibilidade nenhuma para usar o ‘la garantia soy yo’. Não existe nenhuma ‘fake news’ na historia. Um militante ideologico foi nomeado para ‘cuidar’ dos numeros. Que terão menos credibilidade. Simples assim. Adicionando a mudança do presidente do BC ano que vem e viveremos ‘as mil maravilhas’ na teoria e na m. na pratica. Simples assim.

  2. ‘Acima de tudo, a verdade dos fatos.’ Com ou sem contrituição da imprensa ou qualquer um que seja: visão ideologica num orgão tecnico, ainda mais num de estatisticas, só serve para colocar a instituição em duvida. Simples assim. Não tem como desenhar, mas são as mesmas pessoas fazendo as mesmas coisas que fizeram antes e com o mesmo discurso furado. Simples assim. Diacho é que uma serie de indices, inpc/ipca, são utilizados num sem numero de contratos e agora tudo será colocado em duvida.

  3. Contradição de praxe ‘ democracia é o valor máximo da vida em uma sociedade republicana’. Pois bem, critica faz parte da democracia, ao menos em alguns conceitos da mesma. Molusco com L. famoso dirigente presidencial, afirmou que é um conceito relativo, talvez no conceito que os petistas usam não há espaço para critica, só anuencia.

  4. ‘professor titular da Unicamp’ e uma besta. Como muitos ‘professores titulares’ por aí. Gente que acredita que posição academica e diplomas os coloca acima da ‘massa ignara’. Unicamp foi a mesma instituição que deu um doutorado para Mercadante sendo que a tese é um programa de governo encadernada. Alas, dizem que a banca, fato inedito nas universidades do pais, aplaudiu o agraciado de pé. Titulos academicos faz de conta por adesão ‘a causa’. Objetivo final é ‘esquentar’ o discurso do governo, carteiraço academico.

  5. Os problemas de Simone Tebet são dela. Vai ter muita dificuldade para se eleger qualquer que seja o pleito. Esta lá, como Picolé de Chuchu, para enfeite. O tal ‘governo de coalizão’ é pura conversa mole para boi dormir. Coisa mais obvia do mundo.

  6. Marcio Pochmann foi presidente do IPEA. Afastou na instituição todos os que discordavam das ideias tresloucadas dele. Virou uma agencia de confirmação das imbecilidades que se fazia no governo. Simples assim. Um ‘instituto de pesquisa’ que virou o samba de uma nota só. Que perdeu toda credibilidade. Até hoje não recuperou totalmente. Estavamos lá, não é necessario mimimi. Os que presenciaram, ao menos a maioria, ainda estão vivos. Para quem não entendeu, é fato recente.

  7. Debate a teologia da religião dos outros é perda de tempo. Idem para os dogmas incutidos de cima para baixo na militancia que não consegue raciocinar sozinha.

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