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Ajuda humanitária – por Orlando Fonseca

“Como já disse, a guerra é o suprassumo da estupidez humana”

Neste final de semana, finalmente vimos a entrada de alguns caminhões com ajuda humanitária na Faixa de Gaza. A brutalidade de uma guerra já estaria garantida no uso de artefatos mortais de todo tipo. No entanto, como se sabe, um conflito começa pela falta de diálogo e tudo, no campo de batalha, torna-se animalesco quando desaparecem os valores que nos afirmam como seres humanos: a razão, o afeto e a solidariedade.

Nestas primeiras semanas de guerra entre forças do Hamas e o exército de Israel, o que temos visto é a manifestação da besta humana em sua totalidade. E não apenas naquele território conflagrado há milênios, segundo os relatos históricos, pois até mesmo nos gabinetes e plenário da ONU – órgão criado em 1945 para garantir a paz entre as nações – a sanha bélica contaminou as relações internacionais, a ponto de não se conseguir uma moção que garantisse a entrada da tão esperada ajuda humanitária.

A tragédia grega já nos ensinou, através de um dos seus grandes dramaturgos, Ésquilo: “A primeira vítima da guerra é a verdade.” Observando o que vem acontecendo em Gaza, podemos acrescentar que, antes disso, o humanismo já morreu.

Quando, em 7 de outubro, militantes do Hamas fizeram um ataque surpresa a Israel, ficamos estarrecidos com a morte de civis, especialmente crianças. Muitas foram feitas reféns e levadas para a Faixa de Gaza com adultos. No entanto, a desmedida reação do exército de Israel, já causou a morte de, aproximadamente, 4.500 palestinos, sendo que mais de 1.700 eram crianças.

Quando pensamos em uma guerra, nosso imaginário coloca em cena soldados, batalhões, armas, canhões e mísseis. Entretanto, o que estamos vendo, neste momento, é uma sequência de batalhas que não tem um campo específico, e a morte de civis, a destruição de prédios, até mesmo igrejas e hospitais, coloca mais violência desumana no processo. Ou seja, e por isso o meu espanto: a ajuda humanitária seria apenas um expediente para mitigar a falta de humanidade, e mesmo assim sofre entraves diplomáticos e interesses escusos na ONU.

Como já disse, e não custa repetir, a guerra é o suprassumo da estupidez humana. Resulta da falência da diplomacia, da ausência de diálogo pela falta de racionalidade, virtude mais elevada da condição humana. O Humanitarismo se constitui em uma missão social para garantir o bem-estar dos seres humanos, regulamentado por tratados do direito internacional.

Por este mecanismo, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha ou a Organização Médicos sem Fronteiras estão autorizados a garantir atendimento e fornecer alimentos aos povos atingidos por conflitos armados, sob proteção. Surgida em Genebra em 1864, levou à criação da primeira convenção de Genebra que garante o auxílio aos soldados feridos e a ajuda humanitária neutra, seguida de outras convenções que estenderam as garantias aos civis.

Embora a origem comum da raiz etimológica, o humanitarismo não deve ser confundido com o humanismo. Este último busca estudar, entender e aprimorar o ser humano, enquanto o humanitarismo preocupa-se com a melhoria da condição humana, pelo socorro médico, combate à fome e à miséria ou provendo garantias dos direitos aos prisioneiros de guerra. A filantropia, associada ao humanismo, pode aparecer entre ambos, mas cabe ao humanitarismo atuar em épocas e ambientes de desastres. Eu diria que esse só é chamado quando já acabou o humanismo.

Uma das preocupações do governo brasileiro, que atualmente preside o Conselho de Segurança, é com a proteção das crianças. O que me fez lembrar o refrão de uma música dos Rolling Stones: “War, children/ It’s just a shot away” (Guerra, crianças, está a um tiro de distância, em tradução livre). E o título de canção é “Gimme Shelter” (Dê-me abrigo), justamente o que mais carecem os pequenos palestinos na Faixa de Gaza, uma vez que a falta de entendimento humanista demora em permitir a entrada de ajuda humanitária naquele território.

Diplomatas e governantes estão precisando neste momento é de ajuda humanista. Para o bem da paz mundial, deveria ser permitida a sua entrada imediata nas negociações da ONU.

(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.

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13 Comentários

  1. Maduro andou se estrando com o presidente da Guiana. Fala em anexar territorio. Ex-colonia Britanica. Este filme acho que já vi. Nada que um porta-aviões ou dois não resolvam. Ou talvez a ‘intermediação’ tupiniquim. Nelson Manguaça poderia se candidatar ao Nobel da Paz.

  2. Israel estava por fechar acordo com a Arabia Saudita. Podia ser um caminho de negociação para resolver o problema Palestino. Foi para o vinagre. Também é bom lembrar, os massacrados no ataque terrorista eram socialistas (ainda que de iPhone) e ripongos chupadores de bala de Tel Aviv (na Rave).

  3. Nos ultimos dias a BBC divulgou fake news. ‘Jornalistas’ chamam de ‘barriga’. Um professor de Cornell na frente de uma multidão falou que estava ‘entusiasmado’ com o ataque do Hamas que teria sido ‘energizante’. A multidão respondeu cantando ‘from the river to the sea, Palestine will be free’. Do rio (Jordão) até o mar, a Palestina sera livre. Mika Tosca, cientista do clima de Chicago (mais conhecida por outros motivos, não pelo trabalho), escreveu numa rede social ‘Israelenses são porcos. Selvagens. Povo muito muito ruim. Excremento irremediavel.’ Esquerda é mesmo o pessoal do ‘amor venceu’. Catando milho? Não, dá para encher paginas com coisas semelhantes. Jogaram um coquetel molotov numa sinagoga em Berlim. Nenhuma novidade, já tinha acontecido em New Jersey em janeiro deste ano. Diferença é que agora, tambem em Berlim, predios onde moram judeus foram marcados com estrelas de David. Tudo isto repetido incessantemente na midia israelense.

  4. ‘[…] humanismo. Este último busca estudar, entender e aprimorar o ser humano,’ Aprimorar pelos criterios de quem?

  5. ‘[…] ajuda humanista. Para o bem da paz mundial, deveria ser permitida a sua entrada imediata nas negociações da ONU.’ Matar, morrer e se ferrar faz parte da condição humana. Desde que Caim (que era vegetariano e pequeno produtor) matou Abel (que era pecuarista). Prever o futuro é impossivel, mas não há cenario futuro no qual muita gente não se ferre. Alas, Comte, o positivista, fundou a ‘religião da humanidade’. ‘Humanismo’ não é uma coisa só.

  6. ‘[…] a falta de entendimento humanista […]’. Para quem sabe que o ‘humanista’ é cascata, só fica a ‘falta de entendimento’ de alguns. Resolução que o Brasil tentou fazer passar só é noticia aqui. O ‘protagonismo’ tupiniquim só existe no noticiario interno. Unica coisa que foi noticia lá fora da coisa foi a ameaça que um politico israelense fez à Russia. Simples assim.

  7. ‘Uma das preocupações do governo brasileiro, […] é com a proteção das crianças.’ Vamos combinar que há um mes atras a situação por lá não era a ideal, mas estava melhor que agora. Que no Brasil para o debate escorregar para a chinelagem não precisa muito. Ou seja, ‘seu hipocrita, fala das crianças judias mortas mas não das palestinas’. Alas, la não tem canetaço do Fraquim que limitou as operações policiais no RJ. Onde o combate também é urbano. E os agressores são protegidos por alguns por motivos ideologicos. Paralelo não é tão absurdo, se a população civil sai de Gaza e só ficam os terroristas, não duram um mes. Basico.

  8. ‘[…] tratados do direito internacional.’ Funcionam mais ou menos na area comercial. Enfase no mais ou menos. Bastante evidente.

  9. Clausewitz, por volta de 1830, era um realista. Inspirava-se no iluminismo. A guerra é a continuação da politica (relações internacionais) por outros meios. Não faltarão imbecis com o argumento da folhinha de calendario ‘em pleno 2023)’ isto é ‘inadmissivel’. Que traz a pergunta, se não é admissivel, além de ‘achar ruim’, vai fazer o quê? Nada, obvio.

  10. ‘No entanto, a desmedida reação do exército de Israel, já causou a morte de, aproximadamente,[…]’. O que seria uma reação ‘na medida’? ‘[…] a morte de civis, especialmente crianças.’. E estupro de mulheres. Os proprios terroristas divulgaram video mostrando uma moça sendo conduzida puxada pelos cabelos. O meio das pernas manchado. Se ocorre rebelião em algum presidio tupiniquim e existe um pavilhão com estupradores e assassinos de crianças são os primeiros a ‘ir para a conta’. Simples assim. Não importa a facção.

  11. ‘[…] o humanismo já morreu.’ Obvio que não. A utilização nefelibata do conceito e o uso espertalhão-politico foram momentaneamente prejudicados. Não vai faltar alguma imbecil para falar em ‘cultura de paz’ por ai. Papinho nivel quinta série de candidata a miss da decada de 70.

  12. ‘[…] a ponto de não se conseguir uma moção […]’. Algo que já tinha sido comentado noutra epoca. O tal ‘soft-power’ diplomatico do Brasil é a mais pura cascata. Outro aspecto é a total imbecilidade de quem acha que um canetaço na ONU iria mudar algo no Oriente Medio. Terceira asneira, existem negociações em curso para liberar refens, pelo jeito é o Qatar o interlocutor e a ajuda humanitaria pode estar sendo utilizada como moeda de troca.

  13. ‘[…] ONU – órgão criado em 1945 para garantir a paz entre as nações […]’. Onde está escrito ‘as nações’ leia-se ‘os membros permenentes do Conselho de Segurança’. O resto é irrelevante.

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