No ritmo normal – por Orlando Fonseca
Rodando pela cidade em certos horários e lugares, por estes dias, pode-se facilmente chegar à conclusão de que, no Brasil, o ano só começa mesmo depois do carnaval. Aqui, em Santa Maria, o trânsito de poucos veículos e sem o burburinho de pedestres e motocicletas, produz uma falsa impressão de tranquilidade, quebrada apenas pela função toda em torno do retorno do vestibular, pensado, outra vez, como panaceia para vencer a pasmaceira de janeiro (como se isso também resolvesse outros problemas da educação superior). Nada mais perigoso do que tirar conclusões do particular para o geral. Com as ferramentas do senso comum, até mesmo a Terra parece plana, e o sol é que gira ao redor dela. Na verdade, em um mês e meio, muita coisa já aconteceu por aqui e pelo restante do país. E se ficamos tirando conclusões desta mesma maneira para a solução dos grandes temas da comunidade (ou da sociedade brasileira) não vamos atingir o cerne das questões. Pois uma coisa é certa: não existem soluções simples para problemas complexos. É até muito bom rodar tranquilo pelas ruas do centro (passando por uma euforia de tratamento rejuvenescedor), mas enganosa a falsa impressão de tranquilidade.
É claro que a realidade é que, em Santa Maria, a educação produz movimento, seja nas ruas, seja no comércio, seja na perspectiva de seu desenvolvimento. Com a volta das aulas, logo após as festas de Momo, a agitação volta a tomar conta de tudo. Logo, é permitido pensar que é este o setor que precisa de atenção para que a cidade progrida. É bom ter as ruas tranquilas e com renovadas camadas asfálticas, mas todos sabemos que o problema está no tipo de piso que temos por aqui. Por baixo do asfalto e do concreto dos prédios, existem cursos de água, canalizados ou não, que continuam o seu afã de aflorar e fluir. O que significa que terão impacto sobre o que está acima, fazendo com que apareçam afundamentos, depressões e buracos, exigindo renovação do asfalto. Se olharmos com a devida atenção a história da nossa construção como cidade, vamos entender isso e buscarmos a solução adequada, e não as paliativas.
Do mesmo modo, entendo que a volta do vestibular não representa uma solução para o problema das vagas ociosas (que, diga-se de passagem, sempre existiram). E a mim, como educador, preocupa mais o impacto na educação pelo processo seletivo baseado em exame conteudista, que exige mais memória do que raciocínio. O Exame Nacional tem características que visam minimizar os efeitos negativos da seleção (a realidade é que não há vaga para todo mundo). Os concursos, sejam eles os seletivos para a universidade, seja os que oferecem o ingresso nas carreiras profissionais, têm um efeito retroativo muito forte sobre o ensino, especialmente o Médio. Com o modelo da Teoria da Resposta ao Item, que exige reflexão, interpretação e raciocínio, o ENEM influencia positivamente o processo de ensino e aprendizagem no básico. Além da virtude mais importante a meu juízo: o acesso democrático ao ensino público, custeado pela contribuição de todos os brasileiros.
Basta que se observe, no caso da volta do vestibular na UFSM, os dados de cursos em que os candidatos são em muito menor número do que as vagas ofertadas. Terão de ser preenchidas com alunos oriundos do ENEM, ou seja lá de que forma. A ociosidade ao longo dos semestres decorrem de outros fatores, que não o processo seletivo. O ensino superior público não pode se resumir à ideia de atendimento a demandas regionais, de alunos em busca de vagas, e muito menos para produzir movimento econômico, no comércio ou nas imobiliárias. Além de seu aspecto elitista, o modelo do vestibular é prejudicial à educação pelo modo como impõe um ensino baseado em conteúdos e macetes para a resolução de questões objetivas, com uma necessidade de decoreba sem tamanho, deixando pouco espaço na vida de adolescentes e jovens, para a reflexão e a interpretação. Gosto da minha cidade movimentada, tenho interesse em vê-la se desenvolver, mas é preciso mais do que soluções baseadas no imediatismo e no interesse de minorias. O que vale para ruas melhores e educação de nível, realmente, superior.
(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.
Resumo da opera é que não se resume a exames centralizados a la URSS ou vestibular (elitização é opinião, alas, as cotas não terminaram), o modelo de ensino superior esta em questão.
Para não ficar parecendo saudosismo, na construção da Torre Eiffel não existia computador. Na epoca de Itaipu um computador gigante tinha menos capacidade que uma calculadora atual. Ponte Rio-Niteroi.
Constatação que não pode faltar. Os meus professores, já sai da UFSM há mais de 30 anos, tiveram formação melhor que a minha. Em muitas areas é gritante a difença (na media, sempre há exceções). No direito e na medicina nem se fala. Antigamente com menos recursos jogavam nas 11 posições do campo. Agora mal desempenham a função na qual tem especialidade. Alas, até mesmo em SM, há causidicos(as) que quando fizeram faculdade no inicio da decada de 90 que são ‘bons’ na profissão. Mas se tivessem ido para veterinaria, medicina ou engenharias seriam bons também. Agora é o que a casa tem para oferecer.
Mercados saturados em algumas areas. O que pensa alguem que trabalha no comercio, em POA, por exemplo quando pega um UBER e o motorista é um(a) advogado(a) ou um(a) dentista? Cursos que demandam tempo e investimento sem retorno? Alas, o ensino superior sofre com baixa procura não só aqui, na Ianquelandia e na Europa também. Aquela estatistica de burocrata de ‘pelo menos 30% da população com curso superior’ não para em pé ou vai ser atingida via EAD. Não adianta gastar recursos em metas fora da realidade.
O ensino como um todo no pais esta em decadencia desde a decada de 70. Querem resolver jogando dinheiro em cima e marketando tecnologia. Simples assim. Basta ver o resultado do PISA. Ou vão desqualificar o PISA também por falta de argumento?
‘[…] cursos em que os candidatos são em muito menor número do que as vagas ofertadas.’ Diploma de curso superior virou commodity. Os concursos publicos para magisterio já começam a se adaptar para os oriundos do EAD.
‘[…] impõe um ensino baseado em conteúdos e macetes para a resolução de questões objetivas, com uma necessidade de decoreba sem tamanho, deixando pouco espaço na vida de adolescentes e jovens, para a reflexão e a interpretação.’ Isto é uma tremenda de uma cascata. A teoria de resposta ao item depende de um banco de dados de questões. Que virarão macetes em apostilas de cursinhos. Simples assim. Depois disto só desenhando.
O ENEM copiou o SAT ianque. Foi um coelho tirado da cartola de Andrade, então ministro da educação. Um incomPeTente. Esta sendo abandonado na ianquelandia.
‘Com o modelo da Teoria da Resposta ao Item, que exige reflexão, interpretação e raciocínio, o ENEM influencia positivamente o processo de ensino e aprendizagem no básico.’ Cascata de vermelhos que gostam de centralização. Alas, qual a evidencia fatica para a afirmação? Apelo a propria ‘autoridade’ como é o costume?
‘[…] preocupa mais o impacto na educação pelo processo seletivo baseado em exame conteudista, que exige mais memória do que raciocínio.’ Os cursinhos continuaram existindo, só tiveram que adaptar o material para o ENEM. O resto é cascata.
‘[…] existem cursos de água, canalizados ou não, que continuam o seu afã de aflorar e fluir.’ Isto virou desculpa para onde não existem cursos d’agua. Fica parecendo que ‘não tem o que fazer, é assim mesmo’. Simples assim. Alas, há fluxos d’agua criados artificialmente, seja pela impermeabilização do solo, seja pelo não funcionamento do esgoto pluvial. Que também é responsabilidade do poder publico.